domingo, 25 de novembro de 2012

POLICIÁRIO 1112




Desvendamos hoje a solução do problema que constituiu a parte II da prova n.º 7 das nossas competições desta época, enigma de autoria de Zé da Vila, um dos pseudónimos usados pelo confrade que é unanimemente considerado o Mestre da produção de problemas policiários: M. Constantino, de Almeirim.
A ele dedicamos, esta semana, o nosso espaço, numa altura em que o próprio M. Constantino anuncia a retirada da produção de enigmas e em que se ergue um coro de protestos de todos os confrades que se habituaram a ver nos seus escritos, desafios de enorme qualidade e rigor.
 Não queremos deixar de unir a nossa voz ao apelo para que o Mestre da Produção Policiária, não leve por diante os seus intentos, deixando de nos honrar com os seus problemas, sempre renovados, sempre intelectualmente desafiantes.


CAMPEONATO NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL
SOLUÇÃO DA PROVA N.º 7 – PARTE II
O ENIGMA DA MORTE DO CONSTRUTOR – de ZÉ DA VILA

Se colocou a cruzinha na segunda alínea (Tratou-se de suicídio) fez um bom trabalho de pesquisa e dedução. Acertou!
Resposta correcta: 2- Tratou-se de suicídio.
Na verdade, está fora de questão a hipótese de acidente, visto que seria muito estúpido apontar, involuntariamente, à cabeça uma arma carregada. E, no caso da arma ter caído disparando acidentalmente ao bater no chão, dado que a vítima estava em pé, nunca o projectil a atingiria na cabeça. Quando muito, as pernas ou o dorso. Igualmente, temos de excluir a morte por assassínio cometido por uma das mulheres, por falta de apoio à tese, na narrativa.
O suicídio foi pensado de modo a parecer um assassínio, com vista ao pagamento do seguro à Clara. Na quase totalidade das apólices de seguro de vida, não cabe o suicídio, ou fazem depender o pagamento de um período de vida mais ou menos longo. Assim, Aguiar possuía a arma ideal que evita puxar o gatilho três vezes – nenhum suicida o consegue fazer – porquanto aquela automática dispara em rajada com uma única pressão no gatilho. E a cremalheira 93 R, adaptada à arma suicida, limita a rajada a três tiros!
Aguiar pensou em tudo: Limpou as balas quando carregou a arma (as impressões digitais seriam gato escondido com rabo de fora); espalhou as lâminas cortando propositadamente os dedos indicador e superior da mão direita, nos quais enrolou grossa camada de adesivo de modo a fazer crer que os disparos foram de outrem, uma vez que não podia disparar com a mão direita e os tiros foram disparados no lado direito da cabeça. Pegou na arma com a mão esquerda, apontou à cabeça do lado oposto e premiu o gatilho! O impulso no mesmo gatilho, permitiu atingir o ouvido, o cérebro e o tecto (3 munições da rajada). As impressões digitais na arma pretenderam passar a ideia de assassino desconhecido!

M. CONSTANTINO, O MESTRE DA PRODUÇÃO

Não são necessárias muitas palavras para definir M Constantino, aquele que é, unanimemente considerado o melhor produtor de enigmas policiários, em actividade.
Conhecemo-lo há longos anos em diversas facetas da sua vida policiária, não só como produtor excelente, mas igualmente como ensaísta e estudioso destes assuntos, com trabalhos importantes, felizmente muitos publicados graças à Associação Policiária Portuguesa (que permanece em longa e teimosa letargia), mas também como conviva, sempre presente em todos os eventos de relevância na nossa vida policiária.
Destacamos, entre as suas mais importantes obras, a “História da Narrativa Policiária”, a “Antologia Portuguesa de Contos Policiais” (ambas em 2 volumes), o “Grande Livro da Problemística Policiária”, o “Manual da Enigmística Policiária”, “Antologia dos 150 Anos da Literatura Policial (1841 a 1991), “Os Elementos Fundamentais na Narrativa Policiária Clássica”, etc. etc.
Atentemos às suas palavras, onde encontramos muito daquilo que nos anima e move no Policiário:
«O homem encontra no enigmático algo que lhe excita o espírito e lhe motiva a curiosidade.
Posto perante um mistério, todas as faculdades se lhe alertam e, atentas, se debruçam em torno do problema.
Sente prazer íntimo em seguir passo a passo todas as pistas até alcançar o objectivo.
Satisfaz-se ao conseguir rodear as dificuldades, tanto como vencer obstáculos que se apresentam intransponíveis.
E quanto mais a precisão dos factos não se permite que se vislumbre sombra de uma estrada, maior é o apego e o desenvolvimento do cérebro, maior é a satisfação da vitória.
Segundo Bergson, um problema que inspira atenção é uma representação duplicada de uma emoção, sendo ao mesmo tempo a curiosidade, o desejo e a alegria antecipada de o resolver. É o desafio posto que impele a inteligência diante das interrogações, vivifica, ou antes vitaliza os elementos intelectuais com os quais fará corpo até à solução.
A própria vida cifra-se em constante mistério, um enigma constante que a humanidade procura solucionar o melhor e mais rapidamente possível. O obscuro nunca nos desampara, desafia-nos.
De prazer espiritual que se sente em desvendar incógnitas, desvanecimento de sobressair, simples divertimento, tudo conduz a que os homens do povo na sua singeleza através de simples adivinhas que andam de boca em boca, os letrados com bem urdidos trabalhos, os sábios na esfera da humanidade, acorram ao seu cultivo e decifração.»

