sexta-feira, 14 de setembro de 2012

JARTURICE OU... JARTURADA - II



                  

 Publicado na secção POLICIÁRIO em: 13.Setembro.1992
…E o policiário aqui tão perto!…                                               

Um torneio
Na página POLICIÁRIO, que o PÚBLICO publicou «hoje» - HÁ VINTE ANOS ATRÁS – para além do problema policial que mais adiante reproduzimos (antecipando, também, a solução que viria a ser divulgada cinco semanas depois), em caixa com o título: … E o policiário aqui tão perto!... anunciavam-se as iniciativas projectadas para o futuro imediato, como sejam: a começar já em Outubro, o TORNEIO PREPARAÇÃO PÚBLICO POLICIÁRIOque será composto por seis problemas e contará com valiosos prémios.
O calendário de publicação, ocupará todo o que resta do ano de 1992.
E em 1993, se tudo correr como pensamos – assim se expressava Luís Pessoa – iremos ter novidades sensacionais: a começar por um SUPERTORNEIO de fazer crescer água na boca.
Incentivava-se a realização de CONVÍVIOS em vários pontos do país, e a criação de TERTÚLIAS, entre grupos de leitores e concorrentes.

Vinha anunciada, para o próximo número, a publicação do regulamento da competição e do modo de funcionamento do TORNEIO PREPARAÇÃO PÚBLICO POLICIÁRIO.

Um jogo
Sugeria-se aos leitores dos vários distritos de Portugal, que enviassem a descrição dum pequeno caso policiário, ali localizado, que poderia ir desde o “roubo de um rebuçado no mercado da esquina”, até ao “assassínio do chefe de estado de qualquer pais imaginário”, mas decorrendo sempre no ambiente do distrito que for indicado.
Este jogo será designado. O CRIME NOS DISTRITOS DE PORTUGAL.
Haverá prémios e os trabalhos serão publicados, sempre que o espaço o permitir.
Luís Pessoa


                            NOTA:
                            Como sabem os meus amigos, esta recolha dos problemas e respectivas soluções em “ficheiros”, destina-se ao nosso ARQUIVO HISTÓRICO DA PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PORTUGUESA. Mas, sempre que tenhamos material disponível, faremos todo o gosto em compartilhá-lo, com os “sherlocks” que mostrem algum interesse em recebê-lo. 
                         Jartur   

Problema # 51
QUEM MENTE MAIS?
Original de: DR. ACÉFALO (V.N. de Gaia)                                                                                         
Publicado na secção POLICIÁRIO em: 13.Setembro.1992

Os berros do inspector Duplicado fizeram o inspector Álibi dar um salto na cadeira que amparara o seu corpo caído no sono. Estes gritos provinham do gabinete do inspector Duplicado que os proferia ao telefone. Mas, passado o primeiro sobressalto, o inspector Álibi deixou-se ficar impassível. Havia duas razões para esta tomada de atitude: primeira, dado o tom de voz do inspector Duplicado, quem estivesse dentro de um raio de alguns quilómetros já devia estar ao corrente do assunto; segunda, sabia que Duplicado acabaria por vir ter com ele ao seu gabinete, evitando assim levantar-se da cadeira.
Conhecia o inspector Duplicado há muitos anos e nunca o (ou) vira assim por causa de um homicídio. A sua idade e o cargo que ocupavam faziam dele um indivíduo fleumático, metódico e apegado a pró-formas e decretos-leis. Mais tarde, a caminho do local do crime, ficou a saber a razão de todo este alarido: a vítima fora um seu amigo de longa data.
Para alívio dos ouvidos de Álibi, chegaram finalmente a uma magnífica casa, em cuja fachada pontificava uma escadaria de acesso à porta principal, no 1.º andar. Passado o “hall” de entrada, entraram num corredor, onde depararam com sete pessoas emudecidas que aí deambulavam, olhos fitos no soalho.
O primeiro que se prontificou a falar era o mordomo Morais. Apesar do à-vontade que pretendia transmitir, era visivelmente a pessoa mais apreensiva e ansiosa. Parecia querer arranjar todos os pretextos para conversar sobre coisas banais, mas a sua fala sincopada e a respiração descompassada não enganavam ninguém.
Antes de avançarem para o local do crime, os inspectores Duplicado e Álibi recolheram o depoimento daqueles que se encontravam na casa.
 Nora da vítima: “Estive toda a tarde com a minha cunhada e o meu filho na sala do rés-do-chão que se atinge por meio desta porta do corredor. Eles mesmo podem confirmá-lo.”
Ao lado dessa porta ficava a que dava para a sala do crime; do lado oposto ficava a cozinha e a sala de jantar, e ao fundo a porta das traseiras.
Mordomo: “Após ter levantado a mesa estive toda a tarde a preparar a sala para o jantar, até às 17h30, altura em que fui ao escritório perguntar ao senhor pela merenda. Após ter aberto a porta, deparei com um espectáculo horrível: o meu patrão com uma faca cravada no pescoço. Logo a seguir, ouvi o carro dos filhos a chegar, e fui recebê-los ao “hall”, com tristes notícias para dar!”
 “Não notou nenhum pormenor relevante?”, perguntaram os inspectores.
“Não!”, respondeu o mordomo, após engolir em seco…
O filho mais velho da vítima: “Após o almoço fui com o meu irmão ao centro equestre. Quando cheguei, fui logo ter com o meu pai ao escritório. Como desde pequenos fomos sempre habituados, bati à porta suavemente. Como ninguém respondeu, empurrei a porta a medo e vi, por uma nesga, o mordomo escondendo-se atrás das cortinas e um bocado de alcatifa empapado em sangue. Corri para o “hall” onde, com o meu irmão, esperei por esse assassino, na esperança de que não me tivesse visto.”
  Cozinheira: “Passei a tarde toda na cozinha, excepto quando fui ao quintal, onde estive uma meia hora…”
Foi então que o Duplicado avançou impetuosamente para o escritório, abrindo a porta com tanta força que por pouco não colhia com ela os presentes no corredor.
Quando a cozinheira viu o cadáver, ficou em pânico, tentando, em seguida, disfarçá-lo.
Nesse preciso momento entrou o neto da vítima, ainda criança que exclamou:
“ Mas a faca tem um cabo igual à que a Josefina, a cozinheira usa na cozinha…
“Foi ele… Foi ele! Agora me lembro que ele foi à cozinha a meio da tarde! – exclamou a cozinheira, apontando para o mordomo.
“Porca mentirosa!” – replicou o mordomo, lançando-se agressivamente sobre ela. “Não voltei à cozinha depois de ter levantado a mesa…
“E não reconheceu a faca?” – inquiriu Álibi.
”Ah! Pois… Agora me lembro, mas na altura não me chamou a atenção.”
O inspector Álibi sorriu e interrogou-se sobre o que se passaria na cabeça do mordomo e de Josefina, a cozinheira…
E posto o caso da dupla de inspectores saída da pena do Dr. Acéfalo, apenas nos resta lançar o desafio que o seu autor não propôs:

