Continuamos hoje um retrato
necessariamente breve sobre a Literatura Policial, sob uma perspectiva pessoal,
tendo a preocupação de tentar focar os autores, personagens e obras que tenham
contribuído para uma evolução do próprio Policial.
Quando olhamos para os
clássicos, para o modo como organizaram os seus romances e desenvolveram as
tramas que “agarram” leitores de todas as épocas e de todos os pontos do mundo,
ficamos com a noção perfeita do “marketing” que está subjacente à forma (mais
do que ao conteúdo) como é feita essa construção.
Evidentemente que o Policial
actual é completamente diferente, fez o acompanhamento dos tempos, fez o seu
trajecto para se adequar às novas “regras” que os leitores estabelecem para
seguirem os casos relatados. Hoje em dia, quem teria paciência para ler um
romance policial longo, descritivo, maçudo, se o tempo disponível para a
leitura é o de uma viagem de metro ou de autocarro?
Falamos, como é óbvio, de
leitores comuns, não muito preocupados com as características técnicas dos casos
descritos, mas mais com as consequências da decifração de cada caso.
Esta situação levava-nos a uma
discussão sobre os modos de encarar e ler o Policial, que não cabe aqui e
agora, mas a que voltaremos quando tal se propiciar.
Entretanto, prosseguimos a
nossa resenha histórica:
Literatura
Policial – Parte II
Nos anos 20 do século passado
são as mulheres que mais se distinguem, com Agatha Christie e Dorothy Sayers
que nos apresenta Lord Peter Wimsey.
Edgar Wallace cria o pequenito
e perspicaz Mr. Reeder; Margery Alling oferece-nos Albert Campion; Ellery Queen
um detective “caixa de óculos” com o mesmo nome; Dashiell Hammett um modelo de
detective particular à sua semelhança, Sam Spade; o americano John Dickson Carr
– também Carter Dickson -, especialista de enigmas tipo “quarto fechado” que
trata como ninguém, traz-nos o Dr. Gideon Fell; Simenon assume a sua revolta
contra os detectives por conta própria e faz nascer o Inspector Maigret, mais
tarde Comissário; Rex Stout avança com o oposto de Maigret, um tipo gordíssimo
que nunca sai de casa, Nero Wolfe, que conta para tudo com o seu braço direito
Archie Goodwin; na América, Erle Stanley Garner cria Perry Mason, um advogado
de sucesso.
Os anos 30 são atravessados
por todos estes heróis e autores, com altos e baixos. Finalmente pode dizer-se
que o romance policial é já tão americano como europeu.
Nos anos 40 assiste-se ao
aparecimento de antologias, uma inglesa, a “Line Up” e uma americana, a
primeira coordenada por Ellery Queen, que reune, de uma só vez, Hammett,
Chandler e Ellery.
Estes terão sido os anos de
ouro do romance policial, tal o número e qualidade de autores e personagens,
que verdadeiramente desenvolveram a sua actividade ao longo de décadas,
renovando sempre as suas propostas e actualizando processos. Tal longevidade,
ao invés de criar saturação, produziu um efeito contrário, seduzindo legiões de
novos leitores. O velho romance sem sentido, aventureiro e sensacional, era
agora respeitado. Cada vez mais catedráticos e homens de letras faziam
incursões no mundo do romance policial.
Os novos rumos conduzem-nos a
uma indefinição sobre o que poderá vir a ser o Romance Policial do futuro.
O processo criativo que
aconteceu nos anos de ouro, ainda não deixou de estender os seus tentáculos e
ninguém hoje consegue ignorar Sherlock, Poirot, Ellery ou Maigret, que
continuam omnipresentes e apresentados como modelo, apesar das vetustas
idades. Novos modelos de violência
protagonizados por Mike Hammer de Mickey Spilane ou Lew Archer de Ross
Macdonald, ao bom estilo de “olho por olho...” não parecem trilhar o caminho do
futuro.
Resta-nos como verdadeiro
bálsamo para o espírito, a magnífica obra policial global de Manuel Vásquez
Montalbán, escritor catalão multifacetado que é já um modelo da nova Literatura
Policial.
Por cá, o Policial segue as
tendências, a alguma distância, claro. Colecções como a Vampiro, Xis, Romano
Torres e outras, traziam tudo o que de melhor se publicava no mundo, criando em
muitos leitores o desejo de escreverem os seus romances. O policial português é
rico naquilo que se conhece, já que muitos autores foram obrigados a optar por
pseudónimos para poderem publicar as suas obras. Alguns são hoje conhecidos,
outros, possivelmente nunca o serão. Um exemplo bem flagrante é o de Mário
Domingues, historiador, jornalista, editor e tradutor, que usou qualquer coisa
como cerca de 150 pseudónimos, a maioria dos quais desconhecidos hoje em dia, o
que o transformou no português que mais romances escreveu e editou!
Aquele que é considerado o pai
do romance policial português é Francisco Leite Barros, nascido em Lisboa no
ano de 1841 e falecido em 1886. A coincidência de ter nascido no mesmo ano em
que Pöe publicava a primeira novela policial, parece ter influenciado este
autor, que escreveu “O Incendiário da Patriarcal”, “O Crime de Mata Lobos”, “O
Crime do Corregedor” e “As Aventuras do Homem Pardo”.
Nome fundamental do policial
português é o de António Andrade Albuquerque, que assina as suas obras com o
pseudónimo de Dick Haskins e que é o autor português mais editado no
estrangeiro, com obras traduzidas em dezenas de países e passadas para o
cinema.
Também Reinaldo Ferreira
merece destaque com os pseudónimos Repórter X e Repórter Kiá. Com uma obra
extensa, deixou marcas no policial português, nas décadas de 20 e 30, até ao
seu falecimento em 1935.
Roussado Pinto é outro autor
importante, não só pela extensa lista de cerca de 75 pseudónimos que usou até à
sua morte, mas também pelo modo como organizou antologias policiais de boa
qualidade. Ross Pynn é o seu pseudónimo mais conhecido.
(CONTINUA)
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