A
ESTRANHA SENTENÇA DO VIGÁRIO CASTANHO
Na
companhia do confrade Paulo, vamos percorrer uma aldeia do interior profundo do
nosso país, no começo do século XX e conhecer as suas gentes.
Tratando-se
de problema com a chancela de qualidade do viseense Paulo, chamamos a atenção
dos nossos “detectives” para o modo como as situações são colocadas e
desenvolvidas.
Apesar
das condições climatéricas apelarem ao lazer, à praia ou ao campo, a mente
agradece alguma actividade e empenho, para que nenhum “pontito” se perca…
CAMPEONATO
NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL – 2016
PROVA
N.º 7 – PARTE I
A
MORTE DE BERNARDO DO SOUTINHO – Original de PAULO
1901, aldeia de Mouriscas do Carregoso,
em pleno coração da Beira da Alta.
O vigário da paróquia, o regedor e
mais dois habitantes da localidade, Joaquim Baldaia e Porfírio Clemente, proprietários
de mais de metade dos terrenos cultivados e pinhais, estavam sentados em torno
de uma mesa, onde quatro copos de vinho tinto e uma jarra de barro preto
pousavam.
– Faz hoje um ano que aconteceu a tragédia, dizia
o vigário Castanho.
– É verdade! Parece que foi ontem! E
até aparenta que nós estamos a festejar uma desgraça, retorquiu o Joaquim
Baldaia.
– Realmente até se pode pensar isso,
mas apenas estamos a beber com um dia de atraso ao meu aniversário. Ontem, no
dia certo, a 28 de fevereiro, não conseguimos reunir o grupo, mas hoje cá
estamos nós, referiu Porfírio, levando o copo aos lábios.
O Baldaia continuou.
– Lembro-me que foi logo depois do dia
em que fazes anos. Tínhamos estado todos juntos na véspera, e no dia seguinte
apareceu o Bernardo do Soutinho morto. Há momentos que ficam marcados pelas
coincidências e esse foi um deles.
– Era bom homem, mas teimoso como uma
mula. E tu, Joaquim, bem o podes confirmar.
Joaquim Baldaia olhou para Porfírio,
que acabava de proferir estas palavras.
– Meteu-se-lhe na cabeça que eu andei
a mudar os marcos no lameiro, a mexer nas estremas. Mas não passavam de
invenções da cabeça dele. Aliás, Porfírio, também andou com a mesma cantilena
para contigo.
– Sem dúvida, meus amigos, ele era um
homem um pouco estranho. -acrescentou o vigário Castanho. – Desconfiado e
avarento, mas justo.
– Concordo consigo, senhor vigário. E
o corpo ter sido achado tão breve, foi obra divina, talvez em recompensa por
ele ser justo. Se o senhor não tivesse vindo da Cumeeira pelo atalho do
Conguedo, depois de dar a extrema-unção à velhota Marquitas, o Bernardo poderia
ter ficado lá alguns dias a apodrecer até ser encontrado, interveio o regedor.
– É verdade! Vinha com o rapazito, o
Zé, filho da Maria Albertina da Corujeira, quando no meio do pinhal dei com o
Bernardo com a cabeça aberta e os miolos de fora. Mandei logo o rapaz ir dar o
aviso do sucedido ao senhor regedor. Consegui que o miúdo nem visse aquela
sangria toda.
– Mas encontrou-me a mim antes, disse
o Porfírio, e acabei por ser eu a dar o recado aqui ao nosso regedor. Fui em
busca dele depois do rapaz me ter dito onde estavam o Bernardo e o senhor
vigário e de eu o ter mandado para casa. Encontrei o nosso regedor e fomos os dois
ter com senhor vigário.
– Um sacerdote deve estar preparado
para ver tudo, mas confesso que mirar os miolos do Bernardo do Soutinho ao ar, me
deu a volta à barriga e vomitei enquanto estive à espera. Acabei por me afastar
do corpo um bocado, para descansar os olhos daquele horror, e foi quando vi o
calhau usado para lhe abrirem a cabeça.
Joaquim Baldaia que escutava com
atenção acrescentou.
– Eu só soube o que aconteceu um dia
depois. Naquele dia a seguir ao aniversário do Porfírio estive todo o dia na
vila. Fui de manhã e cheguei já de noite, que ainda são quase duas léguas para
cada lado, para tratar de uns assuntos na Fazenda. Primeiro que nos resolvam por
lá os problemas…., esperamos um dia. Abrem livros, fecham livros e um homem a
esperar.
– Aquilo foi vingança de terras ou de
mulheres, sentenciou o regedor.
– Ainda hoje tenho pesadelos com os
miolos do Bernardo, acrescentou pesaroso o vigário Castanho. Enquanto esperava
que o senhor regedor chegasse, fiquei junto da pedra ensanguentada a orar, de
olhos fechados. Na altura fiquei muito perturbado. Nem percebi bem o que se
estava a passar.
– Acredito, acredito, atirou o regedor.
Por isso o senhor vigário estava umas dezenas de metros do corpo quando cheguei
e nem o estava a ver a si nem via pedra nenhuma.
– Nem eu reparei na vossa chegada,
disse o vigário. Fiquei mudo e quase cego. Só consegui voltar a falar quando me
aproximei dos meus dois amigos.
Clemente sorriu e acrescentou:
– Pois fui eu que o vi e o chamei dizendo-lhe
para trazer a pedra consigo.
O regedor tomou a palavra.
– O certo é que ele morreu e nunca se
descobriu quem lhe abriu a cabeça.
O clérigo levou o copo à boca,
enquanto os outros o imitavam silenciosamente. Depois disse:
– A justiça terrena não conseguiu até
agora encontrar e castigar o matador, mas a divina não o deixará escapar. Porém,
a partir de hoje, infelizmente, eu também sei que posso ajudar a que ele não
escape à terrena.
E com esta sentença do vigário Castanho
lança-se um repto aos leitores.
Conhecidos os factos, que poderão os
nossos detetives acrescentar em relação ao crime? Há alguma pista que não foi
explorada e que permitiria avançar na descoberta do criminoso? Elaborem os
vossos relatórios.
E pronto.
Resta aos “detectives” apresentarem
os seus relatórios, impreterivelmente até ao dia 10 do próximo mês de Setembro,
para o que poderão usar um dos seguintes meios:
- Por Correio para: Luís Pessoa,
Estrada Militar, N.º 23, 2125-109 MARINHAIS;
- Por e-mail para qualquer dos
seguintes endereços: pessoa_luis@hotmail.com; luispessoa@sapo.pt ou lumagopessoa@gmail.com.
- Por entrega em mão ao orientador da
secção, onde quer que o encontrem.
Boas deduções!
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