O confrade JARTUR leva-nos até aos anos 40 do século passado e até uma revista, CARTAZ.
Ora tomem a devida nota, com os naturais agradecimentos ao responsável:
Compilação de: “Jartur”
João Artur Mamede
10 de Fevereiro de 1946 / 24 de Fevereiro de 1946
Na Biblioteca Pública Municipal do Porto, procurei encontrar a colecção do jornal ou revista CARTAZ, onde eu sabia que teria uma existido uma secção policial, para o que fora também já alertado, pelos confrades A. RAPOSO e MEDVET.
Consultado o arquivo, encontrei três fichas com o título em questão, mas desde logo fixei a atenção na primeira, e foi essa que requisitei, com a intenção de noutra oportunidade consultar as restantes.
Na sala de leitura, foi-me apresentada uma encadernação já bastante gasta, com a designação de «MISCELÂNEA» e, efectivamente, lá para meio da encadernação que arrecadava mais de uma dezena de títulos, aparecia a publicação – não sei se deva chamar-lhe jornal ou revista:
CARTAZ
DIRECÇÃO DE GENTIL MARQUES
DOCUMENTÁRIO VIVO DO MUNDO
Na capa, além dessas titulares, ainda tinha mais as seguintes indicações específicas:
ANO PRIMEIRO - N.º 1 / 10 DE Fevereiro de 1946
AOS DOMINGOS * UM ESCUDO
E ali se publicava também, numa coluna a toda a altura, à direita da página - sob o ponto de vista do leitor - um índice onde, entre mais de 25 indicações, aparece o seguinte convite:
“É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL?
* * * * *
CARTAZ, em formato de jornal ilustrado, “tablóide”, à feição das publicações da época, inseria notícias e artigos diversos de actualidades, versando humor, literatura de todas os géneros, teatro, cinema, os diferentes ramos de diversas artes, e também anedotas ilustradas, e uma tira de histórias aos quadradinhos, nomeadamente: BARNABÉ «NA ALTA SOCIEDADE», com desenhos de SERVAIS.
As páginas não eram numeradas, mas na 11, de 12, sobre uma fotografia de uma cena, como que extraída dum filme, aparecia o seguinte desafio:
VEJA SE É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL
E, sem qualquer título, publicava-se um problema policial ao estilo dos que os sindicatos americanos distribuíam pela imprensa mundial.
No CARTAZ n.º 2, de 17 de Fevereiro de 1946, não foi publicada a rubrica.
Mas o n.º 3, de 24 de Fevereiro de 1946, já indicava no índice, como único título de «Miscelânea», e remetendo-nos para a página 7, a secção: VEJA SE É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL.
A exemplo do n.º 1, ali vinha uma nova fotografia ilustrando o problema policial, também protagonizado pelo inspector Hannibal Coob.
E completava a rubrica, a solução do problema anterior.
AHPP - CARTAZ - É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL? – 2
O CARTAZ n.º 4, de 5 de Março de 1946, impresso em três folhas de cores diferentes, (motivado talvez pela falta de papel que a “II Guerra Mundial” estaria provocando, mas justificado como para alegrar a época carnavalesca), também não exibia a secção. Aliás, naquela biblioteca apenas existiam os exemplares, do n.º 1 ao n.º 6, e aquela secção policial, apenas foi publicada nos dois números atrás referenciados, o 1 e o 3.
Todavia, as nossas buscas, com o auxílio do nosso amigo Leonardo de Sá, (investigador, autor de vários livros e artigos sobre banda desenhada, cartoon e ilustração), levaram-nos a concluir que aquela série de CARTAZ prosseguiu, extinguindo-se, porém, com a publicação do n.º 23, ocorrida em 16 de Julho de 1946.
Mas, entretanto, o director da revista, Gentil Marques, também conhecido pelo pseudónimo de “Repórter Mistério”, já dera vida a uma outra iniciativa no âmbito do policiário, que vai ser matéria do nosso próximo trabalho.
Vamos então, completar este, transcrevendo, na íntegra, os dois problemas publicados e as respectivas soluções.
PRIMEIRO PROBLEMA CARTAZ n.º 1 – 10.Fevereiro.1946
NOTA:
Como não é autorizada a obtenção de fotocópias, mas apenas o fornecimento da digitalização fotográfica das páginas, que a prática nos diz que não é suficientemente cuidada e nítida, até porque a idade e o manuseamento das revistas já terá alterado a sua nitidez original, dispensamos as imagens, que substituiremos pela sua descrição literária, incidindo, em especial, nos pormenores que possam ter interesse para a decifração dos problemas.