M. Constantino, “Manual da Enigmística Policiária”,
Edição da Associação Policiária Portuguesa, 1995



quinta-feira, 22 de novembro de 2012

JARTURICE OU... JARTURADA - XI




O Agente Álibi
 Publicado na secção POLICIÁRIO em: 22.Novembro.1992

A página do PÚBLICO – POLICIÁRIO, nesta data, há VINTE ANOS ATRÁS, inseria, na primeira parte do seu miolo, a solução do problema mencionado na epígrafe, a qual, como estarão recordados, já divulgámos, acompanhando o respectivo problema.

Seguiam-se-lhe as classificações, que não julgo necessário publicar hoje, pois isso só revelarei de tempos a tempos, (como fiz na semana transacta), quando o achar oportuno, para recordatório de presenças ou para melhor aproveitamento de espaços.

Como creio já ter ficado bem patente ao longo da ainda curta vida destes «Ficheiros Indiscrectos», a principal finalidade da sua existência, é preservar, para a HISTÓRIA DA PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PORTUGUESA, em especial e principalmente, os problemas e respectivas soluções, produzidos e publicados nas secções da especialidade. E cá vamos nós, paulatinamente, avançando com a nossa voluntariosa missão, para tentar reunir, num espaço digo e dignificante, todas as secções policiárias editadas em Portugal, e bem assim, todos os problemas policiais nelas inseridos, não só de produção portuguesa, mas também internacional. E temos já recolhidos algumas centenas, aumentando o espólio do nosso .
 
Mas… voltando à página POLICIÁRIO, do «PÚBLICO», à direita, numa coluna, a toda a altura da página, uma  “caixa” atraente e apelativa divulgava:

NOTÍCIAS

A realização do XVI CONVÍVIO DE TORRES VEDRAS, a realizar no dia 29 de Novembro de 1992.
Indicava-se, como seria obrigatório, o local do almoço e hora da concentração, e avançava-se o…
Programa:
- distribuição da 2.ª edição de “O Grande Livro da Problemática Policiária”.

- lançamento da 50.ª edição da APP, “CRÓNICA X” n..º 13, com o título: “ABC da Narrativa Policial Espanhola”;

- atribuição do troféu ROSS PYNN a JOEL LIMA;

- atribuição de medalhas gravadas da  APP;

- atribuição do troféu REPÓRTER X a HENRIQUE NICOLAU;

- divulgação das classificações dos V JOGOS FLORAIS;

- apresentação de iniciativas da APP para o ano 1993.
                                                                                              J a r t u r

domingo, 18 de novembro de 2012

POLICIÁRIO 1111



Concluímos hoje a publicação do trabalho sobre a Literatura Policial.
Temos a consciência plena que ficou muito por dizer, autores e detectives que mereceriam uma referência, mas a Literatura Policial é um mundo muito vasto e onde se cruzam muitos estilos, variando os destaques e interesses em conformidade com a abordagem efectuada.
Tendo como base os clássicos mais relevantes ou mais divulgados, parece-nos que fizemos a abordagem possível e não esquecemos o essencial.

Regressamos, também, às nossas competições desta época, publicando a solução do problema que fez a primeira parte da prova n.º 7, de autoria do confrade Leopardo.
Vamos ficar a saber se realmente ocorreu um crime (e neste caso quem foi o seu autor) ou se houve um suicídio e como é que o Capitão Isaías resolveu o assunto.


Literatura Policial – Parte III

Outros nomes varreram o panorama policial interno, de que destacamos:
Adolfo Coelho com o pseudónimo J. Stew, nos anos 20; Américo Faria como Adam Fulton e Ans. Shouldmarke; António Carlos Pereira da Silva, como Simon Ganett ou Barney Kilbane; Dinis Machado, como Dennis Mc Shade, tendo como personagem Peter Maynard; Fernando Luso Soares com os seus personagens Inspector Boaventura e Dr. Castro; Fernando Pessoa que criou os personagens Dr. Abílio Fernandes Quaresma, Tio Porco e Chefe Guedes; Francisco Valério Almeida Azevedo, com o pseudónimo de W. Strong Ross e personagem Inspector Ryan; Gentil Marques, com os pseudónimos de Charles Berry, James Stron (criador de Rangú), Marcel Damar, Herbert Gibbons; D. G. Richter e muitos outros; Guedes de Amorim, como Edgar Powel; José da Natividade Gaspar, como Sam Brown ou J. Fergusson Knight; Luís Campos, como Frank Gold; Mariália Marques, como John S. Falk, Hugh Mc Benett ou Ossman Matzyk; Mascarenhas Barreto, como Van Der Bart.

