segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A MORTE DE LECY ONARA - 4

E o confrade Zé respondeu:

Meu caro confrade:


Foi (como eu já calculava) um enorme prazer trocar ideias consigo.
Quem me conhece, sabe a minha regra - eu tenho os meus elementos/argumentos, mas o Autor pode ter os dele, diferentes dos meus.
E o CM tem os seus, como demonstra, clara e inequivocamente.
Fiquei muito contente com as suas explicações, que corroboraram a base da minha solução. Só não estou de acordo com a prisão do Musk na sexta anterior. A expressaão "naquela sexta-feira" é ambígua no contexto do problema - cita-se (é um facto) a partida de Musk na sexta 13, mas o desenrolar do problema vai até à quarta em que o corpo é descoberto. Pelo que "aquela sexta-feira" pode ser a da semana em que começaram as investigações. Concordará que nada no texto aponta por uma prisão por outro motivo (melhor, detenção). Havendo uma detenção e um crime, é forçoso relacionar.
De resto, as suas respostas validam a minha solução - tudo de acordo. Lecy morreu na sexta 13, morta (não premeditadamente) por Tó; Musk não matou; e muito provável cumplicidade com Naquet (Mas não textualmente provada, dise eu, como poderá constatar pela minha resposta que lhe envio e da qual agradeço um comentário à parte técnica, pois sei que está no ramo e queria corrigir erros de leigo).
Ambos defendemos o nosso ponto de vista (disse um grande escritor que cada texto só é, inteiramente, do autor até que o publica; depois, cada leitor o pode ler à luz da sua subjectividade fundamentada).
Repito - foi-me muito útil o seu problema e as minhas dúvidas não interferiram em nada com a possível qualidade da minha solução, que foi a 5ª melhor.
Já tinha conversado pessoalmente consigo e gostado; por isso, arrisquei um contacto público.

Um grande e grato abraço

A MORTE DE LECY ONARA - 3

O autor, "Cardílio & Avita", replicou, de acordo com o que prometera:


Caríssimo Confrade Zé,


Como prometido, aqui me tem a comentar as suas questões e digo comentar porque, como pretende uma resposta para elas na solução e o problema não permite ser conclusivo a seu respeito, não posso desfazer as dúvidas que o "atormentam".
Como sabemos, na vida real como na ficção, quando há uma morte por explicar, a investigação criminal tem como principais objectivos elucidar "o que se passou", "por que razão isso aconteceu" e "quem terá sido o responsável por tal", objectivos estes que são habitualmente apresentados sob a forma de perguntas. Para se resolver um problema, é necessário recolher a informação, organizar e interpretar as evidências físicas e os factos que determinam os limites daquilo que efectivamente se passou, comparar com o que dizem as testemunhas e participantes, aplicando metodologias aceites e princípios científicos bem provados, e aplicar o raciocínio crítico para se chegar a uma conclusão.
Em geral um investigador esforça-se por determinar quem, o quê, quando, onde, como e porquê, os "famosos" 5W dos ingleses, mas nem sempre é possível encontrar resposta para tudo. Basta estar atento aos media para perceber que, muitas vezes, só ficamos a saber verdadeiramente o que se passou e quais as motivações subjacentes aos actos depois da confissão do criminoso.
Em "Lecy Onara", temos um caso destes, no qual faltam elementos para uma resposta cabal a alguns deste W , como é o caso, entre outros, das questões que o Confrade levantou.
Para se construir o texto "Lecy Onara", teve-se presente a máxima atribuída a Sherlock Holmes:
"It is an old maxim of mine that when you exclude the impossible, what ever remains, however improbable, must be the truth" .
Por isso, preconizamos como solução que "A personagem da estória Lecy Onara foi vítima de um crime e o agente que o perpetrou foi a personagem Tó Trinete", como fundamentamos no texto publicado neste Blog.
Julgamos que, em termos de discussão, não se pode ir mais longe do que foram os autores no texto referido para fundamentar esta solução, mas estamos perfeitamente preparados para aceitar uma solução mais conseguida, se a acuidade de outros Confrades a vier a encontrar, não falando do Orientador, pois este já detém a liberdade de poder aceitar outras soluções. Além disso, enquanto autores, é nosso entendimento que o modo como os concorrentes chegam à solução, os fundamentos que apresentam, os seus argumentos, o estilo literário que utilizam, etc. são assuntos que cabem exclusivamente na jurisdição do Orientador.
Como sabemos, avaliar é comparar. Se o problema suporta uma solução suficientemente fechada, podemos considerar que avaliar será medir até que ponto a resposta do concorrente se afasta da resposta certa, mas as questões formuladas em torno do problema, a relevância das respectivas hipóteses e as conclusões apresentadas pelos concorrentes nas suas respostas dependem da argúcia e capacidade de argumentação de cada um, pelo que não podem ser comparadas em relação a um esteriotipo determinado e têm de ser medidas por comparação entre as respostas dos concorrentes, o que também cabe inteiramente ao Orientador fazer. É por isso que consideramos que as perguntas que o Confrade Zé nos dirigiu, por um lado, devem ser avaliadas no contexto em que foram inseridas na sua resposta e, por outro, só o Orientador pode esclarecer até que ponto as considerou certas ou erradas.
Por isso, quero ressalvar que vou tomar estas questões tal como o Confrade Zé as colocou, fora do contexto, e sobre elas fazer os meus comentários, como prometido.
1ª Questão
-Por que razão foi detido Musk, em Paris, na Sexta-feira,13, à noite?
1ª Resposta
Não sabemos por que razão Musk foi detido , em Paris, na Sexta-feira,13, ao princípio da noite. As notas do narrador não esclarecem nem dão pistas que permitam uma conclusão fundamentada sobre esta questão.
1º ComentárioZé
Pela morte da Lecy, não (foi detido Musk ), pois a polícia só teve conhecimento do seu desaparecimento na Terça-feira seguinte e da sua morte na quarta (da semana seguinte)!
1º ComentárioAut
De acordo, face aos factos descritos nas notas do narrador.
2º ComentárioZé
Não é admissível que a polícia detenha alguém por um crime que nem ela nem ninguém sabia que tinha sido cometido (a não ser o autor)!
2º ComentárioAut
Também achamos que não é admissível, mas não concordamos com o sentido subjacente ao comentário, pois não há em parte alguma das notas do narrador qualquer evidência ou sugestão de que a detenção de Musk pela polícia tivesse que ver com a morte de Lecy Onara. Trata-se, portanto, de um caso dito de interpretação enviezada ou distorção dos dados (um tema que seria interessante discutir mais tarde), em que o investigador parece deixar que as suas convicções se sobreponham ao juízo crítico sobre os factos, pois, como sabemos, desacatos na área de embarque, posse de certas substâncias proibidas, enganos de identificação e outros motivos podem reter qualquer passageiro em qualquer aeroporto do mundo, o que pode ser erradamente interpretado como factor de causalidade de situações que podem não passar de meras coincidências.
2ª Questão
- Musk, em Paris, exibe uma carta de suicídio (dactilografada) assinada por Lecy. Quem a escreveu? Quando a recebeu?
2ª Resposta
O texto diz " e mostrou uma carta que ela lhe tinha escrito, na qual explicava as razões por que decidira pôr termo à vida."
Bom, eu não sei a que é que o Confrade chama carta de suicídio. O que o texto refere é que Musk exibiu uma carta que Lecy lhe escreveu a explicar as razões por que decidira pôr termo à vida e nada mais. Portanto, quem escreveu a carta foi a Lecy e podemos inferir dos dados que Musk a recebeu antes de ter iniciado a viagem para Paris e, necessariamente, antes da morte de Lecy.
Comentário
Como se pode inferir do texto do problema, há nele dois planos nitidamente diferentes. Num, movem-se as vizinhas, não como elementos menores, mas como vozes da opinião pública. Por isso, o que dizem, para a investigação, tem o valor que tem a opinião pública nesta matéria (outro tema interessante para aprofundar). No outro, situam-se as notas, as quais traduzem os dados oficiais do problema que foi possível apurar e nos são trazidos ao conhecimento pelas palavras do narrador.
Por isso, quando na nota do narrador se afirma que Musk "mostrou uma carta que ela lhe tinha escrito, na qual explicava as razões por que decidira pôr termo à vida.", temos de considerar que estamos perante um dado do problema já certificado. Pelo que, contrariamente ao que o Confrade assume, não podemos dizer se a carta era dactilografada nem se estava assinada, o que podemos concluir é que não há qualquer dúvida de que a carta foi dirigida a Musk, foi escrita por Lecy e explicava por que razões esta tinha decidido por termo à vida, mais nada.
Como se sabe, sob o ponto de vista da investigação criminal, há diferenças relevantes para os processos entre ter probabilidade de acontecer, ser provável acontecer, ser possível acontecer e ser verosímil acontecer.
Na nossa perspectiva, este dado sobre a carta em si não incrimina Musk, mas permitiria discutir a possibilidade de haver alguma cumplicidade entre Musk e Tó, embora ela fosse improvável com base nas notas do narrador. Aliás, esta questão de existirem cumplicidades na morte de Lecy é sugerida em várias passagens do texto, dando assim aos leitores oportunidade de discutirem este tema, mas o interesse e importância da sua abordagem na resolução do problema são assuntos entre os concorrentes e o Orientador da Secção.
3ª Questão
"Outro exemplar da carta apareceu próximo do corpo."
3ª Resposta
Relativamente a esta carta o texto refere: "(a carteira) tendo no seu interior uma carta de despedida dactilografada". A carta a que se refere o Confrade aparece dentro da carteira da vítima e há indícios suficientemente fortes para sustentar que esta carta não tem que ver com a que Musk exibiu perante a polícia.
Comentário
Do nosso ponto de vista, são nítidas as diferenças entre estas duas cartas. Enquanto que sobre a primeira se diz que era explicativa das razões da decisão de Lecy em pôr termo à vida e não se refere a uma despedida; sobre a encontrada na carteira de Lecy, diz-se apenas que é de despedida, nada se referindo sobre a existência de explicações . Além disso, esta carta é declaradamente uma carta dactilografada e, eventualmente, não assinada, pois a nota do narrador não indica quem foi o seu autor. Por isso, não concordamos que possa ser entendida como mais um exemplar da carta mostrada por Musk. Mais uma vez, vemos aqui um enviezamento ou distorção dos dados, como se as convicções? o preconceito? e/ou "a indução espontânea?" se sobrepusesse à razão crítica do investigador. Não conhecemos nenhuma lei universal que imponha que estes tipos de cartas tenham sempre os mesmos elementos e muito menos que elas sejam todas iguais.
4ª Questão
-Como chegou ( a carta) às mãos de quem a lá colocou? O criminoso? Como chegou essa carta às mãos de quem a colocou próximo do corpo?
4ªResposta
Sim, é muito possível e provável que tenha sido o criminoso quem escreveu a carta e a colocou na carteira da vítima.
ComentárioZé
-…Mas ele só contactou com a Lecy na Sexta ao fim da tarde e o Musk já ia em viagem...
-…Isto era fundamental para a minha solução...
ComentárioAut
Caro Confrade, admito que fosse fundamental para a sua resposta. No entanto, como não conheço o contexto da mesma, não sei se adianta alguma coisa a minha perspectiva sobre o assunto. Contudo, gostaria de adiantar o seguinte. Com base no que referi na questão anterior, tudo indica que se trataria de cartas diferentes, tendo o aparecimento da segunda na cena do crime contornos de elemento de "diversão". Na realidade, entre a morte da personagem e o seu lançamento à água mediaram, pelo menos, 92 horas, tempo mais que suficiente para que o criminoso (usando a sua terminologia) pensasse em formas de se libertar do corpo (o homicídio não parece ter sido premeditado e não é impossível que tenha sido involuntário, aspectos de que o texto parece pedir alguma discussão) ) e de se ilibar das suas responsabilidades no evento, pelo que seria possível que fosse ele próprio a elaborar a carta e colocá-la na mala de Lecy. (Mais problemática é a questão da presença da embalagem vazia de digoxina…).
5ª Questão
Parece-lhe lógico que, indo Tó e Namet todos os dias (ou frequentemente) ao café do Zé Galão lanchar (está no texto), o Namet, estando tantos dias fora, não tenha ido com Tó ao café nem o tenha contactado, na Segunda ou na Terça?
Comentário
Considero que esta questão tem uma composição demasiado complexa,pelo que irei decompô-la, para mais facilmente poder explanar a minha resposta.
Alínea a)
Parece-lhe lógico que (Namet) não tenha ido com Tó ao café nem o tenha contactado, na Segunda ou na Terça?
Resposta
Se aquilo que o Confrade me pergunta é se me parece racional que… o Namet… não tenha ido …., eu dir-lhe-ei que sim, parece-me racional. No entanto, julgo que analisar a lógica deste ponto não é o mais é o mais importante para análise deste facto, mas sim avaliá-lo quanto à possibilidade ou probabilidade (no sentido de demonstrabilidade) disso ter ou não acontecido, como comento mais à frente.
Alínea b)
Como se explica que o Namet, tendo chegado na Segunda (e vendo a casa como estava) só tenha participado o desaparecimento da mulher na Terça?
Resposta
Bom! É uma pergunta bastante curiosa e difícil de responder. Julgo que esta questão "o que esperar de um marido que ao chegar a casa não encontra a mulher à sua espera?", é muito delicada e sobre ela só cada um poderá responder por si. O que é certo é que as notas do narrador não fornecem dados que nos permitam ir além de sugestões de motivos, que não podem ser justificados fundamentadamente.
Alínea c)
Por que ligou (Nemet) logo para a Polícia e não tentou saber dela na Escola ou junto de amigos comuns? Não está no texto qualquer um desses contactos. Por isso, eu disse que me parecia que o Namet sabia demasiado.
Resposta
Sobre este facto, a nota do narrador diz o seguinte: (Namet) foi à polícia participar o seu desaparecimento. Não podia usar telemóvel. Por aqui, vemos que, na verdade, a personagem participou o caso directamente à polícia e não por meio de ligação (telefónica?), o que pode alterar substancialmente a interpretação do acto. Na realidade, não é indicado se Namet foi à polícia propositadamente ou não, o que permitiria apercebermo-nos melhor da importância que Namet teria atribuído ao caso ou perceber as suas motivações. No entanto, como as notas do narrador nada dizem sobre o assunto, só poderemos entender que este facto não foi apurado ou que, tendo sido, não foi considerado suficientemente relevante para a resolução do problema.
Comentário
Nas questões que coloca, o Confrade Zé refere: "indo Tó e Namet todos os dias (ou frequentemente) ao café do Zé Galão lanchar (está no texto)".
Ora, verificando o texto, aquilo que a nota do narrador nos informa sobre isto é que: " De manhã, antes das aulas, … À tarde vinha o outro par. O Tó, para o petisco, e o Namet, para o chá ou yogourt. Por isso, o que logicamente se pode entender daqui é que nos dias de aulas, à tarde, o referido par ia lanchar (usando a sua terminologia) à pastelaria (e não café) do Zé Galão, ou seja, iam apenas nos dias de aulas e à tarde. Mas, será que isto pode ser entendido como uma afirmação universal verdadeira? Se tivermos em conta que, na 6ª feira, 13 de Março de 2009, um dia em que houve aulas na Escola referida no problema, Namet partiu de manhã para Paris, teremos de concluir que a proposição mais importante com que temos de entrar no raciocínio é que "nos dias de aulas, à tarde, nem sempre Namet e Tó iam lanchar, ao Zé Galão ", ficando, deste modo, demonstrado que nos dias de aulas, à tarde, era possível existirem razões para eles não irem lá lanchar. Por isso, me me parece logicamente válido o argumento de que seria lógico que não tivessem ido lanchar na 2ª e 3ª feira ao Zé Galão. Aliás, não só é lógico que não tenham ido lá lanchar na 2ª e na 3ª feira, como podemos até encontrar na nota do narrador dados que permitem fundamentar que isso foi impossível na 6ª feira e na 2ª feira seguinte, mas possível na 3ª feira. Realmente, a certo passo, a nota diz-nos que " … (Namet) No dia 13, de manhã, partiu para um fim-de-semana em Paris, tendo regressado na noite de 2ª feira 16…". Aqui temos uma prova inquestionável de que na 6ª feira era impossível irem ambos de tarde lanchar juntos no Zé Galão, bem como na 2ª feira, pois Namet não estava em TN a horas que lhe permitissem fazê-lo.
Note-se que, no dia seguinte ao da chegada, 3ª feira, a uma hora não declarada, "Namet foi à polícia participar o seu desaparecimento" e não a sua morte. Por isso, é razoável pensar-se que Namet teria razões para considerar a ausência de Lecy neste dia como uma situação anormal, mas não tanto que tivesse posto a questão de ela ter morrido. É muito curiosa a atitude da polícia no atendimento destes casos, mas isso só visto…
De qualquer maneira, no quadro descrito, seria possível que Namet e Tó tivessem lanchado, na tarde dessa 3ª feira, como habitualmente, no Zé Galão, antes ou depois de aquele ir à polícia, ou até mesmo nos dias seguintes que mediaram até Lecy ter sido encontrada sem vida no rio, mas não se encontram indícios nas notas do narrador que possam fundamentar a hipótese de tal ter acontecido. Por isso, ou este facto não foi esclarecido ou, tendo sido, não foi considerado suficientemente relevante para a resolução do problema e não foi incluído na nota do narrador.
Tendo em conta que Namet regressava na 2ª feira à noite a TN de uma viagem a Paris e era doente do coração (Não podia usar telemóvel por causa do coração… digoxina… são frases que mereceriam alguma atenção), seria possível que o cansaço se sobrepusesse ao desconforto que encontrou em casa e à eventual preocupação de não ter aí encontrado Lecy, levando a que se tivesse fechado no quarto a dormir até ao outro dia. Sabe-se lá! São tão diversificados os padrões de relacionamento dentro dos casais…
Nos problemas policiários, como na vida real, não só nem todas as hipóteses têm o mesmo valor ou podem ser investigadas, como nem todas são relevantes para explicar os casos. No entanto, nestes problemas torna-se mais difícil lidar com as hipóteses, não só por os textos serem sucintos, devido às limitações de espaço, como pela dificuldade adicional de se estar a tratar com textos escritos nesta nossa língua, por vezes, tão difícil de interpretar, e que constitui, amiúde, mais um adversário com que os concorrentes têm de se bater.
Deste modo, as questões levantadas pelo Confrade relativamente às relações entre Namet e Tó parecem-me interessantes, sobretudo pela pertinência da discussão que permitem em torno de uma possível cumplicidade entre eles na morte de Lecy, que pode considerar-se sugerida no texto, mas sobre a qual este não permite conclusões, mas pode causar um esforço adicional ao Orientador na avaliação das respostas dos concorrentes.
E é isto, caro Confrade Zé, o que tenho para replicar ao seu comentário. Se estiver de acordo, muito bem, se não estiver, muito bem, na mesma. Responder-lhe foi um interessante exercício. Por isso, eu é que lhe agradeço as questões que me colocou e ao Orientador da Sessão a possibilidade de lhe responder.

