TORNEIO A. RAPOSO e TROFÉU CLUBE DE DETECTIVES:
O estado de saúde do nosso homenageado (hoje, já em recuperação), levou-o a pedir à Detective Jeremias que o substituísse como produtor, neste Torneio em que é homenageado. Isto permite-nos apresentar a estreia, na Produção, desta nova Detective, que, rapidamente, se alcandorou aos degraus mais altos do nosso solucionismo. Este seu primeiro problema promete altos voos...
Problema nº 2 – São Jerónimo nos valha, original de Detective Jeremias:
Tive conhecimento da existência do Detective Tempicos no final de 2003. Num jornal diário, Tempicos fazia o relato de um crime: o homicídio de Magalhães, não do navegador português, nem do famoso portátil, mas de um capitão reformado do exército. Nos anos seguintes, de forma incerta, eu ia ouvindo aqui e ali histórias sempre curiosas, algumas ilícitas, sobre este ex-detective da Judiciária.
A minha opinião sobre o Tempicos é pouco objectiva e tem oscilado entre a admiração e a desconfiança, ou entre um certo respeito e igual dose de desprezo. Confesso que foi este sentimento ambíguo e uma grande curiosidade que me levaram a aceitar sem hesitações o convite para um encontro de amigos. Parece que o Tempicos, após ter estado adoentado, decidiu recuperar energias num local tranquilo na serra de Monfirre. Possivelmente sentiu-se demasiado isolado e resolveu juntar um grupo pequeno num “lanchinho de fim de tarde”, de acordo com a informação que me chegou.
Partimos de Lisboa distribuídos em três carros a bem da economia de esforço e da pegada ecológica. O local do encontro devia estar no segredo dos deuses, pelo menos a julgar pelo silêncio profundo que se seguiu às minhas tentativas de obter resposta à pergunta: “Afinal, para onde é que nós vamos?”. Ainda consegui identificar o caminho até metade do percurso, mas depois desisti.
Não sei se foi por causa do calor intenso que entrava pelas janelas abertas. Não sei se foi a sucessão monótona de povoações em tudo idênticas, com os mesmo enfeites desbotados a engalanar a rua principal e com um ar desolador de fim de festa, apesar de o S. Pedro ter sido há poucos dias. Ou talvez fosse o mutismo dos meus companheiros de viagem (preocupados com a convalescença do amigo?) e o embalo do som ronronante do motor. Não sei. O que é certo é que dei comigo a imaginar como seria o Tempicos. Será que o iríamos encontrar estendido numa espreguiçadeira à sombra da árvore mais frondosa do jardim a bebericar, por uma palhinha colorida, um sumo fresco num copo alto? Ou estaria sentado, muito hirto, numa cadeira de espaldar alto, com olhar perdido e sofredor a fumar cachimbo? Ou estaria mergulhado na obscuridade da biblioteca, entre livros, papéis e medicamentos, com o baú das memórias aos pés e uma mantinha fina de lã a proteger os ossos do ar fresco da serra.
Eu podia ter imaginado mil e um cenários, mas era impossível adivinhar a realidade com que nos depararíamos à chegada. No meio da serra, bem no alto, estava uma casa recuperada a partir de um moinho antigo. No espaço envolvente, debaixo de uma latada, uma mesa feita de tábuas apoiadas em cavaletes oferecia-nos jarros de barro com sangria, pão caseiro, queijos, enchidos e leitão. No centro desta paisagem, o Tempicos de avental até aos tornozelos, pano atado à cintura e tenaz em riste, afadigava-se de volta do grelhador e do entrecosto. A doença tinha-se evaporado e do período de convalescença nem sinais, o que nos deixou a todos tranquilos, mas desconfiados. Tempicos recebeu-nos com um “Entrem, entrem, fiquem à vontade. A festa é para todos”. E enquanto lançava uma piscadela de olho cúmplice acrescentou: “Os santos populares já acabaram, mas hoje é dia de São Jerónimo e vamos todos celebrar!”. Eu, a única aprendiza do grupo, quase tive direito a beija-mão: “Muito gosto em, finalmente, conhecê-la” o que me deixou uma leve impressão de estar a ser gozada. Depois ordenou em tom galhofeiro: “Enquanto o entrecosto vai grelhando, podem atacar o leitão. Acabei mesmo agora de o ir buscar aqui ao lado, à Mealhada”.