# 1 - Na foto, vê-se, uma parede ao fundo, com um quadro, possivelmente a fotografia de uma mulher, e à sua esquerda, talvez a uns 20 ou 30 centímetros, que também será a largura da moldura, estão, assinaladas a giz, as duas marcas de balas referidas no texto do problema, uma acima da outra, distanciadas apenas alguns centímetros. Na frente dessas marcas, com a cabeça à altura destas, está um homem, de pé, comum revólver na mão esquerda, apontando-o acima da cabeça do inspector.
À direita do quadro, está uma mulher, de pé. A separar esses dois intervenientes, encontra-se uma mesa ou secretária, sobre o tampo da qual está um vaso com uma planta, e um outro objecto que poderá ser um cinzeiro.
À frente desse móvel, deitado no chão, está o corpo da vítima, com um coldre de tiracol, em que a arma se encontra com a coronha na direcção do queixo do cadáver, e o lado do cano pendente no lado direito do peito da vítima. O inspector, está baixado a seu lado, olhando para o homem que se encontra de pé, armado.
E o texto, sem qualquer título, dizia:
Chamado para investigar a morte do «gangaster» Jack Kirk, o inspector Hannibal Cobb examina a ferida mortal no peito do morto e o buraco correspondente no casaco. Retira um revólver da mão direita da vítima, verifica terem sido disparadas duas balas e coloca o revolver no coldre de tiracolo de Kirk.
Dan Foley, um «gangster» rival, explica:
- «Esta tarde Jack entrou num bar onde Madge e eu estávamos a tomar qualquer coisa. Puxou da arma e obrigou Madge a acompanhá-lo. Às 9 e 30 telefona-me a dizer-me que a viesse buscar. Pediu-me desculpa, disse estar embriagado quando forçara Madge a acompanhá-lo e parecia dar-me mostras de amizade. Esquecido do que se passara. Vim até cá. Madge e eu preparávamo-nos
AHPP – CARTAZ - É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL? – 3
para sair quando Jack puxou, outra vez, da arma, e disparou dois tiros, cujas balas me passaram rentes à cabeça. Então, puxei do meu revolver e, em legítima defesa, matei-o. Eu estava aqui neste sítio. Veja na parede, marcados a giz, os dois buracos das balas.
Madge: - «Foi exactamente isso que aconteceu… Juro-lhe!»
Madge e Dan, gritaram simultaneamente admirados: - «Não!»
Porém Cobb esclarece: - «Isto não foi um caso de legítima defesa… mas sim um assassínio a sangue frio!»
O que levou o inspector a esta convicção tão firme?
(Ver a solução no próximo número.)
(Em todo ocaso, se quizer, mande-nos a sua solução até quinta feira.)
Solução do primeiro problema: Publicada em:
CARTAZ n.º 3 – 24.Fevereiro.1946
Depois de tirar o revólver da mão direita de Kirk e de o colocar no coldre de tiracolo do morto, Coob via que o coldre estava colocado ao contrário. Naquela posição, era-lhe impossível empunhar o revólver com rapidez e, em qualquer dos casos, notou que o morto não poderia ter sido tão descuidado ao ponto de pôr o coldre às avessas. Deste modo, Coob deduziu que Kirh fora assassinado quando se encontrava desarmado e que o coldre lhe fora colocado, depois do crime, por alguém, tão assustado que nem sabia o que estava a fazer.
Em face desta descrição, Madge confessou que Foley matara Kirk a sangue frio e que ela pusera o coldre no morto, enquanto Faley disparava dois tiros contra a parede com a arma de Kirk. Faley foi executado na cadeira eléctrica, e Madge condenada a prisão perpétua.
SEGUNDO PROBLEMA CARTAZ n.º 3 – 10.Fevereiro.1946
# 2 - Na foto estão duas mulheres de pé, ao fundo dum aposento. A da direita, em relação ao observador, está junto duma porta entreaberta, através de cuja abertura parece ver-se um outro vulto pouco definido. Entre as duas mulheres, e à esquerda da porta, está uma terceira dama, sentada, parecendo ter um livro sobre as pernas. Junto da primeira mulher, está um homem de pé, segurando uma espingarda, que cruza a coronha na frente dessa mulher. Todas as senhoras, estão de busto vestido com roupas de tecido ligeiro.
Estendidos no solo, dois corpos de homens. O primeiro, na frente da cena, parece estar caído de bruços. O outro, entre aquele e as mulheres, deitado sobre a direita, tem o braço desse lado estendido no prolongamento do corpo, e o outro com a mão esquerda descansando sobre a coxa desse lado.