Na moderna Literatura Policial Portuguesa vivem-se momentos de alguma acalmia. Algumas felizes incursões de autores consagrados, como José Cardoso Pires em “Balada da Praia dos Cães”, Agustina Bessa Luís em “Aquário e Sagitário”, Clara Pinto Correia em “Adeus Princesa” ou Francisco José Viegas, em “As Duas Águas do Mar”, não conseguem agitar o meio, que continua placidamente a viver de alguns novos valores como Maria do Céu Carvalho, Manuel Grilo, Miguel Miranda, Ana Teresa Pereira ou Henrique Nicolau.
Sem conseguir afirmar-se como uma “escola”, a verdade é que o Policial Português sempre conseguiu encontrar o seu espaço, com recurso a pseudónimos estrangeiros ou não.
E mesmo fora do movimento editorial, há mais de vinte anos que milhares de pessoas escrevem sobre o policial, desafios e suas propostas de resolução, nas páginas da edição dominical do Público, que vem funcionando como um verdadeiro “ponto de encontro” dos amantes do Policial.



CAMPEONATO NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL
SOLUÇÃO DA PROVA N.º 7 – PARTE I
“CRIME OU SUICÍDIO?”, Original de LEOPARDO


Só podemos estar na presença de um crime. O banco sobre o qual, presumivelmente, a vítima se teria colocado para praticar o suicídio tinha apenas 50 cm de altura, mas os seus pés encontravam-se a um metro do chão.
Perante esta evidência o crime está sobejamente provado. Agora só temos que reconstituir a forma como o crime teria sido cometido. É provável que o assassino tenha agredido a vítima deixando-a sem sentidos. De seguida passou a corda, com que certamente já iria prevenido, por cima da trave do tecto. Atou uma das pontas no pescoço do velho e içou-o atando em seguida a corda num prego, que possivelmente já lá estaria pregado, mas não é de excluir a hipótese de ter sido ele a pregá-lo.
O velhote era gordo pelo que a tarefa do assassino a içá-lo foi certamente árdua, mas poderia ter sido menos penosa se o não elevasse tão alto, o banco tinha só 50 centímetros pelo que não era necessário levantá-lo até um metro do solo o que logo chamou a atenção do Capitão Isaías para a impossibilidade de suicídio
Outras provas de que foi um crime são-nos fornecidas pelo prego ligeiramente inclinado para baixo. Se o velho se tivesse enforcado, dada a fragilidade do prego, este ficaria inclinado para cima devido ao peso do corpo e ao esticão que teria sofrido. Também a pequena ripa encontrada entalada entre a trave e a corda eram prova de que o corpo fora içado. Em caso de suicídio essa ripa poderia, eventualmente, estar entalada entre a corda e a parte lateral da trave. Também as fibras quebradas da corda demonstram que o corpo fora içado.
Posto isto só me resta revelar quem foi o autor da façanha. Maria dos Prazeres e o Tó Marreco não tinham compleição física que lhes permitisse içar o corpo ainda que este fosse leve. Portanto só o João Coxo poderia ter feito aquele trabalho. Curiosamente, no caminho para a cabana não se notam pegadas dele. Isto significa que ele fora para a cabana antes da chuva ter chegado pelo que as suas pegadas não ficaram bem impressas no chão duro e a chuva da noite apagou as que eventualmente existissem.
Apoiado em tudo isto, o Capitão Isaías antes de abandonar a aldeia deu voz de prisão ao João Coxo.



quinta-feira, 15 de novembro de 2012

JARTURICE OU...JARTURADA - X







TORNEIO DE PREPARAÇÃO
Prova n.º 4
O ROUBO DA TRÍADE
Original de: DE LA TIERRA (Almada)
  Publicado na secção POLICIÁRIO em: 15.Novembro.1992

