RIP KIRBY E ARISTIDES SOUSA MENDES
EM HOMENAGEM POLICIÁRIA
O ano de 2009 trouxe-nos algumas
novidades, desde logo porque a Tertúlia Policiária da Liberdade organizou o seu
convívio anual em Cabanas de Viriato, prestando uma homenagem ao cônsul
proscrito Aristides de Sousa Mendes, mas também porque assistimos a uma vitória
espectacular do confrade Rip Kirby, saudoso policiarista recentemente
desaparecido do nosso convívio e que hoje pretendemos homenagear, pela sua
persistência e empenho.
Recordemos o que foi aqui escrito
no final de mais uma época de intensa competição:
RIP KIRBY É CAMPEÃO
NACIONAL
ZÉ-VISEU VENCE TAÇA
DE PORTUGAL, É POLICIARISTA DO ANO
E N.º 1 DO RANKING
Estão
encontrados os grandes vencedores da época 2008/2009 que agora terminou!
Os
resultados da prova n.º 8 foram publicados à meia-noite de segunda-feira no
blogue CRIME PÚBLICO, em http://blogs.publico.pt/policiario
e desde logo os nossos “detectives” ficaram a saber quem foram os vencedores
das duas principais provas competitivas da época.
O
confrade do Barreiro, membro fundador da Tertúlia Policiária Valtejo e que há
alguns anos se fixou no Brasil, RIP KIRBY levou a melhor sobre a concorrência
directa e, em cima da meta, arrecadou o título de Campeão Nacional, que tão bem
lhe assenta. Com uma actividade policiária particularmente longa e uma
excelente qualidade, quer como decifrador quer como produtor, o confrade Rip
Kirby é um dos símbolos maiores do amor ao policiário, mesmo quando afastado
geograficamente do seu habitat de tantos e tantos anos.
Surpresa,
ou talvez não, o segundo lugar alcançado por uma “detective” da nova geração de
decifradores, de enorme capacidade e potencialidade, a escalabitana DETECTIVE
JEREMIAS, na senda dos grandes vultos que o Ribatejo foi dando ao Policiário,
em sucessivas gerações.
Fecham
o pódio os BÚFALOS ASSOCIADOS, uma dupla de grande qualidade que, uma vez mais,
demonstrou à saciedade que reúne todas as condições para aspirar aos voos mais
altos que o policiário pode proporcionar.
Destaque
ainda para o magnífico 4.º lugar da dupla A. RAPOSO & LENA e uma referência
para o confrade ZÉ-VISEU, na próxima época apenas ZÉ (Viseu), que soçobrou
somente na última prova, depois de longo tempo no comando das operações, mas
não deixou os seus créditos por mãos alheias, conquistando a Taça de Portugal
numa final de grande competição, em que se sobrepôs ao confrade bracarense
DANIEL FALCÃO.
Referência
ainda e novamente para ZÉ-VISEU, brilhante vencedor dos troféus de Policiarista
do Ano, e do Ranking.
HOMENAGEM DA TERTÚLIA POLICIÁRIA DA LIBERDADE
A ARISTIDES DE SOUSA MENDES
Este texto foi lido pelo confrade Rui Mendes, um dos
membros dos Búfalos Associados, por ocasião do descerramento de uma placa
alusiva à homenagem que a Tertúlia Policiaria da Liberdade prestou ao cônsul,
em Cabanas de Viriato, no convívio anual que ocorreu em 17 de Maio de 2009.
“Desde pequeninos que
todos à nossa volta nos dizem que devemos obedecer. Dizem-nos que devemos
obedecer, a Mãe, o Pai, os Avós, o Professor, o patrão, a polícia, as
religiões, os governos. É conhecida a lei do Regulamento de Disciplina Militar
que nos diz que devemos obedecer primeiro, e só depois, eventualmente, discutir
a justeza da ordem. À medida que vamos avançando na vida, vamos percebendo que
o segredo do poder está na capacidade de se fazer obedecer. Os poderosos
sabem-no bem, os ditadores não vivem sem o pôr em prática.
