CONTO
DE NATAL
Respeitando
uma tradição de alguns anos, publicamos um conto de Natal, que não retracta na
sua totalidade o chamado espírito natalício, em que tudo são rosas sem
espinhos. Nada na vida é apenas a cores bonitas e brilhantes, muitos episódios
são bem contrastados a preto e branco, com violência gratuita e muita
indiferença. Desses episódios também é feito o Natal.
Para
todos os nossos leitores e “detectives” desejamos um Bom Natal, na companhia de
quem mais querem.
UMA
PISTOLA PELO NATAL
Conto
de Luís Pessoa
O
Joãozito entreabriu a porta, espreitando o corredor tenuemente iluminado. Ao
fundo, as luzes tremeluzentes do pinheiro de Natal eram um chamariz para os
seus olhos arregalados. Percorreu os metros que o separavam dos presentes que
pediu ao Pai Natal…
Espreitou,
receoso de que lhe acontecesse o que os pais advertiam: “Se vieres durante a
noite, o Pai Natal não aparece”.
Lá
estava a bicicleta que pediu e a pistola de imitação que tanto desejava e mais
uma montanha de outros embrulhos…
Avançou,
deslumbrado, nem reparando que alguém o fitava na sombra. Ajoelhou junto da
árvore e só então viu que um pouco adiante, estava um velhote sentado no chão, tão
surpreendido quanto ele.
-
Pai Natal?
-
Hem? Não faças barulho, não acordes os adultos…
-
És mesmo o Pai Natal? Não estás de vermelho nem tens as renas…
-
Hum… Não sou!
-
És o meu avô! Já sei, és o meu avô! Nunca o vi, mas pedi muito que viesses… O
meu pai disse-me que andavas por muito longe, em viagem, mas ouvi uma conversa
em que diziam que estavas preso, que tinhas feito coisas feias.
-
Chamas-te João, não é?
-
Tu sabes… És mesmo o meu avô Carlos!
-
Olha, João, não sou o teu avô e estou aqui porque precisava que me emprestasses
um ou dois presentes para poder levar para os meus netos. Sabes, sou pobre e
quando perguntei ao Pai Natal quem era o menino mais bonito, feliz e de bom
coração a quem podia pedir emprestados alguns presentes, ele disse-me para vir
falar contigo, que és muito bem comportado e amigo dos meninos que não têm
brinquedos…
-
Tu viste o Pai Natal, falaste com ele?
-
Sim, é verdade e ele disse-me que só não vinha falar contigo porque não pode
falar aos meninos ou ficam sem prendas…
-
Onde estão os teus netos?
-
Estão em casa, à espera que eu lhes leve os presentes…
-
Mas o Pai Natal não vai lá?
-
Sabes, é muito longe, ele não tem tempo para todos os meninos. Alguns ficam sem
prendas e desta vez são eles. Por isso te venho pedir…
-
Então leva alguns, mas deixa a bicicleta, porque é muito pesada e podes
aleijar-te nas escadas… Olha, leva esta pistola. Gosto muito dela, mas tenho
outras. O teu neto vai gostar…
-
Joãozito, as pistolas fazem mal às pessoas, as pistolas matam e eu não quero
que o meu neto se habitue a elas. Sabes, eu fiz uma grande asneira, como o teu
avô e tive de pagar com muitos anos de cadeia, sabes?
-
Mas é de brincar, não faz mal a ninguém… Toma, leva!
-
Tu gostas muito dela, eu levo outras coisas de que não gostes tanto. Sabes,
tenho de me ir já embora ou não vou conseguir chegar a tempo de pôr os
presentes nos sapatinhos.
-
Fica mais um bocadinho, lá fora faz muito frio e aqui estás quentinho.
-
Não posso, João, tenho de ir.
-
Não te importas que te chame avô? O meu não vai aparecer e gosto muito de ti.
Ficas a ser o meu avô, queres?
-
Claro que sim, João dá-me um abraço! Um dia destes virei visitar-te, está bem?
-
Sim, avô Carlos!
Ficaram
assim, abraçados, durante alguns momentos, no silêncio da noite, até o velhote
começar a erguer-se, com lágrimas nos olhos…
-
Estás a chorar? Estás triste?
-
Não, estou é muito feliz, João!
-
Espera, espera, leva a pistola, também já não a quero. Leva-a e se não quiseres
dá-la aos teus netos, deita-a fora. Toma!
Estendeu-lhe
a pistola, que ele pegou pela coronha, com mão trémula pela emoção do encontro
com esta criança que estava a mudar a sua vida.
Foi
então que a porta da sala se abriu com violência e na noite soaram vários tiros
desferidos contra o velhote, que viu o chão fugir-lhe e rolou pesadamente, já
sem vida, largando a pistola…
-
Avô! Avô! – Ouviu-se no silêncio que se seguiu, perante o espanto dos
atiradores policiais…
POLICIÁRIO NO PÚBLICO CHEGA AO FIM
Por
decisão do jornal, comunicada ao coordenador deste espaço pelo editor do P2,
por via telefónica, num contacto de breves minutos, o Policiário deixa, a
partir do próximo ano, de fazer parte das opções de passatempos que o jornal
oferece há precisamente 26 anos e 6 meses.
Tendo
sido a aposta em produtos inovadores e diferenciadores, um dos aspectos em que o
PÚBLICO mais se destacou da restante imprensa, apostando em nichos dirigidos a
públicos específicos e abertos, constatamos que a aposta mudou, culminando com
o encerramento do Policiário.
Desta
forma, resta-nos apenas mais uma edição, no próximo dia 30 de Dezembro, em que
procederemos ao encerramento deste longo e vitorioso ciclo, iniciado em 1 de
Junho de 1992 com cerca de 3 centenas de participantes e que agora termina no
máximo de audiência, com quase 3 milhares de “detectives” activos, ou seja, que
respondem efectivamente aos desafios, semana a semana e muitos mais milhares de
leitores.
2 comentários:
NÃO HÁ MESMO COMENTÁRIOS!
DECO
Refiro-me à parte da extinção da secção, não ao conto, claro.
Deco
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