RESOLVIDA A MORTE
DE EUSÉBIO
O confrade Verbatim apresenta-nos a
decifração da morte de Eusébio, mais um passo nas competições desta época:
CAMPEONATO
NACIONAL E TAÇA DE PORTUGAL – 2017
SOLUÇÃO DA PROVA
N.º 7 – PARTE I
“MORTE NAS
TRASEIRAS” – de VERBATIM
Para resolução deste problema convirá,
primeiro do que tudo, fazer um esquema dos quintais e aí localizar os corpos de
Eusébio Figueira e do seu cão bem como os projécteis disparados e o
silenciador.
Num rectângulo de 3x2, temos da esquerda
para a direita, numa primeira fila, os quintais dos Lopes, dos Figueira e dos
Silva e, numa segunda fila, os quintais dos Simões, dos Ferreira e dos Costa.
No terreno dos Figueira o corpo está estendido, paralelo à base do rectângulo,
com a cabeça para o lado direito, encontrando-se o cão junto dos pés do dono.
Os projécteis estão à esquerda, um junto do murete de separação com o quintal
dos Lopes e o outro entre este muro e o cão. O silenciador está no terreno dos
Lopes.
Constata-se, de imediato, que a posição do
corpo de Eusébio Figueira não conjuga com o local onde foi cair a bala que lhe
entrou pela face. Ou o projéctil ou o corpo foi retirado da sua posição
inicial. Como a bala que atingiu a vítima ainda bateu no muro à esquerda, tendo
aí caído, então o corpo terá sido rodado de 180 graus.
Havendo sangue do cão, que jazia aos pés
de Eusébio Figueira, misturado com sangue do dono, que só tinha ferimentos na
cabeça, sem qualquer indício de que o corpo do cão haja sido movido, então a
cabeça de Eusébio Figueira esteve a sangrar no sítio onde o animal caiu ferido
e terá sido daí retirada. Sai assim reforçada a tese da rotação de 180 graus
aplicada ao cadáver humano.
Verificamos, pela localização dos
projécteis, que eles terão sido disparados do lado direito e, considerando o
percurso na cabeça da vítima, bem como a provável altura do cão e a pouca
distância a que a bala que o atingiu se alojou, que os dois tiros fatais terão
sido desferidos de um nível superior ao das vítimas.
A localização de um silenciador, com
sinais de uso recente, num quintal à esquerda, não concorda com os disparos
vindos da direita. Podemos, portanto, começar a presumir que a rotação do corpo
e o aparecimento do silenciador no quintal dos Lopes terão constituído uma tentativa
de inculpar alguém do lado dos Lopes.
É possível conjecturar, também, o modo
como foi rodado o corpo de Eusébio Figueira atendendo às escassas pingas de
sangue entre o corpo e a porta da casa para o quintal e ao pouco sangue existente
sob a sua cabeça. Assim, a vítima, agarrada talvez pelas axilas, terá sido rodada
com a cabeça a passar entre o sítio onde caíra e a vivenda, para depois ficar
virada em sentido contrário. Como já sangrara bastante, as pingas foram
escassas e o sangue que a seguir derramou para o chão já foi pouco.
Os intervenientes neste caso, nas suas
declarações, não entraram em contradição quanto aos tempos em que ocorreram ou
podiam ter ocorrido os acontecimentos a que se referiram. Mesmo António da
Silva, ao dizer que perto do meio-dia e meia vira o vizinho Eusébio estendido
no quintal, ter-se-á reportado ao período que mediou entre a saída dos jovens do
quintal, para pedir ajuda, e a chegada dos agentes da autoridade. Note-se que
os rapazes deverão ter demorado menos de meia hora a vir da praia e que naquela
altura não havia telemóveis.
Chegados aqui, verificamos que António da
Silva será o principal suspeito. Os álibis dos dois jovens e de outros vizinhos
e as declarações que ele próprio produziu levam-nos a presumir que não só poderá
ter morto Eusébio Figueira como terá procurado mostrar que o criminoso seria
alguém do lado dos Lopes.
Com efeito, o que foi observado permite
estabelecer, como muito provável, a conjectura que se descreve a seguir. António
da Silva, cerca das 10:00, munido de uma arma com silenciador, em cima de um
escadote onde fingiria encontrar-se a examinar os cachos da parreira, disparou
sobre Eusébio Figueira e também sobre o cão, não fosse este produzir qualquer
alarme. Isto era possível e, sobretudo, concorda com o trajecto das balas. De
seguida, não havendo o empecilho do animal, António da Silva decidiu alterar a
cena do crime para lançar as culpas sobre os Lopes. Então, com grande risco,
saltou para o lado dos Figueira, rodou o corpo e atirou o silenciador para o
quintal dos Lopes, depois de o soltar e limpar com a ajuda de um trapo. Isto também
concorda com a cena observada e ganha um sentido especial pelo facto de António
da Silva ter afirmado que, perto do meio-dia e meia, vira Eusébio estendido no quintal, como quem tivesse
levado um balázio pela frente, denunciando, desse modo, o desejo de se
entender que Eusébio Figueira fora atingido por um atirador colocado no lado
contrário ao seu. A arma não terá sido arremessada para o quintal dos Lopes
por, talvez, ser conhecida de alguns vizinhos como pertencente ao nosso
suspeito.
António da Silva também entrou em
contradição quando disse ter procurado avisar alguém da casa dos Figueira para
socorrer o Eusébio, supostamente por não saber bem o que lhe teria acontecido e,
logo a seguir, mostrar encontrar-se em condições de perceber, mal chegaram os dois
militares da GNR, que, entretanto, alguém
já concluíra que o vizinho tinha sido morto a tiro.
Finalmente, pode presumir-se que António
da Silva terá saído de casa para se desembaraçar da arma que utilizou, pois
teve muito tempo para isso, e que ao voltar, encontrando tudo ainda muito
calmo, haja ficado atento a qualquer movimento no quintal dos Figueira para, a
partir daí, representar a rábula de uma pessoa surpreendida e preocupada com o
que pudesse ter acontecido ao seu vizinho Eusébio Figueira.
O móbil do crime não é claro. Contudo, verificando
que Eusébio Figueira assim como os seus vizinhos Silva e Lopes se dedicavam a
negócios pouco transparentes e gostavam de estar armados, não será de excluir a
hipótese de um ajuste de contas gerado entre traições e malsãs cumplicidades.
Também não será de descartar a possibilidade de estarmos perante um crime
passional devido a alguma atenção desmesurada, em relação a Eusébio Figueira, evidenciada
pela exuberante chefe do clã Silva.
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