Sempre ao dispor
Um abraço
"Cardílio & Avita"

A MORTE DE LECY ONARA - 2

A resposta do confrade Zé foi nestes moldes:

Meu caro autor:


Responda-me, por favor, às seguintes questões:
Por que razão foi detido Musk, em Paris, na Sexta-feira,13, à noite? Pela morte da Lecy, não, pois a polícia só teve conhecimento do seu desaparecimento na Terça-feira seguinte e da sua morte na quarta (da semana seguinte)!
Não é admissível que a polícia detenha alguém por um crime que nem ela nem ninguém sabia que tinha sido cometido (a não ser o autor)!
- Musk, em Paris, exibe uma carta de suicídio (dactilografada) assinada por Lecy. Quem a escreveu? Quando a recebeu? Outro exemplar da carta apareceu próximo do corpo. Como chegou às mãos de quem a lá colocou. O criminoso? Mas ele só contactou com a Lecy na Sexta ao fim da tarde e o Musk já ia ia viagem... Como chegou essa carta às mãos de quem a colocou próximo do corpo? Isto era fundamental para a minha solução...
Parece-lhe lógico que, indo Tó e Namet todos os dias (ou frequentemente) ao café do Zé Galão lanchar (está no texto), o Namet, estando tantos dias fora, não tenho ido com Tó ao café nem o tenha contactado, na Segunda ou na Terça? Não me pareceu lógico.
Como se explica que o Namet, tendo chegado na Segunda(e vendo a casa como estava) só tenha participado o desaparecimento da mulher na Terça? Por que ligou logo para a Polícia e não tentou saber dela na Escola ou junto de amigos comuns? Não está no texto qualquer um desses contactos. Por isso, eu disse que me parecia que o Namet sabia demasiado.
Peço desculpa pelas questões, mas foi com base nestas dúvidas que fiz a minha solução. E não vejo resposta a elas na solução oficial.
Vá lá... Acertei no criminoso e na hora da morte...
No resto, não sei, pois as minhas questões não foram respondidas na solução oficial.
Muito obrigado pelo problema! Sinceramente! Passei dezenas de horas a estudar as evoluções das larvas e a recolher e a documentar o seu aparecimento num organismo morto. Fiquei muito mais rico. Aprendi muito! Objectivo da solução cumprido.

Grande abraço


19 de Outubro de 2010 17:19

A MORTE DE LECY ONARA - 1

A morte de Lecy ainda mexe, com assuntos de interesse para o nosso Mundo Policiário e por isso não resistimos a publicar uma troca de argumentos excelente, entre o autor do desafio e o Zé.

Vamos assistir, com muita atenção, a boas argumentações, para que todos também possamos dar as nossas "dicas", se assim entendermos.
Perante a solução que foi aqui publicada e algumas críticas, o autor entendeu fazer o seguinte comentário:

