[Transcrição da secção n.º 1218 publicada
hoje no jornal PÚBLICO]
FIM
DE ÉPOCA COM M. CONSTANTINO
Chegámos ao final das nossas
competições do ano de 2014, pelo menos no que diz respeito ao trabalho dos
nossos “detectives”, para quem terminou no passado dia 5 o prazo para envio das
propostas de solução aos desafios da prova n.º 10, de autoria do nosso “Mestre”
da produção policiária, confrade M. Constantino.
Cabe aqui uma nota muito especial
para o trabalho excelente que M. Constantino vem desenvolvendo ao longo de
muitas décadas, em prol do Policiário, principalmente, se nos é permitido o
destaque, como seu estudioso, sendo autor de muitos ensaios sobre a Literatura
Policial e a nossa actividade e um divulgador importante de uma das nossas
facetas menos utilizadas, mais concretamente a técnica de investigação, que usa
amiúde nos seus problemas.
Possuidor de vastos conhecimentos
na área da técnica de investigação criminal e Polícia Científica, M.
Constantino vai passando alguns conhecimentos, sobre armas, sobre venenos,
etc., tornando os problemas bem mais verosímeis e próximos da realidade
criminal que pretende transmitir.
O que dizer de M. Constantino,
que possa ainda não ter sido dito? Na verdade, trata-se “só” do melhor produtor
nacional de problemas policiários, com uma carreira longa e recheada de êxitos,
com enigmas que são hoje verdadeiros hinos à arte de bem desenvolver uma
investigação, com muita dedução e muito apelo à capacidade de interpretação e
análise.
De uma das suas muitas obras,
precisamente o “Manual da Enigmística Policiária”, numa edição da Associação
Policiária Portuguesa, de 1995, deixamos um dos seus textos mais
significativos, sobre aquilo que ele entende ser a relação entre o homem e o
apelo pela resolução do enigma:
«O homem encontra no enigmático
algo que lhe excita o espírito e lhe motiva a curiosidade.
Posto perante um mistério, todas
as faculdades se lhe alertam e, atentas, se debruçam em torno do problema.
Sente prazer íntimo em seguir
passo a passo todas as pistas até alcançar o objectivo.
Satisfaz-se ao conseguir rodear
as dificuldades, tanto como vencer obstáculos que se apresentam
intransponíveis.
E quanto mais a precisão dos
factos não se permite que se vislumbre sombra de uma estrada, maior é o apego e
o desenvolvimento do cérebro, maior é a satisfação da vitória.
Segundo Bergson, um problema que
inspira atenção é uma representação duplicada de uma emoção, sendo ao mesmo
tempo a curiosidade, o desejo e a alegria antecipada de o resolver. É o desafio
posto que impele a inteligência diante das interrogações, vivifica, ou antes
vitaliza os elementos intelectuais com os quais fará corpo até à solução.
A própria vida cifra-se em
constante mistério, um enigma constante que a humanidade procura solucionar o
melhor e mais rapidamente possível. O obscuro nunca nos desampara, desafia-nos.
De prazer espiritual que se sente
em desvendar incógnitas, desvanecimento de sobressair, simples divertimento,
tudo conduz a que os homens do povo na sua singeleza através de simples
adivinhas que andam de boca em boca, os letrados com bem urdidos trabalhos, os
sábios na esfera da humanidade, acorram ao seu cultivo e decifração.»
Para o confrade M. Constantino,
fica o nosso agradecimento pela atenção que dedica a este nosso espaço e pelos
bons momentos que proporciona com os seus desafios.
O POLICIÁRIO EM ÉVORA 2012
(Conclusão)
Em Março de 2012, no dia 29, o
Inspector Fidalgo deslocou-se à Universidade de Évora para proferir uma breve
palestra, a convite do Departamento de Química, a propósito das comemorações do
encerramento do Ano da Química - 2011.
Da sua intervenção,
principalmente dirigida a uma audiência constituída por estudantes
universitários, mas também do secundário, uma vez que foram distribuídos os
prémios do concurso “Desvenda o crime…”, dirigido aos estudantes do secundário,
destaque para algumas considerações, que vamos aqui relembrar, aproveitando
esta pausa, que antecede a publicação dos resultados finais das competições de
2014.
“Permitam-me, apenas, que vos dê
dois exemplos daquilo que é o Policiário.
Vejam esta cena: Um indivíduo
muito rico (nós gostamos muito de vítimas ricas porque ficamos logo com um
motivo para o crime) não tem filhos, sofre de uma doença terrível e resolve
chamar os sobrinhos que são seus herdeiros e diz-lhes: A minha fortuna vai toda
para aquele que acabar com o meu sofrimento. Este papel diz isso mesmo e fica
aqui guardado para que a minha fortuna seja entregue a quem acabar com o meu
sofrimento…
Claro que no dia a seguir o
ricaço já era e foi caricato ver os sobrinhos um a um irem à polícia dizer que
mataram o tio e explicar como o fizeram. No texto davam-se os elementos que
permitiam concluir que um deles era o responsável e no fim perguntava-se: Quem
herdou a fortuna?
Nessa pergunta estava toda a
diferença. Não se perguntava quem matou o tio, mas quem herdou. E pela lei
portuguesa, quem atenta contra a vida de alguém, não pode herdar desse alguém!
O que matou e que parecia que ia ficar rico, foi o único que não herdou!
Outro problema tratava de um
crime cometido numa aldeia onde não havia luz nocturna e às tantas, um
personagem vem dizer que assistiu ao crime, quando passou no local,
aproveitando o momento em que o criminoso se voltou e o luar permitiu ver-lhe
as feições e reconhecê-lo.
Todo o texto era perfeito, sem
erros nem pistas de nenhuma espécie. Era claro como a água. No título é que
estava a solução do problema: Na Noite do Eclipse!
Eclipse à noite, apenas da Lua e
para que ocorra, esta tem que estar em fase de Lua Nova. Não há luar!
Estes dois casos são o retrato
daquilo que o Policiário nos pode surpreender a cada passo e que espero vos
possa aguçar a curiosidade para virem “espreitar” o que fazemos e o que nos
atrai tanto.
Muito obrigado pela vossa
atenção. Foi um prazer estar convosco.
Boa Química e boas deduções!”
Sem comentários:
Enviar um comentário