O convívio foi um sucesso e decorreu num ambiente de muito boa disposição. Todos tinham um episódio do passado para contar. A conversa e os petiscos prolongaram-se pela noite dentro. Tempicos lançou-se na última história do encontro:
− Meus amigos, todos aqui sabem que eu nem sempre entrei em negócios limpos. Hoje estou disposto a revelar o meu melhor golpe de sempre. Julgo que nunca foi descoberto e nem vos sei dizer se estou arrependido ou se me sinto orgulhoso. A minha memória já não é o que era e ainda não consegui encontrar o caderno onde tenho este registo, por isso não me lembro ao certo da data em que se passaram estes factos. Mas isso nem é importante para perceberem o que aconteceu. Foi no século passado, quando a vigilância nos museus era quase inexistente, sei que eu já estava na Judite, supostamente do lado da lei, mas as minhas duas paixões – os museus e as mulheres – levaram-me a entrar neste esquema. O museu era do das Janelas Verdes e a mulher era uma obra-prima. Conhecia-a numa tasca do Bairro Alto, disse-me que era austríaca e estudante de arte, mas desconfio que fosse ladra profissional, pelo menos a julgar pela rapidez com que roubou o meu coração. Neste primeiro encontro propôs-me logo um negócio irrecusável. Teria a oportunidade de receber uma importância exorbitante, milhares de contos, em troca da minha colaboração no roubo de uma das obras mais importantes do museu: o São Jerónimo de Dürer. Em menos de um fósforo fiquei a conhecer tudo sobre o mais talentoso pintor alemão do Renascimento, ao mesmo tempo que me punha a par dos detalhes da operação. O amor da minha vida tinha com ela uma reprodução exacta e perfeita da obra que iríamos roubar.
Saída do nada, como por artes mágicas, mostrou-me uma pasta adequada ao transporte de obras de arte com uma pintura dentro, devidamente acondicionada. Representava um velho de barbas brancas, de veste vermelha e boina em tons de verde, que apontava acusadoramente uma caveira à sua esquerda. Dürer inspirara-se nas cores verde e rubra da bandeira de Portugal, país que mantinha relações comerciais com a feitoria de Antuérpia, e, de acordo com os peritos de arte, produzira uma obra de “vibrante cromatografia”.
A loira dos meus sonhos explicou-me ainda que a fiel reprodução era de sua própria autoria, feita pacientemente a partir de fotografias e reproduções do original e do estudo de Dürer pertencente à famosa galeria Albertina em Viena a que ela facilmente tivera acesso por ser estudante de arte.
Estava tudo planeado ao milímetro, o receptador da obra era um multimilionário grego e adiantara já metade do pagamento. A estratégia e o material a utilizar foram definidos com precisão militar. O golpe ficou agendado para o dia seguinte e foi limpinho como um bebé depois do banho, como irão ouvir já de seguida.
Dirigimo-nos à tardinha ao antigo palácio dos Condes de Alvor. Ela com o cabelo solto, a descer em ondas pelas costas e eu coxo, a descer e subir degraus, apoiado numa canadiana, o acessório indispensável ao crime. Ainda tentei uma piada, que ela não percebeu por se perder na tradução para o inglês: “Olha aqui o Tempicos com uma austríaca e uma canadiana. Bom, lá entrámos os dois num museu às moscas, sem criancinhas em visitas de estudo nem turistas formigados à volta dos painéis de S. Vicente. Os seguranças sonolentos com a digestão do almoço não nos ligaram nenhuma. Estava criado o ambiente para o roubo perfeito. A minha sereia vienense tratou de substituir o Jerónimo original pelo falso, que eu transportara enrolado, bem dissimulado, dentro da minha canadiana. Tudo feito com gestos de seda e com ferramentas profissionais minúsculas, que cabiam num estojo de unhas, e cuja existência eu desconhecia por completo. Meus amigos, é claro que a pintura original deslizou para o interior da canadiana e saiu do museu nas barbas dos vigilantes e debaixo do seu olhar condoído pelo meu coxear vacilante. Lembro-me agora que até nos demos ao luxo de passar o resto do dia no largo defronte à entrada original do museu onde, inspirados pelo conjunto escultórico do chafariz, só nos faltou dançar o Danúbio Azul, quase esquecidos da fortuna que a canadiana encerrava.