Caro confrade Luís Pessoa,


Por razões que não vêm ao caso, tenho andado afastado do meio, há já algum tempo, pelo que só agora me apercebi da polémica levantada a propósito do meu problema, publicado na edição 993 do Policiário. Para mim, trata-se de uma questão perfeitamente inóqua, mas como uma "carta deve ter sempre resposta", não quero eximir-me a dar a minha opinião sobre o assunto.
Não obstante, gostaria de deixar claro que:
-não tenho qualquer discordância sobre as regras do nosso passatempo Policiário;
-para mim, é claro e pacífico que, tendo sido aprovados e publicados, os problemas passaram à guarda da Secção e do seu Orientador, que deles dispõe como entender, avaliando e classificando as respostas recebidas de acordo com os critérios que entender mais justos. É assim com outros trabalhos noutros jornais e revistas e tem sido assim no Policiário desde a sua fundação, e já lá vamos com um Milénio de satisfação;
-não tenho qualquer interesse nem tomo partido em querelas de classificações, pontuações ou que tais ;
- sabia que a forma que usámos na solução do problema, por ser diferente do que é habitual, corria o risco de levantar perplexidades e rejeições, mas como, contrariamente à solução dos concorrentes, que é um assunto da exclusiva competência do Orientador, a solução do autor apenas a este compromete e não tem qualquer influência na avaliação dos concorrentes, decidi correr esse risco;
-por isso, assumo que a nossa resposta tem duas componentes. Uma nitidamente ficcionada e especulativa, apoiada no texto, mas desenvolvida a partir dele. Outra analítica e dedutiva, utilizando os indícios do texto para propor uma solução fundamentada para resolução do problema, à qual demos um cunho tão flexível quanto o problema permitiu, mas sem cedências de rigor;
-do meu ponto de vista, este problema tem apenas uma solução possível e esta não sofre qualquer prejuízo resultante da forma escolhida para a apresentar, pois não engloba nem depende de elementos contidos na sua componente ficcionada;
-não me custa a aceitar que essa parte seja considerada supérflua pelos confrades, embora aparentemente não o tenha sido pelo Orientador da Secção;
- raramente fico satisfeito com os trabalhos que produzo e aceito sempre de bom grado as críticas construtivas que lhes são feitas. Por isso, fico sempre grato a quem contribui para me aperfeiçoar, não havendo qualquer razão para que nesta actividade lúdica isso também não aconteça;
-o blog do Público não tem o espaço necessário nem o momento é o mais apropriado para se discutir a prova nº 8 de"Cardílio & Avita", por estar a decorrer ainda o período para conclusão da prova nº 10. Por isso, fica por agora disponível no blog http://haga-rai.page.tl/ , ainda em construção;
-apesar disso, gostaria de focar aqui alguns pontos que vieram a público e que, do meu ponto de vista, merecem uma breve nota, sem me dirigir directamente a qualquer confrade em especial;
-alguns confrades (espero que não tenham sido todos) terão achado que a nossa solução apresentada nada tinha que ver com o problema, esbanjando-se o espaço com pormenores que o enunciado não permitia abordar. Bom, esta é uma interpretação a que os autores estão sempre sujeitos, quando se expõem publicamente, mas que não partilho e não me surpreende, pois numa população tão vasta de leitores como a nossa, haverá sempre opiniões divergentes sobre os mais variados assuntos. As opiniões diferentes têm a sua utilidade, mas na resolução dos problemas policiários nem sempre ajudam, pois o que mais conta são mesmo os fundamentos.
Vejamos, então, aquilo que considero fundamental, no caso do problema nº 8.
A chave para a sua solução assenta essencialmente na interpretação dos dados fornecidos acerca da mosca e de Lecy, pois só com eles é possível estabeler uma hora aproximada a que ocorreu a morte da vítima e, assim, poder-se ir descartando os possíveis agentes que possam ter tido alguma coisa que ver com ela. O resto são lugares comuns, esteriotipos, elementos de "diversão", apelos a preconceitos e outros, a que o texto não dá sequência e não concede valor ou fundamento para solução do problema.
Como se afirma na resposta e é fácil de descobrir, são necessárias cerca de 92h após a eclosão dos ovos do insecto referido no texto para atingir a 3º fase larvar ou 3º ínstar deste animal. Como este desenvolvimento não ocorre em submersão, após a morte de Lecy, o seu cadáver teve que estar necessariamente fora de água durante 92h, antes de ser lançado ao rio, para que o referido estado larvar pudesse ter sido atingido.
Se admitirmos que, no limite, o cadáver teria acabado de ser atirado à água momentos antes de ser encontrado, teremos que concluir que terá sido recolhido um pouco antes das 24h do dia 18 de Março. Tendo em conta as 92 horas necessárias para ocorrer o 3º ínstar, isso levar-nos-ia a admitir que a postura teria ocorrido cerca das 04h do dia 15 de Março. No entanto, como a mosca não deposita os ovos necessariamente logo após um corpo ser cadáver, a morte de Lecy poderia ter ocorrido mais cedo no dia 15, mas não mais tarde, ou num dos dias anteriores.
Até onde poderemos, então, antecipar fundamentadamente o dia e a hora a que terá ocorrido a morte de Lecy?
Comecemos por analisar os dados relevantes que o texto nos fornece para o efeito e que são claramente o facto de Lecy ter sido vista, na 6ª feira anterior (13 de Março), depois das aulas, no supermercado e a circunstância de ela ser professora de Latim naquela Escola Secundária.
Vejamos porquê. A Escola onde Lecy trabalhava tinha ensino diurno e ensino noturno. Como o texto nada esclarece sobre o horário de trabalho da professora, teremos de analisar vários cenários. Nesse sentido, poderemos considerar que "depois das aulas" se refere à Escola. Teríamos, então, de considerar que o fim das aulas coincidia com o fecho da Escola, ou seja, às 24h, a hora a que terminavam as aulas noturnas. No entanto, como os supermercados em Torres Novas (TN) não fechavam tão tarde, Lecy não poderia lá ser vista a esta hora tardia, por isso temos de abandonar esta hipótese.
Suponhamos, então,que o términus das aulas se refere às aulas diurnas. Como estas aulas terminavam às 17h, teríamos de concluir, neste caso, que Lecy teria ido ao supermercado depois das 17h, o que seria verosímil e colocaria Tó Trinete em "maus lençóis", porque nem o Musk nem o Namet estavam em Portugal nesse dia a essa hora (sobre o Namet é o texto que o afirma, referindo que no dia 13, de manhã, partiu para um fim-de-semana em Paris e sobre o Musk já lá iremos).
Efectivamente, não sabemos a que horas Lecy entrou e saiu do supermercado, mas como acabámos de ver não interessa analisar outras hipóteses em que ela pudesse ter ido ao supermercado depois das 17h. Por isso, vamos analisar outras hipóteses em ela pudesse ter ido mais cedo.
Neste caso, é fundamental pensar se a referência ao depois das aulas não poderá significar depois de Lecy ter terminado as suas aulas, que é o que vamos analisar em seguida.
Como o texto fala em aulas, isso quer dizer que Lecy teria tido, nesse dia, pelo menos duas. Dado que cada aula de Latim, seja o A ou o B, no Secundário, tem a duração de 90 minutos, o mais cedo que as suas aulas poderiam ter terminado, nesse dia, seria às 11,50h, tendo em conta os intervalos e o facto de, naquela Escola, as aulas começarem às 8,30h. Deste modo, Lecy poderia ter sido vista no supermercado algum tempo depois das 12h. Suponhamos que a passagem de Lecy pelo supermercado foi muito breve, digamos que foi uma entrada por saída. Mesmo neste caso, não parece razoável que após cumprir as últimas formalidades escolares e ter-se deslocado para o supermercado, tivesse saído deste antes das 12,30h e, portanto, que a sua morte tivesse ocorrido antes desta hora. Por isso, podemos estabelecer com alguma segurança que o mais cedo que a morte de Lecy poderá ter ocorrido terá sido às 12,30h do dia 13 de Março de 2009.
Quem estaria então em TN a esta hora que pudesse ser apontado como suspeito?
Pelo texto, poderemos dizer que Tó Trinete esteve em TN durante todo o período da estória. Já vimos anteriormente porque podemos afirmar que Namet não estava lá. E Musk? Bom, Musk dificilmente estaria, senão, vejamos.
Musk foi detido pela polícia em Paris quando, de regresso à sua Ilha, naquela 6ª feira, ao princípio da noite, se preparava para tomar o avião para o Dubai. Ora, o texto ao referir "naquela 6ª feira", e não fazendo referência a qualquer outra 6ª feira, só pode ser interpretado como aquela 6ª feira ter sido o dia 13 de Março de 2009. Ora, como, nesse dia, em Paris, a noite caiu cerca das 19,23h locais, teremos de concluir que Musk estaria a apanhar o avião das 19,20h, que foi o único que partiu de um aeroporto de Paris (Charles De Gaulle, terminal 2C) para o Dubai, naquele dia, ao princípio da noite.
Como terá ido Musk de Lisboa a Paris? Como o texto não o refere, teremos de deduzir. O mais rápido seria num voo de Lisboa-Paris. De Lisboa, não há ligação para o Dubai com escala em Paris e saída àquela hora. Por isso, a maneira que mais garantia a Musk obter a ligação, seria tomar o avião que saiu de Lisboa às 14,30h para chegar a Paris, ao terminal 2B do Charles De Gaulle, às 18,40h locais, permitindo-lhe, assim, cumprir as formalidades de desembarque, no terminal 2B, a tempo de cumprir as de embarque, no terminal 2C do Charles De Gaulle, e apanhar o referido voo das 19,20h.
Como terá ido Musk de TN para Lisboa? O mais rápido seria pela auto-estrada, em que gastaria cerca de hora e meia, o que significa que, se o crime tivesse ocorrido cerca 12,30h e partisse imediatamente, Musk estaria no aeroporto cerca das 14h. Ora, chegar ao aeroporto de Lisboa meia hora antes de embarque é uma boa tentativa para ficar em terra, pois dá pouco tempo para cumprir as formalidades de embarque. Além disso, não é verosímil que, no quadro descrito no texto, pudesse ter sido: "matar e toca a andar", "dar rapidamente destino ao cadáver" e "é ainda tão cedo, deixa-me ir já para Lisboa, se não vou perder o avião!". Por isso, não é nada plausível que Musk tenha partido de TN cerca do meio-dia e meia, o que nos leva a concluir que, nesta hipótese, quando Lecy foi morta, Musk já estaria pelo menos a caminho de Lisboa.
Assim e à guiza de resumo, poderemos concluir que, no limite, Lecy terá sido assassinada numa momento algures entre as 12,30h de 13 de Maio e as 4h do dia 15 de Março de 2009 e que, neste período, dos suspeitos, só Tó Trinete estava em TN, sem explicação para o facto de ter na sua garagem o carro de Lecy (com a mosca lá dentro) e de ter mentido na justificação que apresentou para isso.
Logo, nem suícídio nem acidente, apenas um crime se pode ver aqui. A quem não acreditar, posso garantir que todos os dados usados neste escrito têm origem em fontes credíveis, mas dá algum trabalho a encontrá-las.
Assim, se tramou o Tó Trinete e o resto é "conversa de vizinhas".
Sempre ao dispor,
O melhor para todos,
"Cardílio & Avita"
Évora, aos 18 de Outubro de 2010

FINAL DA TAÇA DE PORTUGAL 2010

DR. GISMONDO - DANIEL FALCÃO

A SOLUÇÃO DE DANIEL FALCÃO

I – A MORTE DO VETERANO de Rip Kirby

Almerindo Cabral, com os seus 69 anos, não deixa de escutar diariamente temas musicais muito conhecidos nos anos 60 do século passado, como é o caso de O Imigrante pelo conjunto Maria Albertino, o Fado das Trincheiras pelo Miúdo da Bica e o Tango dos Barbudos. E é precisamente no dia do seu 69º aniversário, quando se prepara para mais uma vez escutar estes três temas, que encontra a morte, provocada por uma bala no seu temporal direito.

II – QUE GRANDE LATA de Lateiro

Frederica corre em direcção ao rio, por entre as árvores, procurando um refúgio onde possa recuperar o fôlego e ler a sua revista preferida. É alertada pela ausência dos cromos autocolantes de oferta. Exigente, mesmo tendo roubado a revista, regressa ao local do crime, na tentativa de receber os cromos que não conseguira roubar. Obviamente que não é bem recebida e, em resultado de um empurrão, o dono da loja acaba por morrer.



A MORTE DO VETERANO

ALMERINDO CABRAL – OS FAMILIARES DA VÍTIMA – 11 DE NOVEMBRO, DIA DE S. MARTINHO – O CORPO É ENCONTRADO – O RELÓGIO DA SALA DE JANTAR – A ORDEM DOS TEMAS MUSICAIS – O INSPECTOR EDUARDO TRINDADE INVESTIGA – O INSPECTOR EDUARDO TRINDADE INQUIRE – OS INOCENTES – O CULPADO




ALMERINDO CABRAL
No dia 11 de Novembro de 1940, dia de São Martinho, nasce numa vila da Beira o segundo filho da família Cabral, a quem é dado o nome de Almerindo. Tem uma infância feliz na companhia do irmão mais velho, Adelino, e dos irmãos mais novos, Antero e Armanda.
Ainda não tinha festejado o 21º aniversário quando, na companhia de outros jovens da sua idade, se vê no contingente que está de partida para o continente africano, mais exactamente para uma das colónias portuguesas onde, meses antes, tinha deflagrado uma violenta sublevação – Angola. Corria o ano de 1961.
O regresso acontece dois anos mais tarde. Regressa como muitos jovens portugueses, amputados de um ou outro membro ou simplesmente afectados psicologicamente pelo que experimentaram durante esse período, enquanto outros… As marcas da temporada em Angola estão bem visíveis na sua mão direita, em que um acidente levara à amputação de todos os seus dedos.O tratamento posterior permitira algumas melhoras. Pouco depois, seguiu as pisadas de um tio abastado que o chamara e rumou, imigrando, para o Brasil. A presença junto do tio, ajudando-o, colaborando com ele, proporcionou-lhe ser o seu único herdeiro. Viu-se, então, na posse de uma avultada fortuna.
Os anos passaram. Continuou a trabalhar, agora sozinho porque se mantivera solteiro, até sentir o peso da idade. É então que decide regressar ao seu país.
Numa tarde ensolarada de 1994, com a vetusta idade de 63 anos, desce do comboio na sua terra natal. Ali investe, construindo uma luxuosa casa. Para a partilhar, convida os seus irmãos ainda vivos, Armanda já falecera, e os seus sobrinhos: António, Alberto e Isabel.
Da sua passagem pela antiga colónia portuguesa ficara-lhe um gostinho muito especial, a sua predilecção por três temas musicais: O Imigrante tocado pelo conjunto Maria Albertina, o Fado das Trincheiras cantado por Fernando Farinha, o Miúdo da Bica, e O Tango dos Barbudos. Passados quase 50 anos, Almerindo ainda os continua a escutar diariamente…

…até que chega o dia 11 de Novembro de 2009!

[Há uma leve discrepância sobre há quantos anos o Almerinda escuta os temas: segundo o autor “passados mais de 40 anos”, segundo nós “passados quase 50 anos”. Caso Almerindo tenha nascido antes de 1940, por exemplo, 1935, a sua inclusão no contingente militar que partiu para Angola, teria ocorrido aos 26 anos, idade em que já teria cumprido o serviço militar. É este facto que consubstancia esta nossa ilação, embora a mesma seja irrelevante para a investigação que desenvolvemos.]


