[Transcrição da secção n.º 1196 publicada
hoje no jornal PÚBLICO]
AS
MIL E UMA NOITES D’OS PATUSCOS!
Percorremos hoje mais uma etapa
das nossas competições desta época, na semana em que completámos mais um
aniversário desta secção, o 22.º, que se comemorou no passado dia 1, publicando
um problema de autoria de uma dupla de grande qualidade, quer na decifração,
quer na produção de enigmas policiários, em que já foi, inclusivamente, campeã
nacional.
Reforçamos, pois, o tradicional alerta
para que os nossos “detectives” se debrucem um pouco mais sobre este problema,
para evitar dissabores classificativos!
CAMPEONATO
NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL – 2014
PROVA
N.º 6 – PARTE I
A
MILIONÉSIMA SEGUNDA NOITE - Original de BÚFALOS ASSOCIADOS
Por nada deste mundo o Inspector Garrett perdia os serões de sábado à
noite em casa da Tia Laurinda. As reuniões do grupo de amigos a que ela com
ironia chamava de "Os Patuscos" proporcionavam sempre bons momentos e
o Patranhas aparecera naquela noite com uma revelação extraordinária.
-"Calculem que quando andava a limpar a casa que foi dos meus avós
encontrei no meio dos livros da estante um documento incrível que pode muito
bem vir a alterar a história da literatura mundial. Conseguem imaginar que
"As mil e uma noites" que nós conhecemos podem não terminar como
julgamos? Toda a gente conhece o final em que o Rei Xahriar acaba por perdoar a
Xerazade, encantado com as histórias que ela foi contando, noite após noite,
deixando habilidosamente o final para a noite seguinte. Ela impedia assim que
ele de manhã mandasse cortar-lhe a cabeça, como havia feito a todas as
anteriores noivas, após terem dormido com ele apenas uma vez. Pois bem,
encontrei um texto que parece ter sido recolhido no século XVI por um
antepassado meu que assinava Padre Dâmaso e que viajou muito pelo Oriente. Nele
se relata o que se terá passado numa milionésima segunda noite que não consta
de nenhuma versão conhecida, e no fim da qual o Rei Xahriar mandou mesmo matar
Xerazade."
-"Como é isso possível? - interrompeu Garrett - A característica
fundamental da obra é a de poupar a vida de Xerazade, o que é considerado
uma homenagem à irresistibilidade
feminina que cativa o Rei e o faz desistir da sua lei cruel."
-"Pois, mas vejam esta descoberta que me veio parar às mãos. Numa
gaveta cheia de papelada velha encontrei esta relíquia, uma carta assinada por
um tal Padre Dâmaso datada de Patriarcado de Lisboa, 10 de Outubro de 1582, a
qual acompanhava um antigo documento escrito em árabe, que esse meu antepassado
dizia na carta ter encontrado uns tempos antes em Samarcanda, numa das suas
viagens. Claro que já mandei traduzir o escrito para português e vou ler-vos o
seu conteúdo:
"Na milionésima segunda noite o Rei
Xahriar disse a Xerazade que estava rendido ao seu talento de contar histórias
e disposto a poupar-lhe a vida, mas para tal ela teria de solucionar um enigma
que lhe passava a propor:
"Um poderoso Sultão tinha uma bela filha em idade de casar. Sabendo
haver três pretendentes, Ibrahim, Abul e Hassan, interrogou a filha para saber
qual deles era o preferido, ao que ela respondeu manifestando o desejo de casar
com alguém verdadeiramente inteligente e corajoso. Caso o não fosse, melhor
fora ser punido com a morte, como castigo pela ousadia de a requestar. Como era
voz corrente serem os três muito inteligentes, decidiu o Sultão submetê-los a
uma prova decisiva. Numa sala de onde mandou retirar todos os espelhos, colocou
os jovens em triângulo e mostrou-lhes cinco pequenos solidéus, três de cor preta
e dois de cor branca, à medida que os introduzia num saco. Passando depois por
detrás deles, tirou à vez um solidéu do saco e colocou-o sobre a cabeça de cada
um, sem que o próprio pudesse ver a cor. Dentro do saco sobraram dois solidéus
cuja cor eles ignoravam. Cada um podia assim ver os dois solidéus nas cabeças
dos outros, mas não o próprio. E disse-lhes que daria a filha em casamento
àquele que primeiro descobrisse a cor do seu solidéu, explicasse como havia
chegado a essa conclusão, e preveniu-os de que a inteligência e a coragem demonstradas
seriam decisivas. Passou algum tempo de silêncio. Todos hesitavam. O Sultão não
garantira a equidade e eles desconfiavam da sua imparcialidade. Mas corajosos
decidiram continuar. Às tantas, rompendo o silêncio, Ibrahim declarou desistir.
Passou mais algum tempo e Abul disse desistir também. Foi então que Hassan
acertou na cor do seu solidéu e disse o porquê. De resto cada um explicou o
porquê da sua decisão e manifestou a convicção de que a sua resposta tinha sido
a mais inteligente em cada ocasião. Mas tal não foi a opinião do Sultão que,
satisfazendo o desejo da filha, mandou executar os três jovens e explicou a
razão porque qualquer deles podia ter sido mais inteligente."
"Agora Xerazade, disse o Rei, tens de me responder correctamente a
quatro questões: como foi que se justificou cada um dos três pretendentes, e
qual foi a explicação que o Sultão deu para a sua decisão final?"
Xerazade, que tinha encantado o Rei Xahriar com a sua arte de contar histórias,
não foi capaz de encontrar uma resposta convincente e na manhã seguinte foi
executada, seguindo o exemplo das anteriores noivas do Rei."
-"Caramba, que final cruel! - exclamou Garrett - E a história acaba
assim? Nem uma resposta às quatro questões do Rei Xahriar?" -"Não, mais nada. - disse o Patranhas -
Procurem vocês as respostas."
-"Tem graça, isto lembra um problema de raciocínio lógico há muito
conhecido. - lembrou o Piquínhas - Não custa a crer que a origem possa vir do
Oriente, só que essa carta do Padre Dâmaso é muito duvidosa." Todos
ficaram a pensar na resposta às questões presentes na história e o curioso é
que foi a Tia Laurinda quem primeiro encontrou uma solução correcta. Quem quer
imitá-la?
E pronto.
Resta darem a resposta a este
enigma, impreterivelmente até ao dia 20 de Agosto (prazo mais alargado para não
criar conflitos com as férias dos nossos “detectives”), para o que poderão usar
um dos seguintes meios:
- Pelos Correios para
Luís Pessoa, Estrada Militar, 23, 2125-109 MARINHAIS;
- Por e-mail para um
dos endereços:
- Por entrega em mão
ao orientador da secção, onde quer que o encontrem.
Boas férias, para
quem as tiver e boas deduções!
Sem comentários:
Enviar um comentário