TORNEIO DE PREPARAÇÃO
Prova n.º 4
O ROUBO DA TRÍADE
Original
de: DE LA TIERRA (Almada)
Publicado
na secção POLICIÁRIO em: 15.Novembro.1992
Já há dois
dias que chovia ininterruptamente. O detective Cecílio, reformado alguns meses
antes, radicou-se num país da África Ocidental, o Gana, em plena estação das
chuvas. O cheiro agreste daquele ambiente tropical penetrava longamente nas
narinas largas desse homem gorducho e rosado que granjeara fama internacional
ao longo de uma carreira de muitos anos. Estava sentado no seu quarto de hotel,
junto de uma janela cujos vidros escoavam gotas finas e ondulantes de chuva,
quando se fez ouvir o ruído estridente do telefone.
- Alô! – exclamou Cecílio.
- Está? Cecílio? Daqui fala Numyai, da Tailândia.
- Oh. Há quanto tempo, hein? Então, que novidades
contas dessas paragens?
- Como sabes, tornei-me comissário da Interpol e
preciso da tua ajuda…
As nuvens
começaram a dissipar-se no céu. Vinha aí bom tempo. Bom prenúncio, pensou
Cecílio. Desceu do seu quarto, para as ruas húmidas da cidade.
Munido de um
impermeável, Cecílio meteu-se no interior dum táxi.
- Para o
aeroporto de Acra, por favor.
Recostado nos
bancos gastos do veículo, o velho detective relembrou tudo o que Numyai lhe
contara ao telefone. O caso era simples. Um roubo importante tinha sido
cometido em Bangkok. O objectivo em causa era um conjunto de três peças unidas
representando deuses imemoriais, uma antiga e valiosa tríade religiosa.
Há muitos anos
que era guardada numa velha loja de antiguidades, conhecida entre os
tailandeses pela grande figura em madeira, dependurada no tecto, de Buda
Jejuante, numa área citadina interdita a estrangeiros. Ão havia dúvidas quanto
à hora a que o crime fora perpetrado: pouco instantes antes das 9 horas da
manhã. Tinha sido um trabalho ultra profissional. Encontraram um canivete junto
do cofre arrombado, já com um certo desgaste de dedos no lado direito do cabo,
provavelmente o canivete preferido do criminoso, mas não foi possível
identificar impressões digitais.
Os suspeitos
eram três homens, com passados ligados ao roubo internacional. Eram todos
norte-americanos, e conheciam-se-lhes modalidades diferentes. Mahoney era
perito em explosivos de baixa densidade; Carlsson adquirira fama nos sistemas
digitalizados de alarme e Travis era um conhecido traficante de influências e
subornos. Os três homens haviam saído de Bangkok sem que tivesse sido possível contactá-los
para as investigações. Por uma feliz coincidência, os três viajaram
precisamente para Acra, a capital do Gana. Cecílio tinha sido incumbido de
descobrir o que fosse possível para a captura do autor.
Quando chegou
ao amplo salão do aeroporto, já os três homens se dirigiam para a saída de
táxis. Haviam chegado às 16 horas. Cecílio dirigiu-se a eles.
- Hello –
começou Cecílio – mandaram-me vir buscá-los.
Os três homens
franziram a testa.
- Desculpe –
replicou – mas deve haver um engano. Acho que nenhum destes senhores me conhece
e vice-versa.
Os outros dois
anuíram afirmativamente.
- Deve ser
esta minha velha e confusa cabeça. – lamentou-se o detective – Oh, agora
reparo! – Apontou para um colar que Mahoney ostentava ao peito. – Vejo que tem
aí uma bela recordação alusiva a Wat Phra Keo. Aposto que a comprou naquela
loja grande, em Bangkok, com o seu grande Siddharta Iluminado no meio do tecto.
Mahoney
sorriu.
- Não é
Siddharta Iluminado, basta olhar e vê a figura de Siddharta Jejuante.
- É isso, é
isso…
- Pode
dizer-me onde arranjar um hotel? – questionou Travis.
- Claro. –
disse Cecílio, virando-se para ele. – Não quer anotar?
O homem
rabiscou num bloco de notas com um lápis seguro na mão esquerda, enquanto o
detective ditava uma morada.