OS FAMILIARES DA VÍTIMA
Na luxuosa casa de Almerindo Cabral, para além dos empregados, cinco familiares possuíam aposentos individuais: Adelino e Antero, irmãos de Almerindo, e António, Alberto e Isabel, todos eles sobrinhos.
O irmão Adelino Cabral, dois anos mais velho, “passava a vida a queixar-se da sua sorte”. Precisamente por ser o mais velho, entendia que “deveria ter sido o herdeiro do tio”. Esquecia-se, porém, que fora Almerindo que passara uma grande parte da sua vida ao lado do tio abastado, com ele colaborando e partilhando os bons mas também os maus momentos. “Poucos meses depois de casado, a mulher [de Adelino] sumiu sem deixar rasto.”
O irmão Antero Cabral, o mais novo dos irmãos, “estudara no seminário” e “passava os dias a ler e a escrever”, isolando-se do resto dos familiares e restante pessoal da casa.
O sobrinho António Cabral, filho de Adelino, era formado em engenharia, mas não exercia a sua actividade, pois “explorar o tio dava [muito] menos canseira”. Fora abandonado pela mãe, logo a seguir ao seu nascimento. Possivelmente partilhava com o pai a ideia de injustiça cometida pelo tio-avô na atribuição da herança. Raramente passava em casa do tio e “quando aparecia era para [o] cravar”.
O sobrinho Alberto Pereira, filho da irmã de Almerindo e com sobrenome Pereira por parte do pai, era formado em medicina e trabalhava num hospital em Lisboa. Embora tivesse o seu próprio aposento em casa do tio, residia na cidade onde trabalhava.
A sobrinha Isabel Cabral, filha de Antero, era formada em economia e trabalhava num banco no Porto. Tal como o primo Alberto, embora tivesse o seu próprio aposento em casa do tio, também residia na cidade onde trabalhava.
Observando as características destes cinco familiares, muito rapidamente se conclui que, enquanto três deles parecem ter uma relação normal com o Almerindo (Antero, Alberto e Isabel), vivendo a sua própria vida, os restantes dois (Adelino e António) não se parecem ter conformado com o destino da herança. Embora para um destes últimos (António), desde que vá recebendo a sua parte, tudo decorre um pouco melhor.




11 DE NOVEMBRO, DIA DE S. MARTINHO

Almerindo não era um particular apreciador das festas tradicionais, mas como tinha nascido no dia de São Martinho, gostava de festejar o seu aniversário. Nesta data festiva, fazia questão de reunir toda a família: irmãos e sobrinhos. A rotina daquele dia era bem conhecida e concretizada pelos intervenientes.
Tudo começava bem cedo, “com a matança de um borrego”. Tarefa que lhe cabia a ele e ao irmão Adelino. Por volta das oito horas da manhã, chegava a sobrinha Isabel, responsável pelo assado do borrego “no forno [e acompanhado] com muitas batatas”.
O irmão Antero ensimesmado e o sobrinho Alberto chegavam um pouco mais tarde e não colaboravam nestas tarefas. António tinha por hábito aparecer por volta do meio-dia, já “no início do almoço”.
Concluída a refeição, o repasto era substituído pela conversa, ficando todos sentados à mesa. Finalmente, pelas 17 horas, fazia-se jus ao dia de S. Martinho, com a chegada das “castanhas assadas e as garrafas de água-pé”.
Mas, naquele dia 11 de Novembro, o festejo do 69º aniversário de Almerindo Cabral não decorreria exactamente daquela forma, embora o dia tivesse começado igual. “Algo errado aconteceu”…



O CORPO É ENCONTRADO
Tudo começou dentro da normalidade. Almerindo e Adelino mataram o borrego. Isabel chegou, por volta das oito horas, e preparou o assado.
O ponto de encontro era na sala de jantar, para onde se dirigiram Antero, que abandonou o seu isolamento, Alberto, que chegara entretanto, e Isabel, concluída que estava a preparação do assado. Faltavam chegar Adelino, António e o próprio aniversariante, que deveria estar “no quarto a preparar-se para presidir à mesa”.
Tradicionalmente, a vinda de Almerindo era precedida pela audição dos três temas da sua predilecção. “O relógio da sala de jantar marcava 11h40” quando chegou o momento tão aguardado.
Partindo do quarto de Almerindo, fez-se ouvir o primeiro tema, o Tango dos Barbudos, e logo depois o Fado das Trincheiras. Almerindo fazia questão que todos partilhassem este momento, pelo que se as músicas se podiam escutar não apenas na sala de jantar, mas também no exterior da casa.
Três minutos volvidos, após o início do Fado das Trincheiras, chegou António, vindo da cozinha. Imediatamente censurado pelo habitual atraso, afirmou que “o relógio da sala de jantar estava adiantado 15 minutos”. “Ninguém o contrariou e Alberto dirigiu-se ao relógio e atrasou-o 15 minutos.”
Cinco minutos depois entrou Adelino, “que depois da matança do borrego não mais fora visto nessa manhã”.
Já com todos os convidados presentes e aguardando a chegada do aniversariante, foi fácil ver o respectivo espanto quando, depois do Fado das Trincheiras, não se escutou o terceiro e último tema aguardado, O Imigrante. Em vez disso, continuou a escutar-se a voz do Miúdo da Bica, Fernando Farinha, cantando os restantes “temas do mesmo disco até este ficar mudo”.
Eram chegadas as 12h30, não se escutava qualquer tema musical e Almerindo não chegava. Isabel decidiu averiguar o que se passava.
Dirigiu-se ao quarto do tio, bateu à porta, não obtendo resposta. Teria o mesmo resultado depois de bater novamente, embora com mais força. Ganhando coragem, “abriu-a um pouco e espreitou para dentro”. O que viu levou-a a empurrar violentamente a porta e a entrar no quarto.
O tio “estava estendido no chão, com os braços abertos em cruz e com um ferimento de muito mau aspecto no temporal direito chamuscado e com resíduos de pólvora”. Reparou ainda na pistola que se encontrava “sobre a sua mão direita”.
Decidida, saiu do quarto, fechando a porta à chave, e correu para a sala de jantar, comunicando o que acontecera. Imediatamente passou para a sala de entrada, de onde telefonou para a polícia.
Enquanto efectuava o telefonema, todos correram para o quarto do Almerindo, deparando com a porta fechada à chave. Isabel tivera esse cuidado para manter o local do crime o mais intacto possível.
António não acompanhou imediatamente os familiares, tendo ficado para trás e juntando-se a eles “pouco mais de dois minutos depois”. Porque teria sido!?...


O RELÓGIO DA SALA DE JANTAR
No exacto momento em que se faz ouvir o Tango dos Barbudos, o relógio da sala marca 11h40. Sabendo que o Tango dos Barbudos tem a duração exacta de 4 minutos e 40 segundos. No final deste tema, o relógio da sala marcaria 11h44 ou 11h45 (dependendo de quantos segundos tinham passado das 11h40 exactas quando se iniciou a música). Muito provavelmente, o relógio da sala marcaria 11h45.
A troca do disco demora sempre algum tempo. Retirar o disco do Tango do Barbudos, guardá-lo e colocar o disco do Fado das Tricheiras, poderá demorar de 30 segundos a um minuto. Ou seja, quando se iniciou o Fado das Trincheiras, o relógio da sala marcaria ainda 11h45 ou já 11h46.
O tema seguinte, o Fado das Trincheiras, tem a duração exacta de 4 minutos. Por isso mesmo, ainda se ouvia este tema, “havia uns três minutos”, quando António entrou na sala de jantar. O relógio da sala marcaria 11h48 ou 11h49.
Foi nesta altura que António chamou a atenção para o relógio da sala, enquanto ainda tocava o Fado das Trincheiras, afirmando que estava adiantado 15 minutos. Como ninguém o contrariou, o primo Alberto dirigiu-se ao relógio e atrasou-o 15 minutos.
Desta feita, a chegada de António não teria sido às 11h48 ou 11h49 (hora antes do acerto), mas às 11h33 ou 11h34 (hora após o atraso de 15 minutos). Do mesmo modo, o Tango dos Barbudos teria iniciado às 11h25 e não às 11h40.
Teriam passado cerca de cinco minutos, já terminara o Fado das Trincheiras, quando chegou Adelino. Quem tivesse olhado para o relógio da sala, registaria que o mesmo marcaria, aquando desta última chegada, 11h38 ou 11h39.
Independentemente do acerto ou não do relógio da sala, decorreram menos de quinze minutos desde o início do Tango dos Barbudos até ao momento em que os cinco convidados se encontram reunidos na sala de jantar.
Observemos, atentamente, a tabela seguinte, a qual sintetiza as horas indicadas, quer para a situação em que o relógio estava a funcionar correctamente (sem acerto), quer considerando que o relógio estava adiantado 15 minutos (com acerto).


Acontecimento

Sem Acerto
Com Acerto

Inicio do Tango dos Barbudos

11h40
11h25

Final do Tango dos Barbudos

11h45
11h30

Início do Fado das Trincheiras

11h45 (ou 46)
11h30 (ou 31)


Entrada de António

11h48 (ou 49)
11h33 (ou 34)

Acerto do relógio


Chegada do Adelino

11h53 (ou 54)
11h38 (ou 39)



A ORDEM DOS TEMAS MUSICAIS

São três os temas predilectos do Almerindo, e por isso são escutados diariamente. Todavia, qual será a ordem habitual? Será sempre a mesma ou poderá variar?
Neste dia 11 de Novembro, a primeira opção recaiu sobre o Tango dos Barbudos e a segunda sobre o Fado das Trincheiras. A terceira opção, caso tivesse havido oportunidade, seria O Imigrante.
Obviamente que não há nada que consubstancie esta nossa opinião, mas não seria mais compreensível iniciar com temas portugueses e só depois com o Tango dos Barbudos? Sabemos que o Tango dos Barbudos sempre foi muito apreciado pelos militares portugueses que passaram pela guerra colonial, mas o Fado das Trincheiras está mais directamente associado à guerra e ao sofrimento dos militares. Não será razão mais que suficiente para ser a primeira preferência?
Bem, onde queremos chegar é: haverá alguma razão para que neste dia 11 de Novembro o Tango dos Barbudos tenha sido o primeiro tema? Pensamos que sim!...


O INSPECTOR EDUARDO TRINDADE INVESTIGA
“O relógio da sala de jantar marcava 13h15 conferido, à sua chegada, pelo inspector Eduardo Trindade”. Este facto elimina qualquer dúvida quanto ao acerto do relógio da sala de jantar, ou seja, às 13h15 o relógio marca a hora correcta.
O inspector Eduardo Trindade, após entrar no quarto de Almerindo, observou-o atentamente. Não registou quaisquer sinais de luta e viu o estado do corpo, tal como nos fora descrito pela Isabel: “estendido no chão, com os braços abertos em cruz e com um ferimento de muito mau aspecto no temporal direito chamuscado e com resíduos de pólvora. Sobre a mão direita uma pistola”.
A observação do género de ferimento, temporal chamuscado, e dos resíduos de pólvora, mostrou-lhe claramente que o tiro fora desferido a curta distância. O que colocaria imediatamente como possibilidade o suicídio, pois a pistola que teria desferido o tiro fatal estava sobre a mão direita da vítima. Mão direita, temporal direito, perfeitamente consonante.
Mas… também observou que a mão direita não tinha qualquer dedo. O inspector Eduardo Trindade apuraria mais tarde que a perda total dos dedos da mão direita se devera a um acidente em Angola. Logo, o suicídio estava, agora, completamente fora de questão: sem dedos, não era possível premir o gatilho da pistola.
Não só porque, como também apuraria mais tarde, o Almerindo tinha um excelente nível de vida, não havendo qualquer razão justificativa para um suicídio, além de não haver qualquer carta de despedida, o que era habitual neste tipo de casos, mas também porque caso ele se pretendesse suicidar iria, com toda a certeza, desferir um tiro no temporal esquerdo, utilizando a mão esquerda, a qual poderia segurar perfeitamente a pistola, já que tinha os dedos todos.
Sendo certo que não estava perante um suicídio, a posição do corpo também sugeria estar-se perante uma encenação. Um tiro desferido no temporal, implicaria uma queda para o lado oposto, o que dificultaria seriamente aquela posição dos braços: “abertos em cruz”.

Estamos, portanto, perante um homicídio!...

[Acrescente-se que, tendo sido a morte provocada por um tiro de pistola, dever-se-ia encontrar no local a respectiva cápsula. Desconhecemos se a não menção não significa a ausência, pois caso signifique então é mais um elemento contra o suicídio e a favor do homicídio. Neste caso, o homicida teria levado a cápsula do local do crime.]


