AQUECIMENTO DAS “CÉLULAS CINZENTAS” PARA A
COMPETIÇÃO
A uma
semana do início da competição desta época de 2014, está na hora dos nossos
confrades e “detectives” exercitarem as “células cinzentas” para os desafios
que se avizinham, depois de longa paragem!
Escolhemos
um problema do confrade Daniel Falcão, também como homenagem a este confrade
pelo muito que tem feito pelo Policiário, quer como decifrador e produtor de
excelência, quer como divulgador, sobretudo pelo trabalho desenvolvido no Clube
de Detectives.
O ENIGMA DO
GUARDA-CHUVA DESAPARECIDO
Autor: Daniel Falcão
Quando acordei, naquela manhã de
sábado, tive imediatamente a sensação que algo especial me iria acontecer. Não
me peçam que explique racionalmente o que realmente senti, porque não sou
capaz. Essa mesma sensação perseguiu-me durante toda a manhã, sem que eu
conseguisse divisar até onde ela me levaria. No entanto, a manhã decorreu com
normalidade e nada de relevante aconteceu.
O momento especial estava reservado
para a parte da tarde. Tal como fora previamente combinado com o meu grupo de
amigos, pouco passava das duas e meia quando nos dirigimos à Quinta da
Caverneira, onde iria realizar-se uma palestra intitulada “O detective que há
em cada um de nós”. Assim que tomara conhecimento da palestra e porque achei o
título muito cativante, tratei logo de arregimentar um grupo de amigos para me
acompanharem. Se bem que nem todos tenham cedido imediatamente, a minha vontade
acabou por ultrapassar todos os obstáculos.
Foi no preciso momento em que
transpus a porta de entrada que a vi. Os seus olhos verdes ficaram, por
escassos segundos, fixos nos meus. Julgo que os nossos olhos se afastaram
exactamente ao mesmo tempo, embora a sua imagem tenha perdurado na minha memória
por mais tempo. Quem seria aquela bonita rapariga? Como viera ali parar?
Quando voltei a olhar para o sítio
onde a vira antes, ela já havia desaparecido. Teria sido uma miragem? Seria a
minha fértil imaginação a pregar-me uma partida? A mim, que sempre sonhara com
um momento daqueles?
Não, não era uma miragem. A rapariga
era bem real, pois lá estava ela sentada numa das cadeiras da parte central do
auditório. Sentei-me na última fila, onde podia estar atento à palestra e,
simultaneamente, observá-la.
Embora, de vez em quando, os meus
olhos se dirigissem para um local específico na parte central do auditório,
centrei a minha atenção no senhor que estava a falar. Dizia ele:
«(…) Imaginem a situação seguinte: A
professora de inglês participou ao director de turma o desaparecimento do seu
guarda-chuva, que ela havia colocado, após entrar na sala de aula, encostado à
parede junto à porta de entrada. Ela sabia que três dos seus alunos tinham por
hábito pregar algumas partidas aos colegas e desconfiava que naquele dia, muito
possivelmente, a tinham escolhido como alvo das suas brincadeiras.
O director da turma ficou incumbido
de averiguar, junto dos três alunos suspeitos, se algum deles fora o autor
daquela brincadeira inocente. Chamou-os ao seu gabinete e, estando os três
sentados à sua frente, atirou a seguinte pergunta: “Quem foi o malandro que,
ontem de manhã, levou para casa, sem querer, um guarda-chuva que não lhe
pertence?”
Os rapazes entreolharam-se,
sorridentes, assim que o director de turma se calou. Nenhum deles parecia
querer ser o primeiro a responder. Até que o Vítor se decidiu: “Professor, eu
ontem levei para casa o mesmo guarda-chuva que de lá trouxera. Se alguém disser
que me viu pegar num guarda-chuva, tem toda a razão. Só que, tratava-se do
guarda-chuva da minha mãe.”
Depois do colega, os outros dois lá
se decidiram também a responder à pergunta. O segundo foi o Duarte: “Assim que
terminou a aula de inglês, dirigi-me ao sítio onde tinha colocado o meu
guarda-chuva, peguei nele e saí. Não toquei em mais nenhum guarda-chuva.”
Seguiu-se o Guilherme: “Eu não toquei em nenhum guarda-chuva. Por acaso, ontem
nem sequer trouxe guarda-chuva para a escola e muito menos levei qualquer
guarda-chuva para casa.”
Como devem imaginar, depois de os
escutar, chegara a vez do director da turma sorrir…
Algum de vós quer dar a sua opinião
sobre esta situação que acabei de vos expor?»
O inevitável silêncio em momentos
como este, fez-se naturalmente sentir. Uma certa vergonha tolhe sempre as
pessoas. Até que, calma e discretamente, um braço se ergueu. “Levante-se, se
faz favor, e diga-me o seu nome.” Ela levantou-se e sou capaz de jurar que, por
escassos centésimos de segundo, os seus olhos estiveram voltados na minha
direcção: “Chamo-me Bruna!”
“Muito bem Bruna, não se intimide com
o auditório e apresente a sua opinião.”
DESAFIO AO LEITOR:
O leitor, tal como a Bruna, também
tem uma opinião sobre quem pode ter levado para casa, inadvertidamente!, o
guarda-chuva da professora.
A – O Vítor.
B – O Duarte.
C – O Guilherme.
D – Nenhum dos três.
SOLUÇÃO
“Julgo que foi o Duarte que levou o
guarda-chuva da professora de inglês.”
Reparei no balancear assertivo do palestrante e senti-me, interiormente, satisfeito,
por Bruna, era este o seu nome, ter respondido acertadamente. “Muito bem! E
qual foi a razão que a levou a apontar o Duarte?”
Foi então que Bruna mostrou ter
estado muito atenta à situação que fora exposta: “Por uma razão muita simples.
O director de turma apenas referiu aos três rapazes que desaparecera um
guarda-chuva, sem precisar que fora na aula de inglês. Ora, o Duarte é o único
que identifica o término da aula de inglês como o momento em que desaparecera o
guarda-chuva.”
Quando me apercebi, estava de pé,
ovacionando a participação da Bruna e sendo acompanhado por todos os presentes
no auditório.
“Excelente! Eis uma resposta concisa
e objectiva” – começou por dizer o palestrante. E continuou: “Este, como muitos outros enigmas policiários,
procura desviar a atenção do solucionista para
pormenores secundários. Embora o Vítor tenha levado para a escola o
guarda-chuva da mãe, ou seja, um guarda-chuva feminino, tal não é suficiente
para o ‘incriminar’. Ele apenas teria mencionado este facto, para o caso de
alguém ter referido que ele tivera na sua posse um guarda-chuva que, indubitavelmente,
não devia ser o seu.”