E o texto, sem qualquer título, dizia:
- Quem matou os seus auxiliares!? – Exclamou interrogativamente o inspector Hannibal Coob, quando entrou na casa de campo onde se encontravam mortos três gangsters a quem mandara perseguir por dois dos seus subordinados. Flo La Rue, Belle Race e Honey Dale negam conhecer os gangsters e contam que na noite anterior, aqueles três homens tinham-lhes pedido hospitalidade e, quando se tinham visto dentro de casa, as tinham prendido. Todas negam ter tomado parte no duelo entre os gangsters e os detectives, mas Coob sabe que uma delas está a mentir porque…
AHPP – CARTAZ - É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL? – 4
… Embora os três gangsters estejam mortos há meia hora, dois detectives foram assassinados com balas duma espingarda de calibre 12, disparadas 10 minutos antes. De súbito, Coob tem um palpite. Uma hora depois, com o auxílio de uma mulher-polícia, manda as raparigas apresentarem-se-lhe vestidas em fato de banho.
Quando Honey Dale e Belle Race apareceram diante do inspector, este declara peremptoriamente:
- «Não é preciso mais nada… Flo La Rue é a assassina!»
Qual foi a prova invisível que convenceu Coob?
(Ver a solução no próximo número)
Solução do segundo problema: Não publicada.
Como se poderá ler abaixo, até ao n.º 6 não voltou a ser publicada a secção que, provisoriamente, poderemos considerar terminada nesse número.
No entanto, o Jartur arrisca-se a aventar a seguinte proposta de solução.
Como se vê na foto que acompanha o problema, e eu tive o cuidado de referenciar no texto, as mulheres estavam com o busto coberto por vestuário de tecido ligeiro.
O investigador pediu-lhes que aparecessem de fato de banho, mas isso não foi certamente por qualquer fantasia erótica.
Suspeitando de que uma delas era a criminosa, e sabendo que a morte fora praticada com o recurso a uma espingarda, que também aparecia na foto, deduziu que, a criminosa obrigatoriamente exibiria a marca azulada que a coronha da arma provocaria ao chocar, com o seu recuo, após o disparo, contra o ombro da rapariga.
Por exclusão de partes, se as duas primeiras que apareceram não apresentavam a inevitável pisadura ou contusão, os vestígios teriam que estar na mulher que ainda não aparecera, e cuja demora talvez se deva à tentativa de disfarçar as marcas.
NOTA FINAL:
Encerramos, aqui, o trabalho de arquivo referente a esta secção: “É CAPAZ DE RESOLVER ESTE PROBLEMA POLICIAL ?”, que nos parece ter servido de ensaio para o suplemento que a revista viria a oferecer aos seus leitores, a partir do seu número 10 e da qual nos iremos ocupar de seguida.
Aproveitamos a oportunidade para pedir aos amigos que vão usufruir deste trabalho, o favor de nos enviarem as suas críticas e sugestões, e também as correcções para eventuais gralhas. Todavia, esta edição livre, poderá ser melhorada a bel-prazer dos utentes.
Jartur Março de 2011
HISTÓRIA DA SECÇÃO POLICIAL
INSERIDA NA REVISTA
DOCUMENTÁRIO VIVO DO MUNDO
DIRECÇÃO DE GENTIL MARQUES (REPÓRTER MISTÉRIO)
10 de Fevereiro de 1946 / 24 de Fevereiro de 1946
Produção de: “Jartur”
João Artur Mamede
MARÇO – 2011
3 comentários:
Mais uma dádiva inestimável de alguém que, quase só, luta por um Arquivo nacional do nosso desporto, num país que só lhe põe obstáculos.
Força, amigo! Luta! Não desistas! Agora ou no futuro, o teu dedicado trabalho há-de ter um lugar onde, daqui a décadas, se saiba que existiu e como começou o policiário. Será que alguém se sente incomodado com um desporto, onde um criminoso é sempre desmacarado publicamente?! Ou continua a ser a literatura policial um género menor, que não merece ser lido ou exposto? É que já houve essa fase. Ainda durará???
Isto dá-me uma raiva quase incontida. Ninguém agradece uma coisa daquelas, oferecida por alguém que a ela se dedicou? Que escada penosa de obstáculos o Jartur tem de subir! Ele e os outros que querem deixar testemunho... Desculpem, amigos, mas não posso conter a minha indignação. É das poucas coisas que ainda tenho direito de exprimir (por enquanto)...
Estou certo que todos estaremos dispostos a ajudar o Jartur nesta sua cruzada...
Zé
Zé, secundo completamente a tua opinião: o Jartur tem vindo a desenvolver um trabalho importantíssimo na preservação da memória do policiário, com esforço, com dedicação e, creio, com pouco reconhecimento. Merece todo o nosso apoio e colaboração, de facto.Todo o "material" policiário que possuo está-lhe destinado, num futuro próximo. E, breve e gradualmente, vai passar a receber as primeiras tranches...
Obrigado "Zé", por aqui trazeres o assunto e tentares agitar as águas, e um grande abraço de agradecimento ao "Jartur", pelo que tem vindo a fazer (e fará) neste campo.
"Inspector Aranha"
Jartur mostra-nos o "Cartaz", e o Luis Pessoa, quando nos mostra as classificações do 1º problema ?
"Inspector Aranha"
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