O INSPECTOR EDUARDO TRINDADE INQUIRE
Junto dos familiares, o inspector Eduardo Trindade apurou que todos estavam reunidos na sala de jantar, desde as 11h30, “de acordo com a hora marcada no relógio ali existente”. As duas únicas excepções, segundo o testemunho dos familiares, foram o António que chegara cerca das 11h35, entrando pela porta da cozinha, e o Adelino “que, envergando traje de montar, chegou pouco depois pela mesma porta”.
Na identificação horária presente neste testemunho, confundem-se os dois horários, antes e depois do acerto de quinze minutos.
As 11h30 que são mencionadas, hora do início da reunião familiar, correspondem à hora que efectivamente o relógio marcava, ou seja, corresponde a dez minutos antes de se escutar o início do Tango dos Barbudos. Logo, hora do relógio da sala antes do acerto. (Se o relógio da sala tivesse sido acertado mais cedo, marcaria 11h15.)
As 11h35 que são mencionadas, hora de chegada do António, correspondem à hora que o relógio marcava já depois do acerto. De acordo com a tabela que apresentamos atrás, com o nosso cálculo horário, tínhamos apontado as 11h33 ou 11h34. Confirma-se, portanto, o “cerca das 11h35”.
A chegada do Adelino, pouco depois do filho, “cerca de cinco minutos depois”, teria sido por volta das 11h40 (ou aproximadamente 11h38 ou 11h39, tal como tabelado atrás), hora no relógio depois do acerto.
António justifica o seu atraso, afirmando que tinha “estado na cavalariça examinando um cavalo comprado recentemente”, enquanto o pai, Adelino, declara “que a pedido do irmão tinha ido visitar uma propriedade um pouco distante”.
Passando dos familiares para os empregados, estes declaram ao inspector Eduardo Trindade “não terem visto nem ouvido nada de estranho”, afastando a possibilidade de o homicídio poder ter sido cometido por alguém estranho à casa. Mas não só…
Também não ouviram nada, nem sequer o som do disparo fatal. Tendo o mesmo acontecido com os familiares, pois ninguém refere ter escutado o som do tiro. Será que teria sido porque o som da música o abafara ou haveria uma outra razão bastante mais específica!?...
O empregado da cavalariça presta uma informação muitíssimo importante, quando refere “ter visto António dirigir-se para a casa um pouco antes de se começar a ouvir o Tango dos Barbudos e saindo, pouco depois de se iniciar o Fado das Trincheiras, pela porta principal e encaminhar-se para a porta da cozinha”.
O inspector Eduardo Trindade interrogava-se, agora, sobre quais as razões que, a confirmar-se a declaração do empregado, teriam levado o António a não referir este seu movimento de entrada e saída da casa, tendo em vez disso dito que estivera na cavalariça, e porque, tendo ele estado dentro de casa, não acedera directamente à sala de jantar, onde era aguardado pelos familiares, optando por sair e reentrar pela porta da cozinha. Muito suspeito!...
O mesmo empregado declararia ainda que “após a matança do borrego, tinha aparelhado um cavalo para Adelino que saiu tendo voltado às 11h50”.
Esta declaração corrobora a que fora feita por Adelino quando refere que saíra cedo para visitar uma propriedade distante. Como a matança ocorrera bastante cedo, a sua deslocação teria demorado entre cerca de duas a três horas.
Todavia, esta mesma declaração levanta uma outra questão sobre o depoimento dos familiares. Pelo depoimento dos familiares, atrás analisado, ficamos a saber que o Adelino entrara na sala de jantar por volta das 11h40, enquanto este empregado refere que a sua chegada só ocorreu às 11h50.
Trata-se de uma diferença de 10 minutos. Quem estará a falar verdade? Os familiares, o empregado… ou ambos?
As declarações do empregado terminam quando afirma que “na véspera ouvira a vítima discutir com António e dizer-lhe que deixasse de contar com o dinheiro dele”. Poderia ser este o móbil para o crime!?...

Mais tarde, o médico legista viria a prognosticar como período da morte, a qual foi instantânea, o período entre as 11h20 e as 12h45. Mas o inspector Eduardo Trindade já sabia o que tinha acontecido naquele fatídico dia 11 de Novembro… e nós também!


OS INOCENTES
Embora a janela horária seja demasiado larga, é com ela que temos de prosseguir a nossa investigação: a morte fora instantânea, não permitindo qualquer acção sobre o local do crime efectuada pela própria vítima, e entre as 11h20 e as 12h45.
Antero, Alberto e Isabel estiveram na sala de jantar desde as 11h30, hora marcada pelo relógio da sala. Mas, se o relógio estava efectivamente adiantado, então eles teriam estado na sala de jantar desde as 11h15, o que lhes proporcionaria um álibi. Caso contrário, qualquer um deles teria tido uma janela de 10 minutos, entre as 11h20 e as 11h30, para assassinar o Almerindo.
Todavia, para além de não se encontrar, aparentemente, qualquer razão para o homicídio ter sido cometido por qualquer destas três personagens, como teria sido possível qualquer um deles colocar o disco do Tango dos Barbudos, dez minutos depois de se reunirem na sala de jantar e estando o Almerindo já morto, e a seguir colocar o disco do Fernando Farinha? Não seria possível, se excluirmos a cumplicidade com uma outra pessoa ou a cumplicidade entre os três.
Isabel, por seu lado, também teve uma janela de 15 minutos para assassinar o tio, entre as 12h30, quando se dirigiu ao quarto do tio, e as 12h45 (ou não, caso o relógio da sala de jantar tivesse sido indevidamente atrasado, pois nesse caso já seriam 12h45).
Mas, se fosse esse o caso, porque razão o tio, estando vivo, não colocou o disco do conjunto Maria Albertino, para escutar o terceiro tema, O Imigrante, e porque razão não desceu atempadamente, tal como estava previsto? Não o fez, porque foi assassinado antes de acabar de tocar o Fado das Trincheira, daí o disco continuar a rodar e seguirem-se as restantes músicas.

Neste momento, após a afirmação do parágrafo anterior, temos todas as condições para fechar a janela horária do período em que teria ocorrido o homicídio de Almerindo que, com toda a certeza, foi depois das 11h20, limite inferior do intervalo, tal como é indicado pelo médico legista.
Quanto ao limite superior do intervalo, este será considerado 4 minutos após o início do Fado das Trincheiras (tempo de duração deste tema). Caso o relógio da sala de jantar tivesse sido indevidamente acertado, seriam 11h49 ou 11h50, caso contrário, seriam 15 minutos antes, entre as 11h34 e as 11h35. Ou seja, a janela horária seria de aproximadamente 30 ou 15 minutos, respectivamente.
Se os três familiares considerados foram cabalmente inocentados, na eventualidade de terem agido isoladamente, será que o mesmo pode ser concluído em relação aos empregados, nomeadamente para o empregado da cavalariça, já que é o que tem uma intervenção mais directa na acção?
Recordemos que as declarações deste empregado, a confirmarem-se, lançam suspeitas sobre o comportamento e o depoimento do António. Estará ele a falar verdade ou estará procurando incriminar o António?
Por outro lado, é este mesmo empregado que também proporciona uma importante informação sobre o Adelino, quando refere que ele saiu e voltou às 11h50. Ora, para mencionar esta hora, tê-la-ia visto algures. Como estava algures no exterior da casa, possivelmente na cavalariça, teria usado o seu próprio relógio ou qualquer relógio para o qual pudesse olhar. Estaria também a mentir em relação a esta hora ou não?
De acordo com os familiares da vítima, o Adelino entrou na sala de jantar cerca de cinco minutos depois do filho. Como se pode observar na tabela apresentada atrás, com as estimativas dos horários, quando o Adelino entrou na sala de jantar, o respectivo relógio marcaria 11h38 ou 11h39. Assim se concluiria que o empregado da cavalariça ter-se-ia enganado (talvez propositadamente) quanto à hora de chegada do Adelino.
Porque razão iria o empregado lançar suspeitas sobre o António e mentir sobre a hora de chegada do Adelino? Como não conseguimos apontar qualquer razão, questionamos: não será o seu depoimento fidedigno?
Além do mais, o relógio da sala de jantar só marcaria a hora indicada porque fora atrasado 15 minutos, caso contrário, o Adelino teria entrado na sala de jantar às 11h53 ou 11h54. Esta hora de entrada é perfeitamente coerente com o depoimento do empregado, se considerarmos que o mesmo registou a hora de chegada do Adelino, tendo depois passado uns minutos (para entregar o cavalo, lavar a cara e as mãos, por exemplo, já que sabemos que não mudou a roupa) até entrar em casa.
Contudo, esta explicação só faz sentido se confirmarmos que o relógio da sala foi indevidamente atrasado. O que pode parecer estranho, sabendo nós que o inspector Eduardo Trindade conferiu a hora à sua chegada, confirmando que a hora marcada no relógio da sala coincidia com a marcada no seu próprio relógio.
Adiante-se, por fim, que sobre o Adelino não há qualquer elemento que possa ser utilizado para o incriminar, pois no período horário mais reduzido atrás indicado ele estaria longe da casa e ninguém mais o vira, embora saibamos que ele continuava desagradado por a herança não lhe ter sido entregue, podendo tal situação constituir um móbil para o crime.


O CULPADO
A chave central para desvendar este caso é precisamente o tiro que provocou a morte de Almerindo. Ou, melhor dizendo, o som do tiro que ninguém ouviu. E é precisamente por ninguém ter escutado este som que é possível apontar, com elevadíssimo rigor, o momento exacto em que Almerindo foi assassinado, exactamente às 11 horas e 40 minutos.
Devemos agora responder a algumas das questões previamente colocadas. Será o depoimento do empregado das cavalariças completamente fidedigno? A resposta é: Sim! Será que o relógio da sala de jantar foi indevidamente atrasado 15 minutos? A resposta é, mais uma vez: Sim!
Mas, se foi atrasado, como é possível que o inspector Eduardo Trindade possa ter confirmado que a hora que marcava o relógio da sala, 13h15, estava certa? Nada mais, nada menos, porque o relógio fora mexido em duas ocasiões: primeiro atrasado 15 minutos (ficando atrasado) e depois adiantado 15 minutos (voltando a registar a hora certa).
Vejamos, então, como tudo efectivamente aconteceu:
No dia anterior, tal como depusera o empregado, uma discussão entre Almerindo e o sobrinho António punha fim aos contributos financeiros do primeiro em relação ao segundo. Almerindo decidira não mais contribuir para os gastos do sobrinho. Se Alberto e Isabel podiam viver dos seus próprios rendimentos, também António poderia e deveria fazer o mesmo.
Decisão que não caiu bem em António, tendo logo a seguir ele próprio tomado a decisão de resolver de uma vez por todas aquela questão, como potencial herdeiro do tio, em caso de morte deste. Sendo conhecedor das rotinas do dia seguinte, dia de aniversário do tio, decidira que aquele seria o seu último dia de S. Martinho.
Naquele dia 11 de Novembro chegara um pouco mais cedo que o habitual (normalmente chegava por volta das 12 horas), seriam talvez umas 11h30. Entrando pela porta principal (movimento descrito pelo empregado), dirigiu-se ao quarto do tio, que se estava preparando para escutar os seus três temas predilectos.
Possivelmente deve ter tentado, uma vez mais, demover o tio de não lhe emprestar a quantia pretendida. Enquanto isso, aproveitando ele estar a ultimar os seus preparativos quanto ao vestuário, deve tê-lo ajudado a colocar o primeiro disco no gira-discos. Pegou no disco do Tango dos Barbudos e colocou-o no gira-discos.
Talvez o tenha posto a girar ou talvez tenho esperado que o tio o tenha feito. Certo, certo, é que no momento em que se iniciou o Tango dos Barbudos, aproximou a pistola do temporal direito do tio (de muito perto), surpreendendo-o e não dando oportunidade para qualquer reacção defensiva, e disparou o tiro fatal. Eram 11h40.
Não se escutou o tiro, precisamente porque o que caracteriza o início do Tango dos Barbudos é uma sequência de disparos de metralhadora. Naqueles breves segundos, ninguém seria capaz de distinguir os sons dos tiros provenientes do disco do som do tiro verdadeiro. Todos escutaram os tiros, mas ninguém se apercebeu “do” tiro.
Nos minutos seguintes, enquanto tocava o Tango dos Barbudos, encenou o suicídio e só nessa altura se apercebeu que tinha cometido um grande erro: desferira o tiro no temporal direito e o tio não tinha dedos na mão direita para segurar a pistola. Tarde de mais, teria de continuar com a encenação: abriu os braços do tio, em cruz, e colocou a pistola sobre a mão direita.
Tendo previamente limpado as suas impressões digitais, não sabemos como terá tentado colocar as impressões digitais do tio na pistola, já que este não tinha dedos na mão direita. Muito possivelmente terá colocado as impressões digitais da mão esquerda, o que não deixa de ser estranhamente curioso porque mesmo assim colocara a pistola sobre a mão direita.
Ainda enquanto tocava o Tango dos Barbudos, deve ter revistado o quarto e metido ao bolso o dinheiro que encontrara. Chega o final do tema e é o próprio António que substitui este primeiro disco pelo seguinte, começando a ouvir-se o Fado das Trincheiras.
É nesse momento que sai rapidamente do quarto do Almerindo e como não pode mostrar que já estivera dentro de casa, sai pela porta principal, por onde entrara antes, e entra pela porta da cozinha, movimento a que o empregado da cavalariça assistira e depusera perante o inspector Eduardo Trindade.
Quando finalmente entra na sala de jantar, proveniente da cozinha, coloca em acção a segunda parte do plano, dizendo que o relógio da sala de jantar está adiantado 15 minutos.
Como já reportamos, este entrada teria ocorrido quando seriam 11h48 ou 11h49. O relógio foi, então, atrasado, passando a marcar 11h33 ou 11h34. Porque razão teria o António decidido encenar esta mudança de hora?
Nada mais, nada menos, porque ele sabia que o médico legista iria indicar o período em que ocorrera a morte. Claro que ele esperava que o intervalo fosse mais preciso, considerando até que se pudesse apontar com excessivo rigor a hora a que a morte tinha ocorrido, ou seja, as 11h40.
Atrasando o relógio 15 minutos, quando se descobrisse que a morte tinha sido por volta das 11h40, ele teria os familiares como álibi, pois teria chegado à sala de jantar antes das 11h40. Recordemos que, no seu testemunho, os familiares referiram que o António chegara “cerca das 11h35”. Tal e qual como ele pretendia.
Depois do Fado das Trincheiras não se seguiu O Imigrante, como os restantes familiares esperavam, tendo o disco de Fernando Farinha tocado todos os outros temas lá gravados. Como é óbvio, tal não aconteceu porque a vítima estava morta e o homicida já se retirara.
O relógio da sala de jantar marca as 12h30 quando Isabel decide ir ver o que se passava, já que o tio não chegava. Dois ou três minutos depois regressa à sala de jantar e comunica o que aconteceu. Todos acorrem ao quarto do Almerindo… menos o António, que fica para trás, reunindo-se aos familiares “pouco mais de dois minutos depois”.
Descoberto o corpo do tio e estando sozinho na sala de jantar, é chegado o momento de pôr em acção a terceira e última parte do seu plano: acertar o relógio da sala de jantar. Foi exactamente para isso que usou aqueles dois minutos, garantindo que estava sozinho e que não era observado, para adiantar o relógio 15 minutos, repondo a hora certa. Desta forma, qualquer pessoa (como fez o inspector Eduardo Trindade) poderia, mais tarde, confirmar que o relógio estava certo.
Efectivamente, o relógio da sala de jantar estivera certo até à chegada de António e depois da sua saída. Apenas enquanto ele lá estivera, na companhia dos familiares, é que o relógio estivera atrasado 15 minutos.
Finalmente, diga-se que estão esclarecidas as dúvidas anteriormente mencionadas sobre a ordem dos temas, pois estamos certos que a escolha do Tango dos Barbudos como primeira tema partiu do António e fazia parte do seu plano para assassinar o tio.
O mesmo se pode dizer em relação ao móbil para o crime, sem dúvida o previamente apontado, ou seja, como estavam em risco os “empréstimos definitivos” restava uma parte da herança. Infelizmente, como homicida não vai poder usufruir da mesma.
Conclui-se referindo que a menção, no depoimento do António, a “ter estado na cavalariça examinando um cavalo comprado recentemente” não é corroborada pelo empregado das cavalariças, cujo depoimento se confirmou ser fidedigno. Trata-se de uma mentira para justificar o atraso. Caso contrário, sendo o depoimento do empregado tão pormenorizado, certamente não deixaria de o mencionar.