- E o senhor,
não procura um? – disse para Carlsson. – Tem um ar cansado. Por acaso ouviu
falar do roubo da tríade, em Bangkok?~
- Da quê? Não,
não sei de nada.
- Aconteceu
hoje de manhã Já corre pelos jornais vespertinos do mundo.
- Como poderia
eu saber? Para realizar uma viagem de 13 horas, tive de largar de Bangkok antes
desse acontecimento, pelas 3 horas da madrugada, para estar aqui a esta hora.
Os três homens
despediram-se do detective e seguiram destinos diferentes. Cecílio entrou numa
cabine telefónica, discou um número e esperou.
- Está? Numyai?
Pois bem, acho que deves vir para cá e trazer mais homens do que o habitual…
-Quem roubou a
tríade? - perguntou Numyai – Conta-me como descobriste.
Quer ser você a responder?
NOTA:
Acompanhando este problema, naquele dia de há 20 ANOS ATRÁS, no
«Espaço público» inserido na rubrica «Notícias», o LP “dizia”.
«NA SEQUÊNCIA do ponto 1 da semana passada, naturalmente destinado
a levantar polémica, eis uma carta de F. PERLICO, excessivamente longa, mas que
tentaremos reproduzir, nos seus pontos fundamentais».
Que me perdoem os dois “polémicos”, mas não ocuparei, por agora,
espaço com essas divergências, sempre perniciosas para o “ambiente” onde se
instalam.
É
minha ideia, todavia, criar no AHPPP, departamentos destinados a POLÉMICAS,
PLÁGIOS, PROBLEMAS PROBLEMÁTICOS, e outros “INSÓLITOS” que possam suscitar
interesse.
Jartur
TORNEIO DE PREPARAÇÃO
Solução da prova n.º 4
O ROUBO DA TRÍADE
Apresentada
por: DIC ROLAND (Retaxo – Castelo Branco)
Publicado na
secção POLICIÁRIO em: 13.Dezembro.1992
A tríade foi,
de facto, roubada pelos três americanos, cada um dos quais seria portador de
uma das peças do valioso conjunto.
Os elementos
fornecidos, pelo telefone, ao detective Cecílio, e bem assim o diálogo deste
mesmo detective com os três suspeitos, no aeroporto de Acra, parecem conduzir a
tal conclusão. De facto:
a ) – Começa
por ser altamente suspeito que três americanos, supostamente desconhecidos uns
dos outros, tenham viajado no mesmo avião e com o mesmo destino (Acra), logo a
seguir ao roubo;
b ) – O
passado criminoso dos três viajantes caracteriza-se por um conjunto de
modalidades de actuação que, no caso vertente, se conjugam e se completam no
sentido do êxito da operação de Bangkok; os explosivos de baixa densidade
(Mahoney) teriam servido para forçar a abertura do cofre; o sistema de alarme
(Carlsson) terá sido previamente avariado; e a entrada na área citadina
interdita a estrangeiros teria sido conseguida graças a subornos e tráfico de
influências (Travis).
c ) – Ao
corrigir o detective, quando este aludiu ao Siddharta iluminado, o suspeito
Mahoney revelou que havia estado na loja de antiguidades, em cujo tecto estava
pendurada uma imagem de Siddharta Jejuante, em zona interdita a estrangeiros.
d ) – O
suspeito Travis, utilizando a mão esquerda para escrever, poderia ser a mesma
pessoa que utilizou o canivete encontrado junto do cofre arrombado e em cujo
cabo (do lado direito) havia sinais de ser habitualmente manejado por um
esquerdino.
e ) – O
argumento do suspeito Carlsson para explicar a sua alegada ignorância a
respeito do roubo de Bangkok, é claramente falso; tendo em conta a diferença de
longitude entre os pontos de partida e de chegada (cerca de 90 graus) e
considerando que a viagem demorou treze horas, no sentido Leste-Oeste, o avião
não podia ter partido às três horas da madrugada, mas sim por volta das nove da
manhã – isto é, depois de perpetrado o roubo; a diferença horária é de menos
sete horas (sete fusos horários para Ocidente), o que explica que, tendo o
avião chegado às 16h00 de Acra (ou seja 23h00 de Bangkok), a sua partida só
poderia ter sido às dez horas locais e não às três da madrugada!
Cid
Roland
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