Já há dois dias que chovia ininterruptamente. O detective Cecílio, reformado alguns meses antes, radicou-se num país da África Ocidental, o Gana, em plena estação das chuvas. O cheiro agreste daquele ambiente tropical penetrava longamente nas narinas largas desse homem gorducho e rosado que granjeara fama internacional ao longo de uma carreira de muitos anos. Estava sentado no seu quarto de hotel, junto de uma janela cujos vidros escoavam gotas finas e ondulantes de chuva, quando se fez ouvir o ruído estridente do telefone.
- Alô! – exclamou Cecílio.
- Está? Cecílio? Daqui fala Numyai, da Tailândia.
- Oh. Há quanto tempo, hein? Então, que novidades contas dessas paragens?
- Como sabes, tornei-me comissário da Interpol e preciso da tua ajuda…
As nuvens começaram a dissipar-se no céu. Vinha aí bom tempo. Bom prenúncio, pensou Cecílio. Desceu do seu quarto, para as ruas húmidas da cidade.
Munido de um impermeável, Cecílio meteu-se no interior dum táxi.
- Para o aeroporto de Acra, por favor.
Recostado nos bancos gastos do veículo, o velho detective relembrou tudo o que Numyai lhe contara ao telefone. O caso era simples. Um roubo importante tinha sido cometido em Bangkok. O objectivo em causa era um conjunto de três peças unidas representando deuses imemoriais, uma antiga e valiosa tríade religiosa.
Há muitos anos que era guardada numa velha loja de antiguidades, conhecida entre os tailandeses pela grande figura em madeira, dependurada no tecto, de Buda Jejuante, numa área citadina interdita a estrangeiros. Ão havia dúvidas quanto à hora a que o crime fora perpetrado: pouco instantes antes das 9 horas da manhã. Tinha sido um trabalho ultra profissional. Encontraram um canivete junto do cofre arrombado, já com um certo desgaste de dedos no lado direito do cabo, provavelmente o canivete preferido do criminoso, mas não foi possível identificar impressões digitais.
Os suspeitos eram três homens, com passados ligados ao roubo internacional. Eram todos norte-americanos, e conheciam-se-lhes modalidades diferentes. Mahoney era perito em explosivos de baixa densidade; Carlsson adquirira fama nos sistemas digitalizados de alarme e Travis era um conhecido traficante de influências e subornos. Os três homens haviam saído de Bangkok sem que tivesse sido possível contactá-los para as investigações. Por uma feliz coincidência, os três viajaram precisamente para Acra, a capital do Gana. Cecílio tinha sido incumbido de descobrir o que fosse possível para a captura do autor.
 Quando chegou ao amplo salão do aeroporto, já os três homens se dirigiam para a saída de táxis. Haviam chegado às 16 horas. Cecílio dirigiu-se a eles.
- Hello – começou Cecílio – mandaram-me vir buscá-los.
Os três homens franziram a testa.
- Desculpe – replicou – mas deve haver um engano. Acho que nenhum destes senhores me conhece e vice-versa.
Os outros dois anuíram afirmativamente.
- Deve ser esta minha velha e confusa cabeça. – lamentou-se o detective – Oh, agora reparo! – Apontou para um colar que Mahoney ostentava ao peito. – Vejo que tem aí uma bela recordação alusiva a Wat Phra Keo. Aposto que a comprou naquela loja grande, em Bangkok, com o seu grande Siddharta Iluminado no meio do tecto.
Mahoney sorriu.
- Não é Siddharta Iluminado, basta olhar e vê a figura de Siddharta Jejuante.
- É isso, é isso…
- Pode dizer-me onde arranjar um hotel? – questionou Travis.
- Claro. – disse Cecílio, virando-se para ele. – Não quer anotar?
O homem rabiscou num bloco de notas com um lápis seguro na mão esquerda, enquanto o detective ditava uma morada.
- E o senhor, não procura um? – disse para Carlsson. – Tem um ar cansado. Por acaso ouviu falar do roubo da tríade, em Bangkok?~
- Da quê? Não, não sei de nada.
- Aconteceu hoje de manhã Já corre pelos jornais vespertinos do mundo.
- Como poderia eu saber? Para realizar uma viagem de 13 horas, tive de largar de Bangkok antes desse acontecimento, pelas 3 horas da madrugada, para estar aqui a esta hora.
Os três homens despediram-se do detective e seguiram destinos diferentes. Cecílio entrou numa cabine telefónica, discou um número e esperou.
- Está? Numyai? Pois bem, acho que deves vir para cá e trazer mais homens do que o habitual…
-Quem roubou a tríade? - perguntou Numyai – Conta-me como descobriste.

Quer ser você a responder? 

                      
NOTA:
Acompanhando este problema, naquele dia de há 20 ANOS ATRÁS, no «Espaço público» inserido na rubrica «Notícias», o LP “dizia”.
«NA SEQUÊNCIA do ponto 1 da semana passada, naturalmente destinado a levantar polémica, eis uma carta de F. PERLICO, excessivamente longa, mas que tentaremos reproduzir, nos seus pontos fundamentais».
Que me perdoem os dois “polémicos”, mas não ocuparei, por agora, espaço com essas divergências, sempre perniciosas para o “ambiente” onde se instalam. 
É minha ideia, todavia, criar no AHPPP, departamentos destinados a POLÉMICAS, PLÁGIOS, PROBLEMAS PROBLEMÁTICOS, e outros “INSÓLITOS” que possam suscitar interesse.
                                  Jartur  
       
TORNEIO DE PREPARAÇÃO
Solução da prova n.º 4
O ROUBO DA TRÍADE
Apresentada por: DIC ROLAND (Retaxo – Castelo Branco)
   Publicado na secção POLICIÁRIO em: 13.Dezembro.1992

A tríade foi, de facto, roubada pelos três americanos, cada um dos quais seria portador de uma das peças do valioso conjunto.
Os elementos fornecidos, pelo telefone, ao detective Cecílio, e bem assim o diálogo deste mesmo detective com os três suspeitos, no aeroporto de Acra, parecem conduzir a tal conclusão. De facto:
a ) – Começa por ser altamente suspeito que três americanos, supostamente desconhecidos uns dos outros, tenham viajado no mesmo avião e com o mesmo destino (Acra), logo a seguir ao roubo;
b ) – O passado criminoso dos três viajantes caracteriza-se por um conjunto de modalidades de actuação que, no caso vertente, se conjugam e se completam no sentido do êxito da operação de Bangkok; os explosivos de baixa densidade (Mahoney) teriam servido para forçar a abertura do cofre; o sistema de alarme (Carlsson) terá sido previamente avariado; e a entrada na área citadina interdita a estrangeiros teria sido conseguida graças a subornos e tráfico de influências (Travis).
c ) – Ao corrigir o detective, quando este aludiu ao Siddharta iluminado, o suspeito Mahoney revelou que havia estado na loja de antiguidades, em cujo tecto estava pendurada uma imagem de Siddharta Jejuante, em zona interdita a estrangeiros.
d ) – O suspeito Travis, utilizando a mão esquerda para escrever, poderia ser a mesma pessoa que utilizou o canivete encontrado junto do cofre arrombado e em cujo cabo (do lado direito) havia sinais de ser habitualmente manejado por um esquerdino.
e ) – O argumento do suspeito Carlsson para explicar a sua alegada ignorância a respeito do roubo de Bangkok, é claramente falso; tendo em conta a diferença de longitude entre os pontos de partida e de chegada (cerca de 90 graus) e considerando que a viagem demorou treze horas, no sentido Leste-Oeste, o avião não podia ter partido às três horas da madrugada, mas sim por volta das nove da manhã – isto é, depois de perpetrado o roubo; a diferença horária é de menos sete horas (sete fusos horários para Ocidente), o que explica que, tendo o avião chegado às 16h00 de Acra (ou seja 23h00 de Bangkok), a sua partida só poderia ter sido às dez horas locais e não às três da madrugada!
                Cid Roland
               