QUE GRANDE LATA
de Lateiro


RESPOSTA CERTA:
C – Não podia sentar-se à sombra do Oceanário para ler a revista.


ALGUMAS NOTAS:

ü Desta vez, a resposta resulta por exclusão de partes:
û A revista Super Jovem publicou-se antes e depois de 1998, ano da inauguração do Oceanário.
û Não se enquadrando a revista nas nossas leituras, não sabemos se alguma vez incluiu uma colecção de autocolantes de Bocas Ecológicas.
û Todavia, estando a ecologia na moda é bem possível que tal tenha sucedido e a forma como está construído o diálogo leva-nos a considerar que a colecção existiu.
û Além do mais, não nos parece que a solução passe por as Bocas Ecológicas não serem autocolante, mas serem CDs como acontece em algumas destas colecções.
û Ficam, pois, excluídas as alíneas A e B.

ü Imaginemos as seguintes situações:
û Se a latada aconteceu antes de 1998:
o Não havia Oceanário
û Se a latada aconteceu em 27 de Maio de 1998:
o Ano da Expo, logo acesso condicionado ao Oceanário
û SE a latada aconteceu depois de 1998:
o O Oceanário fica num local rodeado de água, não sendo admissível que alguém esteja encostado à parede do lado oriental, face às características do edifício, mesmo que seja para escapar do sol do final de tarde
û Por isso apontamos a alínea C.


DANIEL FALCÃO

domingo, 24 de outubro de 2010

A SOLUÇÃO DE RIP KIRBY

I
Introdução
Esta solução tem por finalidade tentar concorrer às melhores soluções. Eu sei que isso é difícil porque, à partida o produtor está sempre condicionado pela solução que já elaborou como sendo a oficial e dificilmente encontrará os buracos que normalmente todos os produtores deixam nos seus problemas e que os solucionistas descobrem como se fossem lagoas no meio do deserto.
Almerindo Cabral, um veterano das guerras coloniais, regressou de Angola, onde havia servido, psicologicamente muito mal tratado. Contudo teve a sorte, numa altura em que os apoios aos ex-combatentes eram quase nulos, para no dizer nulos, de ter quem se interessasse por ele e foi internado no Hospital Militar Principal da Estrela, não sei se ainda hoje é assim designado, e foi tratado até ficar quase completamente recuperado. Quase, porque bons nenhum dos que lá esteve, em Angola, ficou realmente bom, nem mesmo aqueles que foram menos afectados.
Diz o autor do problema, que ele quando voltou vinha bastante abalado. Abalado é a palavra certa para fugir a outra, stressado, que ofendia os ouvidos dos governantes de então e ainda ofende os ouvidos dos governantes actuais.
Os agentes da PIDE que ajudaram os ditadores a reprimir aqueles que, estavam contra o regime foram reformados com chorudas, reformas enquanto aqueles que foram obrigados a lá irem bater com os costados e a viver em condições precárias para além dos perigos por que passaram recebem um subsídio, que nada mais é que uma esmola que nem dá para beber uma bica por dia. Como se isso não bastasse no passado ano ainda encurtaram mais esse subsídio. A mim cortaram-me um terço
Por isso para os governantes actuais o stress nada mais é do que a mania da perseguição. Mas deixemo-nos de choradeiras que nada vão resolver.
Como ia dizendo, Almerindo foi internado no Hospital da Estrela onde foi tratado da sua “Mania de Perseguição” e uma vez “curado” acabou indo para o Brasil de onde um abastado tio o chamou acabando por fazer dele seu herdeiro. Trabalhando afincadamente, Almerindo, multiplicou a sua fortuna e quando, só, sem família por perto, a saudade apertou resolveu voltar à terra que o viu nascer.
Aqui, talvez numa tentativa de fugir à solidão que o atormentava, convidou para morarem com ele dois irmãos e três sobrinhos.
Os irmãos eram: Adelino Cabral, mais velho do que ele, e Antero Cabral, mais novo. Os sobrinhos eram António Cabral, 30 anos, formado em Engenharia, filho de Adelino. O Curso para nada lhe servia a não ser para enfeitar o nome. Sr. Engenheiro sempre era mais bonito do que apenas António Cabral.
Alberto Pereira, 29 anos, filho de uma irmã de Almerindo, já falecida, era formado em medicina e exercia o seu mister num hospital da Capital.
Isabel Cabral, 26 anos , filha de Antero era formada em economia e trabalhava num banco na cidade do Porto.
Todos tinham aposentos em casa de Almerindo mas, estes dois últimos tinham a sua própria residência nas cidades onde trabalhavam.
Acredito que se Almerindo tivesse o condão de adivinhar nunca teria convidado os seus familiares para viverem com ele e já vamos ver a razão desta opinião.

II
Um dia de aniversário atribulado
Almerindo, bem como os seus familiares, era natural de uma vila da Beira Alta encravada numa das encostas da serra da Estrela onde havia nascido no dia de são Martinho, pelas nossas contas, no ano de 1940. Não gostava das festas tradicionais, Carnaval, Páscoa, Santos Populares, Natal, nem sequer da romaria local feita à capela da padroeira da sua terra.
Para ele a única festa digna de celebração era o seu aniversário e nesse dia ele exigia que toda a família se reunisse à sua volta.
Naquele ano aconteceu a mesma coisa. Logo pela manhã, com o auxílio do seu irmão Adelino procedeu à matança de um borrego e ao seu esquartejamento. Os temperos e a feitura do assado no forno, com muitas batatas, eram da responsabilidade de Isabel que deveria chegar pelas 8horas da manhã, como era usual.
Alberto deveria chegar um pouco mais tarde já que vinha de mais longe e não tinha nenhuma tarefa especifica para executar.
António como de costume deveria atrasar-se sem consideração pelo tio de quem recebia uma boa mesada.
Naquele ano, como de costume perto do meio-dia todos, Isabel, Alberto e Antero, esperavam na sala de jantar o aniversariante que se encontrava no seu quarto aperaltando-se para presidir ao almoço do seu aniversário. Faltavam apenas Adelino que, depois da matança do borrego não mais fora visto e António que como de costume estava atrasado.
O relógio da sala de jantar marcava 11h40m quando no quarto de Almerindo se fizeram ouvir os primeiros acordes do “Tango do Barbudos” e quando este tema terminou o disco foi trocado e foi a vez de se ouvir a voz de Fernando Farinha cantando o “Fado das Trincheiras”. Ouvia-se este tema havia uns 3 minutos mais ou menos quando António Cabral entrou na sala de jantar vindo da cozinha.
Censurado por chegar atrasado, António respondeu que o relógio da sala de jantar estava 15 minutos adiantado.
Ninguém se deu ao trabalho de confirmar e Alberto foi até ao relógio e atrasou-o 15 minutos.
Logo após, pouco mais de 3 minutos, António ter entrado na sala entrou o pai em traje de montar.
O “Fado das Trincheiras” chegou ao fim mas, foi a voz de Fernando Farinha que se continuou ouvindo o que intrigou Isabel, o costume era o tio colocar imediatamente no prato do gira-discos o fado “O Imigrante” pelo conjunto da Maria Albertina.
O disco de Fernando Farinha chegou ao fim o que decidiu Isabel a ir ao quarto do tio ver o que se passava.
Chegou ao quarto do tio, bateu na porta e chamou, mas não obteve resposta o que mais a intrigou. Empurrou a porta e espreitou para dentro e viu o tio estendido junto do leito. Correu para ele e verificou que estava morto e o sangue derramado não deixava qualquer dúvida sobre o que causara a morte.
Fechou a porta do quarto à chave, foi à sala de jantar informar os familiares da morte do tio e de seguida dirigiu-se para a sala de entrada e ligou para a polícia.
Todos os presentes se lançaram em corrida para o quarto de Almerindo, apenas António se deixou ficar para trás reunindo-se pouco depois aos restantes elementos da família.

III
A Investigação
A polícia não se fez esperar, o relógio da sala de jantar marcava 13h15m, conferido à sua chegada pelo Inspector Eduardo Trindade que logo se dirigiu para o quarto de Almerindo, provavelmente guiado por Isabel, onde, depois da sobrinha do morto ter aberto a porta, entrou. No quarto de Almerindo que, se encontrava estendido ao lado da cama com os braços abertos em cruz estando o direito escondido debaixo desta. Debruçado-se no chão o Inspector espreitou para debaixo da cama e viu que sobre a mão direita estava pousada uma pistola. Não havia sinais de luta. Um ferimento de muito mau aspecto, chamuscado e com resíduos de pólvora enfeitava-lhe o temporal direito.
Das suas perguntas o Inspector apurou que todos os familiares de Almerindo se encontravam reunidos na sala de jantar, desde as 11h30 de acordo com o relógio ali existente quando o corpo foi descoberto. Apenas António que chegou, entrando pela porta da cozinha, segundo o testemunho dos seus familiares, cerca das 11h35m segundo a sua afirmação e por isso o relógio da sala de jantar tinha sido acertado. Ao ouvir esta afirmação o inspector abanou a cabeça de uma forma estranha mas ao mesmo tempo numa atitude inteligente.
Adelino entrou pouco depois do filho, pela mesma porta, envergando traje de montar.
Interrogados os empregados todos afirmaram não ter dado por nada de estranho. Apenas o empregado das cavalariças afirmou ter visto o sobrinho do patrão entrando na casa pela porta principal alguns segundos antes de se ouvirem os primeiros acordes do Tango dos Barbudos. Voltou a sair pela mesma porta, pouco depois de se começar a ouvir o Fado das Trincheiras, e dirigiu-se para a cozinha.
Logo a seguir chegou Antero que lhe entregou o cavalo que tinha sido aparelhado para ele ir visitar uma propriedade nessa manhã.

