domingo, 23 de dezembro de 2018

POLICIÁRIO 1429




CONTO DE NATAL

Respeitando uma tradição de alguns anos, publicamos um conto de Natal, que não retracta na sua totalidade o chamado espírito natalício, em que tudo são rosas sem espinhos. Nada na vida é apenas a cores bonitas e brilhantes, muitos episódios são bem contrastados a preto e branco, com violência gratuita e muita indiferença. Desses episódios também é feito o Natal.
Para todos os nossos leitores e “detectives” desejamos um Bom Natal, na companhia de quem mais querem. 

UMA PISTOLA PELO NATAL
Conto de Luís Pessoa

O Joãozito entreabriu a porta, espreitando o corredor tenuemente iluminado. Ao fundo, as luzes tremeluzentes do pinheiro de Natal eram um chamariz para os seus olhos arregalados. Percorreu os metros que o separavam dos presentes que pediu ao Pai Natal…
Espreitou, receoso de que lhe acontecesse o que os pais advertiam: “Se vieres durante a noite, o Pai Natal não aparece”.
Lá estava a bicicleta que pediu e a pistola de imitação que tanto desejava e mais uma montanha de outros embrulhos…
Avançou, deslumbrado, nem reparando que alguém o fitava na sombra. Ajoelhou junto da árvore e só então viu que um pouco adiante, estava um velhote sentado no chão, tão surpreendido quanto ele.
- Pai Natal?
- Hem? Não faças barulho, não acordes os adultos…
- És mesmo o Pai Natal? Não estás de vermelho nem tens as renas…
- Hum… Não sou!
- És o meu avô! Já sei, és o meu avô! Nunca o vi, mas pedi muito que viesses… O meu pai disse-me que andavas por muito longe, em viagem, mas ouvi uma conversa em que diziam que estavas preso, que tinhas feito coisas feias.
- Chamas-te João, não é?
- Tu sabes… És mesmo o meu avô Carlos!
- Olha, João, não sou o teu avô e estou aqui porque precisava que me emprestasses um ou dois presentes para poder levar para os meus netos. Sabes, sou pobre e quando perguntei ao Pai Natal quem era o menino mais bonito, feliz e de bom coração a quem podia pedir emprestados alguns presentes, ele disse-me para vir falar contigo, que és muito bem comportado e amigo dos meninos que não têm brinquedos…
- Tu viste o Pai Natal, falaste com ele?
- Sim, é verdade e ele disse-me que só não vinha falar contigo porque não pode falar aos meninos ou ficam sem prendas…
- Onde estão os teus netos?
- Estão em casa, à espera que eu lhes leve os presentes…
- Mas o Pai Natal não vai lá?
- Sabes, é muito longe, ele não tem tempo para todos os meninos. Alguns ficam sem prendas e desta vez são eles. Por isso te venho pedir…
- Então leva alguns, mas deixa a bicicleta, porque é muito pesada e podes aleijar-te nas escadas… Olha, leva esta pistola. Gosto muito dela, mas tenho outras. O teu neto vai gostar…
- Joãozito, as pistolas fazem mal às pessoas, as pistolas matam e eu não quero que o meu neto se habitue a elas. Sabes, eu fiz uma grande asneira, como o teu avô e tive de pagar com muitos anos de cadeia, sabes?
- Mas é de brincar, não faz mal a ninguém… Toma, leva!
- Tu gostas muito dela, eu levo outras coisas de que não gostes tanto. Sabes, tenho de me ir já embora ou não vou conseguir chegar a tempo de pôr os presentes nos sapatinhos.
- Fica mais um bocadinho, lá fora faz muito frio e aqui estás quentinho.
- Não posso, João, tenho de ir.
- Não te importas que te chame avô? O meu não vai aparecer e gosto muito de ti. Ficas a ser o meu avô, queres?
- Claro que sim, João dá-me um abraço! Um dia destes virei visitar-te, está bem?
- Sim, avô Carlos!
Ficaram assim, abraçados, durante alguns momentos, no silêncio da noite, até o velhote começar a erguer-se, com lágrimas nos olhos…
- Estás a chorar? Estás triste?
- Não, estou é muito feliz, João!
- Espera, espera, leva a pistola, também já não a quero. Leva-a e se não quiseres dá-la aos teus netos, deita-a fora. Toma!
Estendeu-lhe a pistola, que ele pegou pela coronha, com mão trémula pela emoção do encontro com esta criança que estava a mudar a sua vida.
Foi então que a porta da sala se abriu com violência e na noite soaram vários tiros desferidos contra o velhote, que viu o chão fugir-lhe e rolou pesadamente, já sem vida, largando a pistola…
- Avô! Avô! – Ouviu-se no silêncio que se seguiu, perante o espanto dos atiradores policiais…

POLICIÁRIO NO PÚBLICO CHEGA AO FIM

Por decisão do jornal, comunicada ao coordenador deste espaço pelo editor do P2, por via telefónica, num contacto de breves minutos, o Policiário deixa, a partir do próximo ano, de fazer parte das opções de passatempos que o jornal oferece há precisamente 26 anos e 6 meses.
Tendo sido a aposta em produtos inovadores e diferenciadores, um dos aspectos em que o PÚBLICO mais se destacou da restante imprensa, apostando em nichos dirigidos a públicos específicos e abertos, constatamos que a aposta mudou, culminando com o encerramento do Policiário.
Desta forma, resta-nos apenas mais uma edição, no próximo dia 30 de Dezembro, em que procederemos ao encerramento deste longo e vitorioso ciclo, iniciado em 1 de Junho de 1992 com cerca de 3 centenas de participantes e que agora termina no máximo de audiência, com quase 3 milhares de “detectives” activos, ou seja, que respondem efectivamente aos desafios, semana a semana e muitos mais milhares de leitores.

 

2 comentários:

Anónimo disse...

NÃO HÁ MESMO COMENTÁRIOS!
DECO

Anónimo disse...

Refiro-me à parte da extinção da secção, não ao conto, claro.
Deco