Só vos digo, um roubo que durou alguns minutos, um amor intenso de dois ou três dias e capital suficiente para comprar e renovar este paraíso onde agora vos recebo. Se o roubo foi detectado ou o quadro recuperado, isso nunca chegou aos corredores da polícia, nem às páginas dos jornais.
À estudante austríaca ou gatuna vianense, com quem troquei juras de amor eterno, nunca mais lhe pus a vista em cima, mas só lhe devo cantar louvores pelos momentos bem passados e por ter cumprido na íntegra a entrega da verba combinada. O São Jerónimo? Pois bem, fui visitá-lo o mês passado, na sala 61, do piso 1 do museu. È uma das obras de referência do museu. Se é o verdadeiro ou a cópia … isso não vos sei dizer…
O Tempicos ficou-se por aqui. Da plateia, que o escutava atentamente, ninguém se atreveu a abrir a boca. E depois de um silêncio só perturbado pelos grilos, fizemos um brinde final ao São Jerónimo, padroeiro dos detectives segundo o nosso anfitrião. Seguiram-se a despedidas envolvidas em promessas de um novo encontro.
No regresso a Lisboa, ficou-me a roer no ouvido comentário do A. Raposo para a Lena sentada ao seu lado no banco: “Este Tempicos saiu-nos cá um pantomineiro! Começou quando chegámos e só acabou na despedida”.
Caros confrades: merecerá o nosso querido Tempicos a fama de "pantomineiro"? Justifique, por favor...
Respostas até ao dia 05/10/09, para o Apartado 593 2000 Santarém ou d.cabral@sapo.pt e gustavobarosa@hotmail.com
8 comentários:
Caros confrades
A Detective Jeremias estreou-se como produtora e pode-se dizer que se estreou com o pé direito, ou teria sido com a mão, pois que na minha opinião é um bom problema digno da nossa presença como solucionistas.
Portanto rapaziada toca a preparar as vossas preciosas soluções já que sem estas não se justificam torneios.
A rapaziada nova que nunca se atreveu a mandar uma solução façam-no agora, se não aceertarem não se preocupem, São raros os que acertam à primeira
Um abraço do
Rip Kirby
Oi pessoal
Já temos o segundo problema do torneio "A Raposo" para solucionar pelo que convèm iniciar desde já as buscas mas...
...Mas se ainda não respondeu ao problema N.°1 talvez os orientadores da secção não se importem de receber umas soluções atrasadas.
Por outro lado o primeiro problema foi da minha autoria e caso as vossas soluções não apareçam vou tomar isso como uma ofensa à minha pessoa não contando já com a desconsideração que isso representa para o homenageado, sempre pronto a colaborar com os outros, e com os orientadores da secção que se vão sentir desmotivados pelo vosso desinteresse.
Eu tenho experiência nesse campo pois, há anos, fui um dos orientadores de uma secção no Jornal do Montijo que não vingou, entre outros motivos, precisamente pelo desinteresse dos leitores desse jornal.
Por tudo isto meus amigos, sejam isso mesmmo, amigos, e deem motivos para que os três Zés se sintam recompensados pelo esforço que fazem.
Obrigado a todos e um abraço do
Rip Kirby
É lastimável não haver ninguém que tenha um comentário para acrescentar mesmo depois de eu tentar atiçar a inspiração de cada um ou de todos.
Depois o Luis não gosta que a gente se insurja com aqueles que aparecem por aqui a cuspir para o ar e ficam esperando que o cuspo lhes caia em cima.
É verdade que ninguem é obrigado a postar comentários, mas então, postem-nos quando têm algo de útil para dizer ou a acrescentar. Para isso é que este blog existe.