IV
Conclusão
Eduardo Trindade, depois de mais algumas averiguações dirigiu-se à sala onde tinha ordenado que todos se reunissem e esperassem por ele.
Todos estavam sentados junto das paredes formando uma roda no centro da qual o Inspector parou. Depois rodando sobre si foi observando atentamente e em silêncio cada um dos presentes sobre alguns dos quais demorava mais esta observação o que ia deixando todos cada vez mais nervosos com esta observação silenciosa.
De repente, dando meia volta brusca, apontou para António Cabral dizendo: Você está preso por ter matado o seu tio.
Todos se mostraram admirados e alguns ainda esboçaram um protesto Mas Trindade continuou:
Você entrou pala porta principal e alguns minutos depois ouviram-se os primeiros acordes do Tango do Barbudo. Como todos sabem esta composição inicia-se com algumas rajadas de metralhadora e tiros de canhão. Você aproveitou o ruído desses tiros para disparar sobre o seu tio, sem que ninguém se apercebesse, atingindo-o no temporal direito. Depois colocou a arma sobre a mão do seu tio mas, esqueceu-se de um pormenor muito importante. O seu tio não podia usar a pistola com a mão direita, faltavam-lhe os dedos.
Houve uma testemunha que você a seu tempo saberá quem é que o viu entrar na casa pela porta principal ouvindo-se logo a seguir o “Tango dos Barbudos”. Depois viram-no sair pela mesma porta, logo a seguir a ter começado a ouvir-se o Fado das Trincheiras, e dirigir-se à cozinha. Porquê esta volta se era mais prático ter passado pelo interior da casa? Você pretendia que pensassem que tinha vindo do exterior mas alguém viu esta sua manobra.
O meu Pai também entrou pela porta da cozinha retrucou, António exaltado.
É verdade. respondeu o inspector com toda a paciência, mas o seu pai esteve ausente toda a manhã e pouco antes de ter entrado na cozinha havia estado na cavalariça onde entregou o cavalo que havia usado.
Devo ainda avisa-lo de que alguém ouviu o seu tio ameaça-lo de lhe cortar a mesada que lhe dava e se isso acontecesse você ficaria na penúria, sem dinheiro para as suas farras. Quer um motivo melhor do que este?
Bem vamos embora e perante alguma resistência esboçada por António perguntou-lhe:
Quer acompanhar-me a bem ou preciso chamar os meus ajudantes?
Assim ficou resolvido o caso “A Morte do Veterano”

Tango dos Barbudos

http://www.youtube.com/watch?v=QJoL5iQtVNA

ou

http://www.ijigg.com/songs/V2C0G0EP0

MÚSICA PARA DANÇAR - TANGO DOS BARBUDOS


Formato: Acessórios

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Género: Portuguesa

Data de Edição: 01/12/1992

Editora: MOVIEPLAY

País: PT

EAN: 5602896060745

Preço: € 2,70

Para confirmar a particularidade do início da execução do Tango dos barbudos pode-se consultar o Link acima


Campeonato Nacional e Taça de Portugal 2010
Prova N.º 9 parte II
“Que Grande Lata” por ( Lateiro)

Nós sabemos que o caso se passou num dia 27 de Maio, mas não temos a informação do ano e num século existem 100 dias 27 de Maio.
Por este motivo rejeitamos a hipótese (D)
Pela mesma razão rejeitamos também a hipótese (A). A revista Super Jovem existiu realmente, mas foi há muito tempo e nas buscas que fizemos não conseguimos apurar a data da sua extinção. Em todo o caso isso aconteceu antes de 1998.
Normalmente, antigamente os cromos não eram autocolantes. Fiz algumas colecções como sejam, artistas de cinema, a Abelha Maia e outras, mas os cromos não eram autocolantes e a revista em questão é desses tempos aproximadamente Em todo o caso não temos forma de confirmar se essa colecção existia mas é de duvidar já que a ecologia não era a maior das preocupações das pessoas desse tempo.
Por tudo isto rejeito também a hipótese (B).
Por tudo isto fica-nos a hipótese ( C ). Como já vimos, embora não tenhamos conseguido confirmar a data da extinção da revista Super Jovem isso aconteceu muito antes de 1998 não existindo nessa altura ainda o Oceanário que só foi construído Para a exposição “Lisboa 98”. Portanto a minha escolha cai na hipótese. De referir ainda que estando o Oceanário rodeado pela água de uma lagoa artificial e em Maio o sol já vai alto Frederica não se podia aproximar das paredes do Oceanário para se abrigar do sol que certamente bateria em cheio nestas mais a mais estando virada para o Tejo
( C )

Rip Kirby

A SOLUÇÃO DE DR. GISMONDO

Efectivamente, nos anos sessenta do século vinte, de que muito bem nos lembramos, era realmente muito frequente ouvirem-se os “discos pedidos” dedicados aos nossos militares que cumpriam serviço no então Ultramar, as nossas ex-colónias. Esses pedidos constavam de autêntico relambório de nomes e faziam-se ouvir durante quase todo o dia e diariamente. Também é facto que muitos dos militares, quando regressavam dessa missão ingrata, continuavam a ouvir, nas suas casas, as músicas que mais os marcaram nesse longo exílio. Dessas músicas, sem dúvida que as que Almerindo Cabral ouvia eram também das mais escutadas e preferidas por outros militares e seus familiares.

Almerindo Cabral, beirão, com 69 anos bastante gastos, embarcara para Angola nos fins de 1961, poucos meses depois da guerra eclodir, tendo voltado dois anos depois. Não se sabe concretamente as dificuldades que lá passara, mas chegara muito abalado e mutilado com perda da totalidade dos dedos da mão direita, devido a um aacidente. Já na Metrópole, efectuou tratamentos variados e sentindo-se melhor abalou rumo ao Brasil, perante o apelo de um tio abastado que lá tinha. Este seu tio acabaria por falecer alguns anos mais tarde, e como não tinha herdeiros mais próximos, decidiu deixar todos os seus bens ao sobrinho Almerindo. Este ficou então na posse de uma avultada fortuna. Apesar de tudo continuou a trabalhar, até que, celibatário, sentindo-se só e bastante alquebrado, sem qualquer familiar por perto, decidiu regressar à sua terra natal. Assim, regressou a Portugal, numa tarde ensolarada de 1995. Construiu uma casa luxuosa e convidou para morarem consigo dois irmãos e três sobrinhos.
Adelino Cabral era o seu irmão mais velho, já com 71 anos, e passava a vida a queixar-se da sua sorte. Entendia mesmo que deveria ter sido ele o herdeiro da fortuna que Almerindo recebera, pois era o mais velho dos irmãos. A sua mulher já o havia abandonado poucos meses depois de casados. Enfim, achava-se mesmo uma vítima do destino. Quanto ao seu irmão Antero, o outro que acolhera em casa, tratava-se do mais novo e estudara num seminário. Era muito fechado e isolava-se muito a ler e escrever.
António Cabral era um dos três sobrinhos que viviam com o tio. Tinha 30 anos e era filho de Adelino. Era engenheiro, mas preferia viver um pouco à sombra do tio, pois dava menos trabalho.
Alberto Pereira, outro sobrinho, de 29 anos, era filho duma irmã de Almerindo, já falecida. Era médico e trabalhava num hospital em Lisboa.
Isabel Cabral, com 26 anos, economista a trabalhar num banco do Porto, era a filha de Antero Cabral.
Todos eles tinham aposentos na casa de Almerindo, embora Alberto e Isabel tivessem as suas residências nas cidades em que trabalhavam. Estes dois eram visitas frequentes da casa de Almerindo, enquanto António raramente lá ia e, quando aparecia, era para cravar o tio.
Nascido em dia de S. Martinho, 11 de Novembro, Almerindo gostava de festejar o seu aniversário e, nesse dia, muito prezava ter a família reunida em sua casa, o que fazia matando sempre um borrego, tarefa que partilhava com o seu irmão mais velho. Depois da matança do borrego, manhã cedo, Isabel chegava pelas oito horas e encarregava-se de assar o “bicho”, no forno, com muitas batatas. Alberto chegava um pouco mais tarde que a prima, enquanto António chegava sempre pelas 12,00 horas, já praticamente no início do almoço. No final do repasto costumavam ficar em volta da mesa, conversando, até que, pelas 17,00 horas vinham as castanhas assadas e as garrafas de água-pé. Normalmente, este ritual era o habitual.
Todavia, neste seu sexagésimo nono aniversário, as coisas não pareciam estar a decorrer como habitualmente. A comemoração do aniversário foi seriamente alterada.
Até perto do meio-dia tudo correu como de costume e na sala de jantar, todos, menos o António e seu pai Adelino, se encontravam a aguardar a chegada do anfitrião e aniversariante que fora ao seu quarto preparar-se para presidir à mesa. Estavam estes três na sala de jantar, quando às 11,40 horas, marcadas no relógio da sala, se começa a ouvir o som do Tango dos Barbudos, vindo do quarto de Almerindo. Acabada esta música, segue-se o Fado das Trincheiras, cantado por Fernando Farinha. Ouvia-se este fado havia já três minutos quando entrou na sala de jantar, vindo da cozinha, António Cabral. Foi censurado pelos presentes, devido ao seu atraso, mas logo referiu que aquele relógio se encontrava quinze (15) minutos adiantado. Não foi contrariado e o seu primo Alberto foi ao relógio e atrasou-o os tais quinze (15) minutos. Passaram-se mais cinco (5) minutos e entrou o pai de António, Adelino Cabral que depois da matança do borrego saiu e não mais fora visto até então.
Ora bem, aqui será importante verificar a temporização dos factos sucedidos. Primeiro, já estavam na sala de jantar três convivas quando o relógio da sala onde se encontravam marcava 11,40 horas e se iniciou a música no quarto do anfitrião. Essa música, muito conhecida, O Tango dos Barbudos, tem uma durabilidade de cerca de 3,27 minutos. Como o disco seria de vinil teria de ser substituído pelo seguinte, o “Fado das Trincheiras” que, ao seu terceiro minuto, marca a chegada de António à sala de jantar. Somando os cerca de 3 minutos e meio aos três minutos, mais 30 segundos para mudança dos discos de vinil, teremos que o António entrou, mais ou menos, ao sétimo (7º) minuto pós 11,40 horas. Tudo somado teremos que a entrada de António se verifica às, mais ou menos, 11,47 horas, mas...o mesmo António diz ao familiares ali presentes que aquele relógio está adiantado 15 minutos (?!). Ninguém contraria a afirmação e o seu primo Alberto atrasa 15 minutos ao relógio. Este ficaria então a marcar 11,32 horas.
Ora isto altera tudo o que antes se temporizou, ou seja, o “Tango dos Barbudos” começou a tocar, não às 11,40 horas, mas às 11, 25 horas. Só assim se justifica que António chegou às 11,32 e o seu pai, Adelino, cinco minutos depois, ou seja, às 11,37 horas (pela hora anterior seriam 11,52 horas). Tal quer dizer que afinal todos se reuniram na sala de jantar antes das 11,40 horas, altura em que, pressupostamente se iniciou a música no quarto de Almerindo. Para o caso, de momento apenas interessa referir que pela “hora de António” todos estavam na sala de jantar às 11,37 horas.