                            

domingo, 11 de novembro de 2012

POLICIÁRIO 1110



 Continuamos hoje um retrato necessariamente breve sobre a Literatura Policial, sob uma perspectiva pessoal, tendo a preocupação de tentar focar os autores, personagens e obras que tenham contribuído para uma evolução do próprio Policial.
Quando olhamos para os clássicos, para o modo como organizaram os seus romances e desenvolveram as tramas que “agarram” leitores de todas as épocas e de todos os pontos do mundo, ficamos com a noção perfeita do “marketing” que está subjacente à forma (mais do que ao conteúdo) como é feita essa construção.
Evidentemente que o Policial actual é completamente diferente, fez o acompanhamento dos tempos, fez o seu trajecto para se adequar às novas “regras” que os leitores estabelecem para seguirem os casos relatados. Hoje em dia, quem teria paciência para ler um romance policial longo, descritivo, maçudo, se o tempo disponível para a leitura é o de uma viagem de metro ou de autocarro?
Falamos, como é óbvio, de leitores comuns, não muito preocupados com as características técnicas dos casos descritos, mas mais com as consequências da decifração de cada caso.
Esta situação levava-nos a uma discussão sobre os modos de encarar e ler o Policial, que não cabe aqui e agora, mas a que voltaremos quando tal se propiciar.

Entretanto, prosseguimos a nossa resenha histórica:

Literatura Policial – Parte II

Nos anos 20 do século passado são as mulheres que mais se distinguem, com Agatha Christie e Dorothy Sayers que nos apresenta Lord Peter Wimsey.
Edgar Wallace cria o pequenito e perspicaz Mr. Reeder; Margery Alling oferece-nos Albert Campion; Ellery Queen um detective “caixa de óculos” com o mesmo nome; Dashiell Hammett um modelo de detective particular à sua semelhança, Sam Spade; o americano John Dickson Carr – também Carter Dickson -, especialista de enigmas tipo “quarto fechado” que trata como ninguém, traz-nos o Dr. Gideon Fell; Simenon assume a sua revolta contra os detectives por conta própria e faz nascer o Inspector Maigret, mais tarde Comissário; Rex Stout avança com o oposto de Maigret, um tipo gordíssimo que nunca sai de casa, Nero Wolfe, que conta para tudo com o seu braço direito Archie Goodwin; na América, Erle Stanley Garner cria Perry Mason, um advogado de sucesso.
Os anos 30 são atravessados por todos estes heróis e autores, com altos e baixos. Finalmente pode dizer-se que o romance policial é já tão americano como europeu.
Nos anos 40 assiste-se ao aparecimento de antologias, uma inglesa, a “Line Up” e uma americana, a primeira coordenada por Ellery Queen, que reune, de uma só vez, Hammett, Chandler e Ellery.
Estes terão sido os anos de ouro do romance policial, tal o número e qualidade de autores e personagens, que verdadeiramente desenvolveram a sua actividade ao longo de décadas, renovando sempre as suas propostas e actualizando processos. Tal longevidade, ao invés de criar saturação, produziu um efeito contrário, seduzindo legiões de novos leitores. O velho romance sem sentido, aventureiro e sensacional, era agora respeitado. Cada vez mais catedráticos e homens de letras faziam incursões no mundo do romance policial.
Os novos rumos conduzem-nos a uma indefinição sobre o que poderá vir a ser o Romance Policial do futuro.
O processo criativo que aconteceu nos anos de ouro, ainda não deixou de estender os seus tentáculos e ninguém hoje consegue ignorar Sherlock, Poirot, Ellery ou Maigret, que continuam omnipresentes e apresentados como modelo, apesar das vetustas idades.  Novos modelos de violência protagonizados por Mike Hammer de Mickey Spilane ou Lew Archer de Ross Macdonald, ao bom estilo de “olho por olho...” não parecem trilhar o caminho do futuro.
Resta-nos como verdadeiro bálsamo para o espírito, a magnífica obra policial global de Manuel Vásquez Montalbán, escritor catalão multifacetado que é já um modelo da nova Literatura Policial.

