TORNEIO DE PREPARAÇÃO
1.ª Problema
NO SILÊNCIO DA NOITE!...
Problema
policial rimado
Original
de: JARTUR MAMEDE (Porto)
Publicado
na secção POLICIÁRIO em: 11.Outubro.1992
Sem
um ai, sem um suspiro,
um
corpo caiu no chão!...
E
ouviu-se soar um tiro,
no
meio da escuridão.
Ouviu-se
o motor dum carro,
e
as rodas sobre o asfalto,
deixando
marcas de barro,
quando
o carro deu um salto.
Ninguém
viu, ninguém ouviu,
ninguém
soube contar nada…
Polícia
logo surgiu,
e
deu com a morta gelada.
Tinha
sido estrangulada,
e
estava semidespida...
com
a blusa rasgada,
e
a cuequinha descida.
Mas
não fora violada,
por
quem lhe tirara a vida.
Nem
a carteira roubada,
pois
estava no chão caída.
Nem
sequer uma pègada,
nem
pistola, nem canhão...
Só
uma bala encontrada,
e
o seu cartucho, no chão.
A
Polícia inspeccionou
tudo
em volta, com cuidado,
julgando
que quem matou,
pudesse
ter-se ocultado.
Na
carteira da finada,
tudo
fazia sentido.
Estava
bem documentada
e
tinha o nome do marido.
Logo
aquele procurado,
estava
a ver televisão,
bem
vestido e acordado,
à
espera da Conceição...
Que
saíra há meia hora,
para
ir à casa da mãe.
-
Foi-se embora, porta fora,
sem
dizer nada a ninguém.
Ao
saber que o corpo fora
numa
ruela encontrado,
deu
um berro: - Essa agora!...
E
ficou aparvalhado.
Refez-se,
abrindo a janela,
e
disse, já de pistola:
-
Se foi o amante dela,
eu
dou-lhe um tiro na tola.
O
inspector perguntou,
raciocinou,
concluíu,
e
depois adiantou:
-
Se foi ele, já fugiu!...
E
ao sair, junto à garagem,
ouviu
estalidos e um miado.
E
um gato da vadiagem,
sobre
o "capot" deitado.
E
ao ditar o relatório,
o
inspector exclamou:
-
Elementar! É notório,
eu
já sei quem a matou!
Relê,
leitor, estes versos
e
escreve a solução,
analisando
os diversos,
pormenores
de acusação!...
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NOTA:
Como vem sendo hábito fazer, quando reproduzo um problema
dou um salto ao FUTURO,
para ir buscar a respectiva solução que,
neste caso (estamos em 11 de Outubro de 1992) só será publicada,
no “Policiário” de 8 de Novembro próximo futuro. Jartur
NO SILÊNCIO DA NOITE...
Solução apresentada por: José Augusto Rodrigues
da Silva
Publicada em: 08.Novembro.1992
Elementar meu caro Watson! – diria Sherlock Holmes. Na
verdade, é perfeitamente evidente que o autor do crime foi o próprio marido da
vátima.
Fundamentos:
1. Se “a Polícia logo surgiu/ e deu com a morta gelada”,
incontroverso é que a morte se verificara já há várias horas, pois de contrário
não seria essa a temperatura que o corpo apresentaria.
2. “Nem sequer uma pegada/nem pistola nem canhão.” (…)
“A Polícia inspeccionou tudo em volta com cuidado.” O conhecimento de tais
factos, aliados à conclusão obtida em 1, dão-nos a certeza de que o crime não
foi não foi ali cometido e que a vítima ali foi abandonada pelo seu algoz muito
tempo após a perpetração do acto criminoso..
3. De resto, é o que nos pretende dizer o verso “sem um
ai, sem um suspiro/ um corpo caiu no chão/ e ouviu-se soar um tiro/ no meio da
escuridão”. De facto, a ordem sequencial está trocada: primeiro a queda do
corpo, depois o tiro. E a causa da morte até fora o estrangulamento… Logo, o
tiro foi apenas e só para dar o alarme, para que o corpo fosse rapidamente
encontrado.
4. Para além do mais, existiria necessariamente pegadas
da vítima e do assassino, no local, se o crime ali tivesse sido cometido,
porquanto o carro, ao arrancar, deixou sobre o asfalto marcas de barro e a
Polícia, ao inspeccionar tudo em volta com cuidado, não encontrou sequer uma
pegada. Nem sequer da vítima… como iria ali ter, sem pegadas?
Portanto, crime ali não cometido, e o corpo apenas ali
“despejado” do carro, pelo assassino, e um tiro por este disparado pelas razões
já expostas.
5. “Estava semi despida/ com a blusa rasgada/ e a
cuequinha descida, mas não fora violada/ por quem lhe tirara a vida”. Logo, o
móbil do crime não fora o que se pretendia evidenciar – obviamente para
despistar quanto ao seu autor.
6. Porque “nem a carteira roubada/ pois estava no chão
caída/ e na carteira da finada/ tudo fazia sentido”, também o móbil do roubo
não podia ser admissível.
7. Mas tinha o nome do marido logo ali à vista. Curioso.
Porquê? Nem sequer é natural… Claro que pela razão do tiro: para conduzir a
Polícia de imediato até junto dele e encontrá-lo em casa, com este pretendido
álibi.
8. “Bem vestido e acordado.” Bem vestido, à noite, em
casa, a ver televisão? Não seria mais natural, nessas condições, a utilização
de uma indumentária mais ligeira, quiçá até um pijama ou roupão?
9. De qualquer modo, mesmo que tais indícios bem
reveladores da sua culpabilidade não existissem, o marido da vítima logo se
encarregou de “assinar” a sua confissão de culpa, ao declarar que a mulher
saíra há meia hora. E que, apenas poucos minutos antes, ela aparecesse já
gelada...
10. E se, como disse, ela se
foi embora, porta fora, porta fora, sem dizer nada a ninguém, como saberia ele
que a mulher saíra para ir a casa da mãe? Com todos estes factos, a
culpabilidade já não deixava margem para dúvidas. Mas há mais…
11. O inspector, ao sair,
junto à garagem, “ouviu estalidos e um miado, e um gato da vadiagem, viu sobre o
“capot” deitado”. Claro, que os estalidos provinham do motor do carro,
resultantes do seu gradual arrefecimento, factor demonstrativo da sua recente
utilização e chegada.
12. E não é que o tal gato
vadio contribuiu também para incriminar o criminoso? Logo o bicho se havia de
ir deitar sobre o “capot” do carro, desfrutando do calor que ele ainda
transmitia, chamando para o facto a atenção do inspector…
E é tudo. Cumprimentos.
José Augusto Rodrigues da Silva (2000 - Santarém)
José Augusto Rodrigues da Silva (2000 - Santarém)
NOTA:
Não resistimos a publicar
esta solução por se tratar de um excelente exercício de dedução e capacidade de
síntese. Esperamos que seja um bom exemplo, a seguir por todos!
Luís Pessoa
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