MORTE
SUSPEITA NA LEZÍRIA RIBATEJANA
Inicia-se a última etapa
da competição deste ano, com a publicação do derradeiro desafio de
características tradicionais, de autoria de Mário Campino, o “nosso” Manuel
Constantino, que foi tão justamente homenageado este ano, na sua terra natal,
Almeirim.
CAMPEONATO
NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL – 2015
PROVA
N.º 10 (ÚLTIMA) – PARTE I
A
ESTRANHA MORTE DO “TIO PALITO DAS VACAS” – Original de MÁRIO CAMPINO
Noite fria para a época,
madrugada branda…
Avô Palaló fechou o largo
portão da Rua do Paço, enquanto o cavalo esperava, sacudindo com o rabo
comprido as moscas invisíveis ou imaginárias. Montou. A breve brisa que lhe
afagava o rosto, surge com uma promessa de vida. Não tem que incitar a montada,
esta conhece a rotina do período, concluídas as sementeiras. Caminha até à
esquina, volta à direita para uma rua larga de terra batida na areia que o
levará às Milheiras. Junto do muro do pátio do Vasco deteve o cavalo e
desmontou, colocou as rédeas sobre a sela, deu uma suave palmada na anca do
animal, que seguiu em frente, seguido pelo dono, a pé, distendendo as pernas
arqueadas de anos de cavalgar. Sempre que se afasta meia dúzia de metros do
companheiro, o cavalo pára, aguarda que o dono chegue à sua beira para
continuar. Neste ritual, o avô avistou adiante a carroça carregada com bidões
largos, onde o “Quim Leiteiro” despejava uma bilha de boca larga, outra tombada
no chão, frente á rua vedada por uma vara de pinho caída, que dava acesso à
pequena propriedade do “Tio Palito das Vacas” – na verdade João Libório, que o
povoléu alcunhara por possuir quatro vacas leiteiras, ser delgado sem ser alto,
mas rijo para o trabalho apesar da idade – um regressado dos “Brasis”, cujos
sacrifícios lhe permitiram amealhar “patacas” bastantes para comprar uma
pequena parcela de terra, onde construiu uma casa tosca, um barracão largo, uma
horta tipo familiar e pastagens para o gado. Dele se pensava que teria um bom
“pá de meia”, resultado da venda diária de oitenta litros de leite e a
“MariDores” ia todas as semanas fazer queijos, para a casa ou venda. Com ele
vivia o sobrinho Óscar, filho da falecida irmã e único membro da família, agora
com dezanove anos, um segundo “palito”, mas mais frágil e enfraquecido pela
bebida, avesso ao trabalho, assíduo na Taberna da Rita Pirua.
O Avô Palaló gostava da
índole do Libório e as andanças pelas Milheiras, incluíam, normalmente, “dois
longos dedos de conversa” com o vizinho, pelo que o cavalo parou na serventia,
bufou como que aliviado de uma grande corrida que não fizera, cheirou um tufo
de ervas no valado, de que se desinteressou e esperou o dono. Este, a três
passos da cena, já ouvia o leiteiro esbracejar:
- Aquele “alentejano do
demo”, quis enganar-me! Trouxe duas bilhas, uma vazia. Ai que eu faço uma
asneira…
- Calma, homem, vamos ver
o que se passa. – aconselhou o avô.
Entraram. Logo adiante
uma “pedaleira” no chão. Mais além uma casa rústica de tecto alto, um casarão
totalmente aberto. Nele, duas vacas mugiam angustiadamente, uma terceira fora
arrastada pelo “Miguel Alentejano” – um homem baixo e forte, de rosto crestado
pelo sol, que viera pedir trabalho há uns meses e ficara – para o prado onde
uma outra abocanhava, serena, a erva tenra, todavia, o animal voltara a entrar
no barracão e junto da cancela fazia coro com as outras. Miguel prepara-se para
ordenhar, hesitante.
Os dois homens apareceram
e o leiteiro atacou:
- “Qué” lá isso? Levaste
uma bilha cheia, outra vazia…
- “Ná”. Carreguei duas,
eu…
O avô interrompeu:
- Vamos a isto minha
gente; primeiro o trabalho! E airou uma bilha para as mãos do leiteiro, ele
mesmo começou a ordenhar.
Sem questionar
transportaram as bilhas cheias para o terrado frente á habitação. O
“brasileiro” tinha a porta cerrada, estaria na horta?
Miguel foi encarregado de
despejar as bilhas na carroça, enquanto o avô e o leiteiro iam à horta. Não o
encontraram. Estaria doente? Pensou o avô.