O Luis que me desculpe mas por vezes é preciso atiçar o pessoal
Rip Kirby
O Rip Kirky que me desculpe, mas nem todos têm a sua vida. Pelo que tenho lido está reformado e a viver no Brasil. Por cá saimos de casa às 6 para entrarmos ao trabalho às 8 horas e saimos às 20 para chegar a casa às 22. Já é um martírio para responder ao Publico, Eu acho muito bem que pique o pessoal, mas nem todos se podem deixar picar
Miss Alda
É verdade
Estou reformado e a viver no Brasil, mas apenas estou reformado desde 1992 e em 1975 ou 76 já andava cá nestas lides. Nesse tempo tinha dois filhos com 10 e 8 anos e o ordenado não era grande por isso tinha que trabalhar.
em 68 a empresa em que trabalhava fazia manutenção na firestone. Saía de casa às 7horas e esse era o único horário que tinha certo porque de resto nunca sabia a que horas iria voltar. Na melhor das hipóteses iria chegar a casa cerca das 21, mas isso era muito raro. O mais frequente era chegar já depois das 2h da madrugada semanas a fio e não nos podiamos recusar porque eramos logo ameaçados de nos mandarem para a oficina e a gente precisava daquelas horas para reforçar o nosso parco orçamento.
Depois do 25 de Abril fui trabalhar para outra empresa que fazia manutenção na Hoest Portuguesa. Neste caso para não andar a correr atrás dos transportes eu saia de casa cerca das 4,5 para apanhar um autocaro para a estação fluvial para apanhar o primeiro barco para Lisboa. Se apanhasse o barco seguinte teria que andar a corer do autocarro para o barco , do barco para o autocarro e daqui para o combóio e só em Mem Martins teria uma folga até apanhar o autocarro para a fábrica. Claro que no regresso era mais descansado porque não tinha horários a cumprir.
Mas voltando atrás hove uma altura em que o trabalho na Firestone terminou e fiquei com mais tempo que dediquei à actividade directiva numa colectividade de Desporto, Cultura e Recreio que me ocupava muito tempo. entretanto aconteceu o 25 de Abril. Resolvi ir estudar e iniciei-me no policiarismo. Mais tarde envolvi-me em actividades políticas. Em todas estas actividades sempre fui muito activo mas nunca me queixei de falta de tempo para fazer aquilo de que gostava. Brincar com os meus filhos, ler e finalmente participar assiduamente nos torneios policiaristas.
Por isso prezada Miss Becas já vê que antes de ser reformado eu trabalhei no duro, distribui a minha actividade em favor da colectividade e ainda tinha tempo para o lazer e para a família.
Quando a gente gosta de algo sempre tem tempo para dispensar a esse algo.
Esta arenga não é porque eu me tivesse sentido ofendido. Eu sei que nem todas as pessoas são capazes de se desfazerem do seu tempo de descanso em prol de qualquer outra coisa nem que seja apenas uma brincadeira como é o policiarismo.
A minha intenção é só para lhhe lembrar que para ser reformado antes eu tive que trabalhar como você e muitos outros.
Quanto à necessidade de picar o pessoal a carapuça só serve a quem a mete.
Um abraço do
Rip Kirby
Apenas uma rectificação.
Não é Miss Becas mas sim Miss Alda.
E mais uma achega. Para mim não é nem nunca foi um martírio responder aos problemas do Público nem de qualquer outra secção.
Respondendo a esses problemas eu tenho aprendido muito e espero aprender ainda muito mais
Rip Kirby
Meu caro amigo Rip Kirby, eu este ano não concorro, não quero que seja considerado ofensa nem aos produtores, nem aos orientadores, pois não é essa a minha intenção.
Simplesmente há alturas, que precisamos de parar, eu este ano senti essa necessidade, por vezes somos confrontadas com situações, que a uns dá mais força para continuar, refugiam-se no policiário, no meu caso não me dá capacidade de raciocinio. Terei que ser recriminada por isso?
Penso que não, até porque tenho a maior das considerações, quer pelos Zés, quer pelo nosso amigo A.Raposo.
Este ano, vou descansar, para o ano se Deus quiser, voltarei e com mais força que antes, mas preciso mesmo desta paragem.
Um beijo para todos
Estimada Miss Alda
Antes de ser reformado e, para o ser, trabalhei muito. Quando tinha horários como esses que você refere, para mim, isso era recreio. Levei anos a trabalhar 13 horas por dia quase todos os dias e frequentemente a fazer 24 ou 36 seguidas só com os intervalos para as refeições.
Apesar disso nunca considereii um martírio responder aos problemas do Público ou de qualquer outra secçao. Para mim isso é um prazer e uma fonte de aprendizagem.
Quanto a picar o pessoal não pretendi ofender ningué, mas o barrete só serve a quem o enfia.
Rip Kirby
Enviar um comentário