Por cá, o Policial segue as tendências, a alguma distância, claro. Colecções como a Vampiro, Xis, Romano Torres e outras, traziam tudo o que de melhor se publicava no mundo, criando em muitos leitores o desejo de escreverem os seus romances. O policial português é rico naquilo que se conhece, já que muitos autores foram obrigados a optar por pseudónimos para poderem publicar as suas obras. Alguns são hoje conhecidos, outros, possivelmente nunca o serão. Um exemplo bem flagrante é o de Mário Domingues, historiador, jornalista, editor e tradutor, que usou qualquer coisa como cerca de 150 pseudónimos, a maioria dos quais desconhecidos hoje em dia, o que o transformou no português que mais romances escreveu e editou!
Aquele que é considerado o pai do romance policial português é Francisco Leite Barros, nascido em Lisboa no ano de 1841 e falecido em 1886. A coincidência de ter nascido no mesmo ano em que Pöe publicava a primeira novela policial, parece ter influenciado este autor, que escreveu “O Incendiário da Patriarcal”, “O Crime de Mata Lobos”, “O Crime do Corregedor” e “As Aventuras do Homem Pardo”.
Nome fundamental do policial português é o de António Andrade Albuquerque, que assina as suas obras com o pseudónimo de Dick Haskins e que é o autor português mais editado no estrangeiro, com obras traduzidas em dezenas de países e passadas para o cinema.
Também Reinaldo Ferreira merece destaque com os pseudónimos Repórter X e Repórter Kiá. Com uma obra extensa, deixou marcas no policial português, nas décadas de 20 e 30, até ao seu falecimento em 1935.
Roussado Pinto é outro autor importante, não só pela extensa lista de cerca de 75 pseudónimos que usou até à sua morte, mas também pelo modo como organizou antologias policiais de boa qualidade. Ross Pynn é o seu pseudónimo mais conhecido.
                                                                                                                     (CONTINUA) 

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

JARTURICE OU... JARTURADA - IX




No silêncio da noite…
   Publicado na secção POLICIÁRIO em: 8.Novembro.1992

A página do PÚBLICO – Policiário, nesta data, há VINTE ANOS, inseria na primeira parte do seu miolo, a solução do problema mencionado na epígrafe.
Seguiam-se-lhe as classificações, que só revelarei de tempos a tempos, (como fiz na semana transacta), quando o achar oportuno para recordatório de presenças, ou para melhor aproveitamento de espaços.
Como creio já ter ficado bem patente ao longo da ainda curta vida destes «Ficheiros Indiscrectos», a principal finalidade da sua existência, é preservar, para a História da Problemística Policiária Portuguesa, em especial e principalmente, os problemas e respectivas soluções, produzidos e publicados nas secções da especialidade. E cá vamos, paulatinamente, avançando com a nossa deliciosa missão.
À direita, a toda a altura da página, alinhava-se depois uma coluna de notícias que vamos tentar transcrever por inteiro.

NOTÍCIAS
1 – Curiosamente, ou talvez não tanto, parece que não terá ainda sido entendida a finalidade desta secção e as vertentes em que ela se pode e se deve espraiar. Na “raça” e no entusiasmo de toda uma série de pessoas para quem o policiário era palavra desconhecida, somos hoje levados a apoiar-nos, com inovação, coisas frescas, iniciativas capazes de colocar as pessoas num “outro mundo”, até aqui desconhecido. São essas pessoas a razão principal da nossa existência e a resposta tem sido magnífica.
O que não compreendemos é que pessoas com responsabilidades continuem a agitar espantalhos, talvez temerosas de perder alguma da sua influência ou papel de arautos que durante alguns anos desempenharam, de gestores de crises permanentes e incapazes de as vencer. Só assim se pode entender o mutismo perante esta “lufada de ar fresco”, que quase todos entenderam, havendo até quem já fale de um “novo ciclo” no policiário.
As ideias novas encontram sempre oposição e não estamos minimamente preocupados com essas atitudes de “velhos do Restelo”. Aparecemos para unir os policiaristas existentes às “novas vagas”, apresentámo-nos de modo diferente, arejado, novo, lançámos desafios já amplamente ganhos, abrimos as páginas a quem pretendeu transmitir algo. Em suma, preenchemos o nosso espaço e não estamos nada interessados em invadir os dos outros, porque pouco nos dizem, são passado, mas por favor, se o que querem é demarcar um “feudo”, com arame farpado à volta, não contem connosco! Temos um rumo e boas ideias e não pretendemos “azedar”, porque nem tudo é como o vinho do Porto.
2 – Venha mesmo tomar uma bica connosco ou, se assim quiser, almoce também, para o que deve aparecer por volta do meio-dia e meia hora, todas as quartas-feiras, no Restaurante Internacional, ali mesmo ao lado da Estação do Rocio, da CP. Contorne a estação e, ao chegar ao parque de estacionamento, olhe para sul. Logo verá um letreiro enorme a anunciar o restaurante.
… O “SETE DE ESPADAS” e eu temos todo o prazer em lhe oferecer a sua bica.
… Já tivemos algumas visitas: F. Perlico, um assíduo; Mac Júnior, que veio do Minho em trabalho e não deixou de aparecer; e a PAL, que veio dizer presente!       
                                   LP
NOTA: Encerro este ficheiro, com uma nota de «Homenagem à Memória» do “SETE DE ESPADAS” e da “PAL”, reunidos, com outros que os antecederam,  na “Tertúlia Celeste dos Sherlocks Portugueses”.               Jartur

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

FOI HÁ 53 ANOS...