                         
- Quem matou?
- Justifique a sua afirmação, procurando não só incriminar o culpado, mas também, sempre que possível, eliminar as suspeitas que houver sobre os restantes. Aí sim, haverá uma solução. 
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Publicada na secção POLICIÁRIO em: 25.Outubro.1992
Solução do Problema # 51
QUEM MENTE MAIS?                                                                                
Apresentada por: Tommy & Toppence (Coimbra)

Quem matou?
O filho mais velho!
De facto, o caso encontra-se recheado de falsos testemunhos com o intuito de “sacudir a água do capote”. Dos sete suspeitos, três deles parecem-nos logo afastados do crime – as noras e o neto. As declarações de uma das noras imediatamente descartam de responsabilidades estas três personagens.
Relativamente aos remanescentes quatro suspeitos, nada nos leva ao comprometimento do filho mais novo, que fez papel de espectador desatento (ou eventualmente de cúmplice, embora não existam dados para o confirmar). O problema resume-se, claramente, aos restantes três suspeitos: o filho mais velho, o mordomo e a cozinheira.
Quem mente mais (e pior) é o filho mais velho, senão vejamos: “Como ninguém respondeu, empurrei a porta…”, o que corresponde a um erro demasiado infantil para quem deveria saber que a porta não podia ser empurrada, mas sim puxada (“foi então que o Duplicado avançou impetuosamente para o escritório, abrindo a porta com tanta força que por pouco não colhia com ela os presentes no corredor.”).
Mas há mais! De facto, ficámos a saber que este “artista” reconhecia o sangue do pai e, mais do que isso, pressentia a sua morte. Como se tal não bastasse, a atitude de fugir para o “hall” e esperar pelo mordomo é o melhor que se poderia imaginar. É óbvio que nada disto faz qualquer sentido, pelo que o depoimento do mordomo apenas pode ser interpretado como destinando-se a encobrir o verdadeiro assassino.
Na realidade, o mordomo tentou por todos os meios “defender” o “menino”, tanto mais que nem sequer referiu que a faca lhe tinha chamado a atenção por ser “igual à da Josefina”. E não o fez porque lhe pareceu preferível que fosse alguém, que não ele, a denunciar essa situação, desviando assim as suspeitas para cima da cozinheira.
Quanto à cozinheira, é óbvio que ela mente quando insinua que o mordomo fora buscar a faca à cozinha a meio da tarde. É claro que quem levanta a mesa e tem livre acesso a todas as divisões e a todas as horas, se quisesse uma faca, não teria necessidade de se denunciar daquela maneira, a não ser que fosse estúpido.
Finalmente, apenas um pormenor corrói os nossos espíritos, e acerca do qual eu (Tommy) e a minha parceira (Toppence) temos opiniões ligeiramente diferentes. Segundo o Tommy (eu próprio), não parece lógico que o mordomo se tenha defendido tão asperamente da acusação feita pela cozinheira, tendo ficado impassível perante acusação idêntica formulada pelo filho mais velho. Por outro lado, a Toppence acha isso relativamente natural, entendendo que o mordomo quereria a “ roda a força” ilibar o “menino”, mas não suportaria o ultraje que seria a acusação feita pela “reles” da cozinheira. São opiniões.
Parece-nos, no entanto, que independentemente da solução para este pequeno pormenor, o que é lógico é que quando A pretende defender B, o faça sem grande prejuízo próprio, originando um álibi e/ou uma acusação sobre C. A situação de A tentar ilibar B, mas vir depois a ser acusado por B, adicionado ao facto de C acusar A e A imediatamente reagir, parece-nos uma cena com demasiada carga masoquista.
Com os melhores cumprimentos;
                                                       TOMMY & TOPPENCE
                                        (Amílcar Falcão – Paula Rocha)       

1 comentário:

Anónimo disse...

Estive lendo este problema da autoria do Dr. Acéfalo que achei bastante bom.
De então para cá não depaarei com nenhum outro problema produzido por este autor o ue é umma pena.
Creio ue ele se retirou das lides pois nunca mais vi este pseudónimo. Talvez já fosse tempo de ele voltar e nos deliciar com a sua prosa para não serem sempre os mesmos a escrever os problemas que tão necessários se tornam para a secção.
Um abraço a todos em esppecial ao Dr. Acéfalo do

Rip kirby