No século XVI um célebre
pensador francês de nome Étienne de La Boétie, encontrou naquilo que chamou de
“Mistério da Obediência” o segredo do poder político. Concluiu ele que a
escolha a fazer pelos humanos se limitaria a “obedecer ou morrer”. Para exercer
o poder tratava-se de obrigar a obedecer, até que aquele que obedece se consiga
esquecer de que o faz. Consiga mesmo chegar a atingir a alegria da submissão,
como bem supremo de uma vida feliz. La Boétie inspirou não poucas revoltas e
não poucas insubmissões. Felizmente!
A tal ponto que hoje
podemos ter a consciência de que não foi a obediência que fez a humanidade
avançar. Bem pelo contrário. Não foi pela obediência que se fizeram as
revoluções que, a pouco e pouco, e só elas, têm vindo a imprimir um pouco mais
de justiça nas relações entre os humanos.
Aristides de Sousa Mendes
foi um desobediente. Consciente e lúcido. Por singular coincidência faz hoje
exactamente 69 anos que Aristides passou os primeiros vistos desobedientes. Em
24 de Junho de 1940, quando o exército nazi avançava pela França dentro,
espalhando o terror e a iniquidade, o Dr. Salazar telegrafava ao Cônsul
português em Bordéus, proibindo-o de continuar a conceder vistos aos refugiados
que procuravam escapar aos horrores do extermínio nazi. A 4 de Julho (dez dias
depois) o mesmo Dr. Salazar ordenava um processo disciplinar contra o
desobediente pela “concessão abusiva de
vistos em passaportes de estrangeiros”. De uma penada chegava ao fim a
carreira diplomática de 30 anos de Aristides de Sousa Mendes.
Cito palavras de Sousa
Mendes: “Todos eles são seres humanos e o
seu estatuto na vida, religião ou cor, são totalmente irrelevantes para mim.
Sou cristão e como tal acredito que não devo deixar estes refugiados sucumbir.
E assim declaro que darei, sem encargos, um visto a quem quer que o peça”. Com
estas palavras argumentou Sousa Mendes na sua defesa perante as acusações que o
Estado Novo do Dr. Salazar lhe dirigiu na sequência do seu acto heróico. O
Cônsul pagou cara a sua desobediência. Condenado à inactividade num processo
disciplinar manipulado, arruinado financeiramente e impedido de exercer
advocacia, teve de recorrer à caridade alheia para se sustentar e à sua
numerosa família. A Pátria pagou-lhe com a desonra a sua coragem e a sua
abnegação.
Anos mais tarde, quando os
criminosos nazis se defendiam alegando que obedeciam a ordens, o Tribunal de
Nuremberga estabelecia que ninguém poderá atentar contra os valores humanos sob
pretexto da obrigação de obedecer a ordens injustas. Foi essa a grande
importância de Sousa Mendes: obedecer aos valores da humanidade e não à
iniquidade de ordens criminosas. A desobediência do Cônsul de Bordéus terá
salvo da morte perto de 30.000 inocentes, mas condenou à humilhação e à agonia
um homem honrado e a sua família. Um português bom e justo para quem a obediência
cega e passiva se tinham tornado um impossível moral. Aristides de Sousa Mendes
é hoje um herói reconhecido por todo o mundo civilizado.
A Tertúlia Policiária da
Liberdade, um grupo de amigos que, entre outras coisas, cultiva a procura da
verdade e da justiça, veio a Cabanas de Viriato, onde nasceu este notável
português do século XX, prestar esta modesta homenagem, tão simples quanto
sincera, na certeza de que é na memória dos homens que mereceram a nossa
admiração, que poderemos encontrar os caminhos para um futuro melhor para os
que vierem depois de nós.”