ESCREVE: JARTUR
                    

Prezados confrades e Amigos “Sherlocks”:

5/11/1959 - 5/11/2012
       
Faz hoje, 53 anos que no “Jornal do Ribatejo, aparecia uma nova secção policial… 

          
A respeito desta secção, já vos enviámos uma nota de EFEMÉRIDE nesta data, em 2007, mas então não dispunha-mos, ainda, do arquivamento sistemático das “páginas” da secção, quase na totalidade oferecidas pelo nosso grande amigo «MÁRVEL».
Essas, com as de que eu já dispunhamos, e com as fotocópias que ultimamente nos foram cedidas pelo nosso Amigo “Barata Diniz”, permitiram-nos “investigar” o percurso total da secção, que dentro de alguns dias – não mais de 15 -  já poderemos enviar aos inscritos na Associação do
Podemos adiantar-vos, entretanto, que a secção a partir do n.º 19 estreou um novo cabeçalho
Aqui fica a lembrança, com uns gigantescos parabéns para o B.D.:  (BARATA DINIZ, que também foi: BARATA DINIS, “Big Ben”, MBD, é o terrível “FIGALEIRA”, e será sempre UM GRANDE “Sherlock” e Amigo).
                      
     Com as melhores saudações do 
                                         JARTUR

2012 – ANO “HORRIBILIS” PARA O POLICIÁRIO

Mas, infelizmente, não apenas para o Policiário!

Depois de inúmeras pequenas confusões e indecisões, que passaram por processos de difícil “digestão”, a que o Policiário foi conseguindo resistir da forma mais airosa possível, mercê de algumas cedências, mas consolidando uma determinada posição, a aproximação do final do ano trouxe novos desenvolvimentos, que conduziram à situação que todos conhecemos.

O PÚBLICO entrou em reestruturação, muitos jornalistas e colaboradores acabaram por ser despedidos e dispensados, respectivamente e as vagas alterosas que já se adivinhavam, acabaram por varrer de forma inapelável a estrutura do jornal, tal como o conhecemos desde sempre.



O Policiário havia já sido alvo de um processo de negociação para a sua continuidade e como tal, em princípio, não será agora atingido pelas novas “vagas” de reestruturação, entenda-se, diminuição de despesa, dispensa de colaborações e despedimentos.

No entanto, as questões que já se colocavam, mantém-se sem resposta: Há prémios por entregar há dois anos; os prémios para as actuais competições nem sequer foram ainda divulgados (nem valerá a pena fazê-lo, se no fim cairão em cima dos outros que faltam!); como planear ou desenvolver uma actividade consistente se não há perspectivas para o futuro?; como ter uma secção minimamente activa e saudável se as indefinições são diárias e as perdas de energia constantes, em lutas contra “moinhos de vento”?



O PÚBLICO vai entrar numa nova fase.

A nossa secção, assim o desejamos face ao que têm sido os últimos tempos, também!



O ano de 2012 acabou por ser um ano perdido. Por mais que queiramos reafirmar que vamos chegar ao fim, que vamos publicar classificações que nunca mais chegam, que queiramos assobiar para o ar e dizer que vamos bem, obrigado.

Não é verdade.

Por motivos pessoais e familiares, juntámos a nossa grande quota-parte de responsabilidades aos motivos exógenos ao policiário, que já referimos. Tudo somado, deu naquilo que todos podemos verificar: atrasos nos prazos, ausência de comunicação com os confrades e leitores, desmotivação e perda de “gás”…

Valerá a pena continuar desta forma?

A resposta é simples e directa: NÃO!



A secção Policiário vai, pois, encerrar, nos moldes em que a conhecemos, por falência do modelo. Pelo andar da carruagem, não iremos ter mais prémios para atribuir, certamente; não iremos poder contar permanentemente com a indulgência dos nossos confrades e “detectives”, perante os sucessivos incumprimentos; não poderemos continuar a prometer uma competição a que não conseguimos dar o cunho que pretendemos, de constante movimento, de rapidez e de eficiência.

Então, resta-nos o quê?



É o que iremos saber nos próximos tempos.

domingo, 4 de novembro de 2012

AVISO

...E O FUTURO?

Os confrades foram hoje surpreendidos (ou nem tanto!) com a ausência de publicação do problema n.º 10 das nossas competições desta época.
Pois bem, os recentes acontecimentos vieram clarificar algumas situações e exigir uma mais aprofundada análise das nossas opções.
Após um ano de grande instabilidade e confusão, decidimos tirar um tempo para nos questionarmos sobre o que temos andado a fazer e sobre o merecimento de continuarmos a trilhar caminhos com muitos sinais de inutilidade.

Portanto, caros confrades e Amigos, a secção que hoje foi publicada é mais uma "fora da mãe", mas desta feita, deliberadamente.

Amanhã mesmo, contamos estar aqui a dar-vos conta de algumas conclusões a que chegámos após este "mini-retiro".

O Policiário terá (mesmo) algum futuro, seguindo esta via?

Amanhã estará aqui a nossa opinião e contamos com as vossas, para que não andemos por aqui a iludir e a iludir-nos!

Até amanhã!

POLICIÁRIO 1109



A história da Literatura Policial é um livro aberto, onde sempre podem ser acrescentados capítulos novos, tal é a amplitude do conceito “policial” e a enorme expansão territorial que alcançou.
Não há, seguramente, um só recanto do mundo onde não tenha havido, ou haja ainda, um descritor de crimes reais ou produtor de enigmas ficcionados, sobre a temática.
O que faz do romance policial um dos mais lidos em todos os locais onde há pessoas, é o que procuraremos desenvolver, tentando apontar para os escritores e obras que sempre acrescentam algo em relação aos antecessores.
O romance policial é, ainda hoje, o género literário mais lido e isso tem que ver, seguramente, com as suas características intelectualmente desafiantes, que nem a tecnologia de ponta supostamente infalível, veiculada pelo CSI, consegue subalternizar.
Uma boa investigação “artesanal”, bem “sherlockiana”, estará sempre, para os cultores e amantes do policial, uns bons furos acima de qualquer aparato electrónico, por mais sofisticado que nos seja exibido.