Voltaram ao terreiro. O
avô, preocupado, viu o alentejano já de volta da missão, bateu à porta sem
resposta e entrou. Dentro estava escuro. Abriu uma janela. O Libório estava
sentado numa cadeira de braços, à mesa, frente a uma tigela de café frio,
metade de um queijo e pão. Acercou-se, tocou-lhe com os dedos no rosto
anormalmente frio. Estremeceu. Olhou à volta para reparar que a lareira parecia
não ter sido acesa, o candeeiro de petróleo estava apagado por falta de
combustível…
Chegou-se à porta e
gritou para os outros.
- O homem está morto!
Olha, Quim, mete-te na “traquitana”, passa pelo Dr. Chico, diz-lhe que vais da
minha parte… e vai à tua vida.
Sentou-se ni pial da
porta.
Miguel parecia apático.
- E agora o que é que eu
faço? Nunca passei da porta da casa, mas ontem, perto das nove da noite, estava
à espera do sobrinho e pediu-me para o ir buscar à taberna. Encontrei-o perto
daqui, “enfiado na pedaleira”, “bêbado que nem um cacho”, com as palmas das
mãos cheias de sangue. Carreguei-o às costas e deixei-o na cama. O patrão até
me deu uma nota pequena. Agora…
O médico levou meia hora,
bem puxada, a chegar:
- O que temos, Manuel?
Entrou e acercou-se do
morto, atestou a rigidez, pediu para o ajudar a retirar o corpo da cadeira…
deteve-se.
- espera, ele não está
sentado, jaz hirto. Estranho!
Examinou o pescoço,
levantou a camisa, conseguiu puxar as calças e observou:
- Olha para estas manchas
roxas, no pescoço, nas costas, nas nádegas, na parte inferior das pernas…
segredou ao ouvido do avô – isto quer dizer…
Com os dedos hábeis,
tacteou o corpo; ao explorar a cabeça descobriu um pouco acima da nuca,
encoberto por escassos cabelos, uma contusão arredondada, provavelmente
resultante de pancada com objecto redondo, pedra ou ferro, da qual, tudo o
indica, resultou esmagamento do crânio – denunciou.
- É melhor avisar o
comandante do posto, o nosso cabo André. É preciso uma autópsia, mas deixe-o
ver o corpo. Quem terá feito isto?
O avô como que acordou de
um pesadelo:
- Tenho de dar
conhecimento ao sobrinho…
Foi à porta e gritou para
o Miguel:
- Onde está o Óscar,
saíu?
- Ora, acho que “tá na
sorna”!
O avô e o médico subiram
as escadas de madeira para o sótão. O rapaz estava a ressonar, atirado para a
cama, babado e a cheirar a azedo. Não respondeu aos abanões do médico, que lhe
deu uma bofetada dura. Acordou desnorteado:
- Tio… isso não vale!
Levantou as mãos sujas,
com escoriações e sangue seco, igualmente visível na manta.
Sentou-se, zangado. Ao
fazê-lo, alguma coisa caiu ao chão com estrondo – um pilão de cobre de um
almofariz.
O instrumento do crime,
creio! E apoderando-se do objecto, o médico correu escada abaixo, para pouco
depois gritar para cima:
- Ajusta-se, Manuel,
ajusta-se! O almofariz está na cozinha.
E o Dr. Chico,
subitamente apressado, alegou a visita a um doente e partiu. O avô ponderou as
motivações de A a Z e concluiu pelo roubo. Entretanto a casa não apresentava indícios
de busca; a hipótese viável é que o ladrão só descobriu o esconderijo do
dinheiro no momento em que a vítima o retirava.
Esperou quase três horas
pelo cabo André, a quem relatou os acontecimentos e conclusões pensadas e
ponderadas.
O cavalo, cansado de
esperar, entrou e postou-se no terreiro, batendo o chão com as patas fortes,
agora impaciente.
Entretanto: Quais as
conclusões, fundamentadas, do leitor?
E pronto.
Resta aos “detectives”
elaborarem os seus relatórios, impreterivelmente até ao dia 30 de Novembro e
enviá-los, podendo usar um dos seguintes meios:
- Pelos Correios para
Luís Pessoa, Estrada Militar, 23, 2125-109 MARINHAIS;
- Por e-mail para um dos
endereços: lumagopessoa@gmail.com; pessoa_luis@hotmail.com ou luispessoa@sapo.pt.
- Por entrega em mão ao orientador da secção, onde quer que o encontrem.
Boas deduções!
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