Quando acabou o “Fado das Trincheiras” que demora cerca de 3,58 minutos, ainda não tinha chegado Adelino, pai de António. Todavia, uma coisa curiosa sucedeu. Não foi mudado o disco para a música que tocaria habitualmente de seguida, ou seja “O Imigrante” tocado pelo conjunto Maria Albertina. O disco de Fernando Farinha continuou a tocar as músicas seguintes até ao final, acabando por ficar sem som. Espantosamente, só quando o relógio marcava 12,30 horas (hora com atraso de 15 minutos, pois contrariamente marcaria 12,45 horas) e perante a grande demora de Almerindo, Isabel decidiu ir ver o que se passava para tamanho atraso. Bateu à porta do quarto do tio, mas não obteve resposta. Bateu com mais força, mas a resposta continuava sem resposta. Ganhando alguma coragem entreabriu a porta e espreitou para dentro do quarto. Empurrou então a porta com mais força e entrou no quarto. O tio estava estendido no chão, com os braços abertos em cruz, com um ferimento de mau aspecto no temporal direito, chamuscado e com resíduos de pólvora. Tinha sobre a mão direita uma pistola.
Analisando estes factos deveremos debruçar-nos sobre mais alguns pormenores importantes. O “Fado das Trincheiras” demorou cerca de quatro minutos a tocar. Ao terceiro (3º) minuto deste fado entrou o António que até originou um atraso do relógio de 15 minutos, efectuado pelo Alberto, como sabemos. Quando acabou este fado, outra música de Fernando Farinha começou a tocar, mas tal não era hábito, pois sabemos que Almerindo colocaria “O Imigrante” do conjunto de Maria Albertina. Ora isto parece estranho, pois as pessoas poderiam, na sala de jantar, ter-se apercebido desta alteração ao que era usual nos anos anteriores. Acredito que o barulho e entusiasmo das conversas poderiam nem sequer permitir a percepção musical e quiçá um desinteresse pelas mesmas, o que serviria de desculpa para ninguém ter dado pela alteração, até porque decerto mais músicas de Fernando Farinha terão tocado até acabar o disco de vinil. Contudo há uma coisa que me parece também estranha. Quando Adelino entra, já tocaria outra música de Fernando Farinha, que não o “Fado das Trincheiras”. Porque não se apercebeu duma música que não era habitual nestes almoços de S. Martinho? Distracção? Talvez por pensar que já vinha atrasado, mas se pensasse tal, também poderia reparar que o relógio talvez pudesse estar com hora alterada em relação à sua, mas nada disse nem comentou. Porque demoraram tanto tempo a ir verificar se Almerindo estaria bem, uma vez que a música já tinha acabado havia algum tempo. O disco de Fernando Farinha começou a tocar cerca das 11,44 horas (antes do atraso) ou seja, pelas 11,29 horas face ao atraso sofrido. E Isabel só uma hora depois do início do “Fado das Trincheiras” é que foi verificar o que se passaria para que o tio demorasse tanto tempo a vir almoçar. Foi demasiado tempo, na verdade, já que se estava a verificar uma verdadeira alteração de tudo aquilo que era habitual naquela data festiva. O que interessa é que Isabel foi e deparou com o inesperado. O seu tio estava caído no chão, estendido com os braços abertos em cruz e com o ferimento já descrito atrás que revela um disparo no temporal direito, com arma praticamente encostada à pele, pois deixou a mesma chamuscada e com resíduos de pólvora. Tal só poderia ter sido feito ou pelo próprio ou por alguém que tivesse permissão de se aproximar muito da vítima, alguém familiar. Como já sabemos Almerindo perdeu os dedos da mão direita num acidente, precisamente em Angola. Ora ninguém com perda de todos os dedos da mão direita consguirá, com essa mão disparar um tiro no temporal do mesmo lado (direito) e se o fizesse com a outra mão era também praticamente impossível disparar com a pistola encostada à têmpora direita (experimente-se o movimento). Também caindo no chão o suicida nunca ficaria com a arma sobre a mão. Daqui se conclui que ali houve um assassinato e cometido por alguém muito próximo da vítima. Mas há outro problema que se levanta, que é o ruído feito pelo disparo da arma. Como é que ninguém ouviu esse estampido do disparo? Tem uma explicação, mas adiante se dirá quando se tiverem restantes dados analisados.
Quando Isabel saíu do quarto do tio fechou a porta à chave e correu para a sala de jantar, comunicando o que aconteceu. Em seguida foi à sala de entrada de onde telefonou para a polícia. Entretanto todos correram em direcção ao quarto da vítima, excepto António que ficou para trás juntando-se aos outros pouco mais de dois minutos depois. Quando o inspector Eduardo Trindade chegou ele mesmo conferiu que eram 13,15 horas no relógio da sala de jantar e, de imediato, se dirigiu para o quarto de Almerindo, observando-o atentamente. Verificou que no quarto não havia sinais de luta. Nas suas perguntas o inspector concluiu que todos os familiares se encontravam reunidos na sala de jantar, de acordo com a hora marcada no relógio ali existente (na sala de jantar) desde as 11,30 horas, excepto o António que chegou, segundo testemunho dos seus familiares, cerca das 11,35 horas entrando pela porta da cozinha, e o seu pai (Adelino) que entrou pouco depois (cerca de cinco minutos) com trajo de equitação, pela mesma porta. António referiu que não chegou mais cedo porque esteve na cavalariça a examinar um cavalo recentemente comprado. Já o seu pai referiu que foi visitar uma propriedade, algo distante, a pedido do seu irmão.
Fazendo uma análise deste últimos factos vemos que Isabel age com alguma rapidez, avisando primeiro os familiares reunidos na sala de jantar, indo depois à sala de entrada para telefonar à polícia. Antes de sair do quarto do tio fechara a porta à chave, provavelmente para ninguém entrar e mexer. No entanto todos se dirigiram para esse quarto, excepto António que se atrasou pouco mais de dois minutos e só então se juntou aos outros. A verdade é que este atraso do António me cheira a esturro, pois provavelmente esteve a mexer no relógio da sala de jantar, por motivos que só ele saberia. Não se afirma que entraram no quarto, mas que se dirigiram para lá. Seguidamente chegou o inspector Eduardo Trindade que reparou nas horas que marcava o relógio da sala de jantar. Eram 13,15 horas. Ora, Isabel reagiu pelas 12,30 horas (pós atraso de 15 minutos por Alberto). Foi relativamente rápida nas suas atitudes até chamar a polícia que provavelmente não terá demorado muito tempo. Das 12,30 às 13,15 que marcava à chegada de Eduardo Trindade, passaram, naturalmente, quarenta e cinco minutos! Acho que será muito tempo, o que me leva a insinuar que António, naquele seu pequeno atraso rumo ao quarto do tio (pouco mais de dois minutos), deverá ter adiantado o relógio da casa repondo as verdadeiras horas, pois sabia da vinda da polícia, mas também tinha os familiares por testemunhas em como o relógio estava 15 minutos adiantado quando chegou a casa e os próprios familiares viram Alberto atrasar o relógio 15 minutos. Mas, agora, ninguém saberia que ele voltou a adiantar o relógio repondo a hora inicial, que me parece ser a que estava exacta, conforme depoimentos que virão a seguir, do empregado da cavalariça. De salientar que Eduardo Trindade verifica a hora já depois da interferência do António. Com certeza que o relógio pessoal do inspector estaria em concordância com o da sala de jantar, na hora da sua entrada e agora que colhia depoimentos. Mas os familiares de António (Antero, Isabel e Alberto) pensam que o relógio ainda estará como ficou após Alberto o ter atrasado quinze minutos. Quanto ao pai, Adelino, já entrara na sala de jantar com o relógio retocado por Alberto e até nem parece ter reparado no mesmo. Há na realidade algum interesse de António em ter reposto os quinze minutos que Alberto, por sugestão do primo, recuou, sem qualquer oposição dos outros familiares lá presentes na altura.
Dos empregados da casa apenas depôs o empregado da cavalariça pois todos os outros dizem que não viram nem ouviram nada de estranho. Assim, aquele empregado vem certificar o verdadeiro “timing” dos factos sucedidos.Viu António dirigir-se para a casa um pouco antes de se começar a ouvir o “Tango do Barbudos” e saindo, pouco depois de se iniciar o “Fado das Trincheiras”, pela porta principal e encaminhar-se para a porta da cozinha. Não referiu hora, apenas factos que servem de referência perante o sucedido. Da mesma forma disse que após a matança do borrego tinha aparelhado um cavalo para Adelino que saiu e voltou às 11,50 horas. Aliás o mesmo empregado afirmou que na véspera ouvira a vítima discutir com António e dizer-lhe que deixasse de contar com o dinheiro dele. Acrescente-se que o médico legista prognosticou a hora da morte, que foi instantânea, entre as 11,20 e as 12,45 horas.
Pois bem, aqui está desmascarado o verdadeiro autor do crime, que não resta dúvidas ter sido António, daí o seu interesse em manipular as horas para tentar baralhar os dados. Na realidade o empregado, que teria o seu relógio acertado, não tinha qualquer interesse em fornecer horas erradas. Claro que inicialmente, referindo-se à mobilidade de António, nem sequer refere horas, mas correlaciona os movimentos do mesmo de acordo coma as músicas que tocavam. Ah, e não diz que o António esteve na cavalariça a examinar um cavalo recentemente comprado, o que leva a pensar que António mentiu quando criou essa desculpa.
António, segundo o empregado da cavalariça, dirigiu-se para casa um pouco antes do início da primeira música ((11,40 horas antes do atraso de Alberto, ou 11, 25 horas pós atraso do Alberto). Diz ainda, o mesmo empregado que ele saiu pouco depois de se iniciar o “Fado das Trincheiras” ( perto das 11,44 horas antes do atraso, ou 11,29 horas após atraso). Depois António sai pela porta principal e dirige-se para a porta da cozinha. Daqui, vai direito à sala de jantar onde estão os três familiares a quem diz que o relógio estava adiantado 15 minutos. Ora, pela hora inicial entrou na sala de jantar cerca das 11,47 minutos e pelo acerto, por ele sugerido, às 11, 32 minutos.
Agora comparando a chegada do seu pai, em que o empregado da cavalariça diz que chegou às 11,50 horas, e sabendo que Adelino foi logo para a sala de jantar, indo pela porta da cozinha, só poderia ter chegado à sala de jantar depois das 11,50 horas e nunca poderia ter chegado às 11,37 horas , mas sim às 11,52 horas, porque chegou cinco minutos depois do filho. Logo, António enganou os familiares na hora em que chegou, e o relógio estava mesmo certo desde início. O golpe seria baralhar o pessoal induzindo os restantes em horas erradas nas movimentações e não timing das músicas.
Daqui também concluo que António, quando chegou foi ao quarto da vítima e o tio (mais provável) ou ele próprio (menos provável) colocaram o primeiro disco. Certo é que já estavam os dois no quarto. Logo que colocado o disco, que se inicia com ruído de disparos de armas de fogo, como se sabe, António aproveita este ruido de tiros e dispara a arma contra a têmpora direita do tio, matando-o instantaneamente. Claro que quem estivesse a ouvir a música nem se aperceberia do verdadeiro tiro da pistola, pois o mesmo se confundiria com os do “Tango dos Barbudos”. Morto o tio, colocou-o no chão deitado com braços abertos em cruz e colocou-lhe (estupidamente) a arma sobre a mão direita que não tinha dedos. Acabado o primeiro disco, retira-o e substitui-o pelo “Fado das Trincheiras” do Miúdo da Bica e sai do quarto pela porta principal, dirigindo para a sala de jantar entrando agora pela porta da cozinha. Entretanto a música de Fernando Farinha continua, porque os mortos não mudam os discos. Chegado à sala de jantar, é a história do relógio adiantado que já conhecemos.
No entanto antes da chegada do inspector da polícia, e aproveitando a saida dos familiares em direcção ao quarto do tio, António reacerta o relógio, sem que ninguém se aperceba, tentando baralhar dados e até iria dar os restantes familiares como mentirosos.
Só que o trabalho global, além de mal elaborado, acabou por ser desmascarado pelo empregado da cavalariça, como já apontado. A hora da chegada do pai e a correlação com os tempos musicais, acabaram por incriminá-lo, além de que já havia discutido de véspera com o tio, o que foi testemunhado pelo mesmo empregado da cavalariça.
E pronto, creio ser tudo de momento neste caso bem urdido pelo grande Rip Kirby.

Passo agora ao segundo problema, o de resposta múltipla, intitulado “QUE GRANDE LATA” de autoria de Lateiro.
A revista Super Jovem publicou-se nos anos noventa e alguns dos seguintes, embora nunca me tivesse passado pelos olhos qualquer dessas revistas. Por esse facto, a alínea A está fora de questão como mentira de Frederica.
Não cheguei a comprovar qualquer referência aos cromos bocas Ecológicas, mas acredito que os haveria, não sendo também uma mentira da miúda.
Quanto à alínea D não me parece também mentira pois até nem se especifica que dia 27 de Maio.
Parece-me que a mentira consiste em ela ter dito que se sentou à sombra do Oceanário, naquela tarde, a ler a revista em frente do Tejo. Tal seria impossível já que em frente ao Tejo não há local onde pudesse estar, a menos que boiasse nas águas do rio.
Logo, a alínea certa será a C- não podia sentar-se à sombra do Oceanário para ler a revista.

 Dr GISMONDO