Deixem-nos, por favor, o prazer de nos deleitarmos com os heróis que os escritores nos apresentam como sendo de carne e osso e quase infalíveis. Deixem-nos o espaço para procurarmos as suas vulnerabilidades, os seus erros, as suas incorrecções lógicas, já que com as máquinas não o podemos fazer!
Que diabo, tanta perfeição, também cansa!
Que viva o (sempre) romance policial! 
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                          
LITERATURA POLICIAL

 Mário Soares, Jorge Sampaio, o que podem ter em comum para além das coisas públicas que todos lhes conhecemos?
Pois bem, ambos se confessaram e assumiram como leitores atentos de livros policiais!
Com um pouco de ginástica mental, podemos imaginar Mário Soares como admirador de um Maigret desengonçado e pesadão, ou Jorge Sampaio a seguir, deliciado, um caso do mais “cabeça de ovo” da História do Policial, o sempre actuante Poirot!
O que faz dos romances policiais uma das leituras mais apreciadas em todo o Mundo e em todas as épocas? Que sortilégio terá? Será apenas a sua vertente desafiante da inteligência, ou, mais que isso, um misto de Aventura e Mistério, com uma porção de raciocínio, q.b. ?

Digamos em abono da verdade que nada no Policial foi – ou é – pacífico. A começar pela paternidade, em que se degladiam diversas correntes de opinião, que nos remetem para a Bíblia ou para escritos chineses ou, mais modernamente, para Voltaire ou Dostoievsky. Mais aceite é, no entanto, Edgar Alan Pöe, como o pai do romance policial com características dedutivas, em 1841, com a publicação de “Os Crimes da Rua da Morgue” no “Graham’s Magazine”.
Seja como for, o Policial acaba por carregar um fardo como “casa mal frequentada”, porque nasce de um alcoólico Pöe, prolonga-se e atinge um grau de popularidade inimaginável com um Sherlock Holmes consumidor de cocaína; se implanta e desenvolve em Portugal, tendo como cultores um Fernando Pessoa com problemas alcoolicos ou um Reinaldo Ferreira (Repórter X) morfinómano...

De literatura de cordel, que foi considerada durante longo tempo, até às declarações de um Prémio Nobel da Literatura, José Saramago, de que pretendia escrever um romance policial, o caminho foi longo e difícil, cá como no resto do mundo.
A uma literatura incipiente, sensacionalista, um tanto aventureira, seguiu-se um período de grande esplendor, usando quase sempre a fórmula de duplas que se tornaram famosas: Monsieur Dupin e o seu “amigo desconhecido”, de Alan Pöe; Sherlock Holmes e Dr. Watson, de Arthur Conan Doyle; Hercule Poirot e Capitão Hastings, de Agatha Christie…
Outros, muitos outros detectives famosos seguiram o trilho – para não dizermos que imitaram – Dupin e Pöe. Destacamos Ellery Queen, produto de dois primos, Frederick Danny e Manfred Lee; Philo Vance de S. S. Van Dine; Philip Marlowe de Raymond Chandler; Sam Spade de Dashiell Hammett; Hercule Poirot ou Miss Marple de Agatha Christie.

Numa tentativa de sistematização, poderíamos dizer que as três grandes “escolas” policiais trataram os seus mais emblemáticos escritores de forma bastante profissional, apoiada num “marketing” eficiente. A “escola” britânica reune-se em torno de Sherlock e mais tarde de Poirot e Miss Marple; a “escola” franco-belga cerra fileiras em redor de Maigret, inspector e mais tarde Comissário criado por Georges Simenon; a “escola” americana arrisca em Chandler, mais tarde em Ellery Queen e finalmente em Patricia Higsmith que acaba “arrasando” a concorrência com as histórias de Mr. Ripley.
Pelo meio, lutando contra cada um destes centralismos, uma imensidão de autores e detectives procuram o seu espaço, em muitos casos bem merecido.
Sherlock Holmes faz com que em França surja Arsène Lupin, uma criação de Maurice Leblanc, um ladrão muito fino, que depois vai servir de modelo a Simon Templar (Santo), de Leslie Charteris. Pelo meio, Émile Gaboriau faz nascer o Monsieu Lecoq, também em França. Mais tarde, já em 1911, aparece um padre com grandes capacidades dedutivas, Father Brown, uma criação de Gilbert Keith Chesterton.
Nesse mesmo ano, na América, Melville Davisson Post escreve os primeiros contos do Tio Abner, enquanto se vai demonstrando que a “escola” americana não consegue rivalizar minimamente com o que se faz deste lado do Atlântico! E.C. Bentley publica “O Último Caso Trent” e Freeman aparece com “O Osso”, ao mesmo tempo que Earl Derr Biggers faz nascer Charlie Chan, um chinês apaixonado por Confúcio, que o cita a toda a hora. Mas em Inglaterra os consagrados dão cartas, bem secundados por Max Carrados, de Ernest Bramah.
(Continua)