segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A MORTE DE LECY ONARA - 1

A morte de Lecy ainda mexe, com assuntos de interesse para o nosso Mundo Policiário e por isso não resistimos a publicar uma troca de argumentos excelente, entre o autor do desafio e o Zé.

Vamos assistir, com muita atenção, a boas argumentações, para que todos também possamos dar as nossas "dicas", se assim entendermos.
Perante a solução que foi aqui publicada e algumas críticas, o autor entendeu fazer o seguinte comentário:

Caro confrade Luís Pessoa,


Por razões que não vêm ao caso, tenho andado afastado do meio, há já algum tempo, pelo que só agora me apercebi da polémica levantada a propósito do meu problema, publicado na edição 993 do Policiário. Para mim, trata-se de uma questão perfeitamente inóqua, mas como uma "carta deve ter sempre resposta", não quero eximir-me a dar a minha opinião sobre o assunto.
Não obstante, gostaria de deixar claro que:
-não tenho qualquer discordância sobre as regras do nosso passatempo Policiário;
-para mim, é claro e pacífico que, tendo sido aprovados e publicados, os problemas passaram à guarda da Secção e do seu Orientador, que deles dispõe como entender, avaliando e classificando as respostas recebidas de acordo com os critérios que entender mais justos. É assim com outros trabalhos noutros jornais e revistas e tem sido assim no Policiário desde a sua fundação, e já lá vamos com um Milénio de satisfação;
-não tenho qualquer interesse nem tomo partido em querelas de classificações, pontuações ou que tais ;
- sabia que a forma que usámos na solução do problema, por ser diferente do que é habitual, corria o risco de levantar perplexidades e rejeições, mas como, contrariamente à solução dos concorrentes, que é um assunto da exclusiva competência do Orientador, a solução do autor apenas a este compromete e não tem qualquer influência na avaliação dos concorrentes, decidi correr esse risco;
-por isso, assumo que a nossa resposta tem duas componentes. Uma nitidamente ficcionada e especulativa, apoiada no texto, mas desenvolvida a partir dele. Outra analítica e dedutiva, utilizando os indícios do texto para propor uma solução fundamentada para resolução do problema, à qual demos um cunho tão flexível quanto o problema permitiu, mas sem cedências de rigor;
-do meu ponto de vista, este problema tem apenas uma solução possível e esta não sofre qualquer prejuízo resultante da forma escolhida para a apresentar, pois não engloba nem depende de elementos contidos na sua componente ficcionada;
-não me custa a aceitar que essa parte seja considerada supérflua pelos confrades, embora aparentemente não o tenha sido pelo Orientador da Secção;
- raramente fico satisfeito com os trabalhos que produzo e aceito sempre de bom grado as críticas construtivas que lhes são feitas. Por isso, fico sempre grato a quem contribui para me aperfeiçoar, não havendo qualquer razão para que nesta actividade lúdica isso também não aconteça;
-o blog do Público não tem o espaço necessário nem o momento é o mais apropriado para se discutir a prova nº 8 de"Cardílio & Avita", por estar a decorrer ainda o período para conclusão da prova nº 10. Por isso, fica por agora disponível no blog http://haga-rai.page.tl/ , ainda em construção;
-apesar disso, gostaria de focar aqui alguns pontos que vieram a público e que, do meu ponto de vista, merecem uma breve nota, sem me dirigir directamente a qualquer confrade em especial;
-alguns confrades (espero que não tenham sido todos) terão achado que a nossa solução apresentada nada tinha que ver com o problema, esbanjando-se o espaço com pormenores que o enunciado não permitia abordar. Bom, esta é uma interpretação a que os autores estão sempre sujeitos, quando se expõem publicamente, mas que não partilho e não me surpreende, pois numa população tão vasta de leitores como a nossa, haverá sempre opiniões divergentes sobre os mais variados assuntos. As opiniões diferentes têm a sua utilidade, mas na resolução dos problemas policiários nem sempre ajudam, pois o que mais conta são mesmo os fundamentos.
Vejamos, então, aquilo que considero fundamental, no caso do problema nº 8.
A chave para a sua solução assenta essencialmente na interpretação dos dados fornecidos acerca da mosca e de Lecy, pois só com eles é possível estabeler uma hora aproximada a que ocorreu a morte da vítima e, assim, poder-se ir descartando os possíveis agentes que possam ter tido alguma coisa que ver com ela. O resto são lugares comuns, esteriotipos, elementos de "diversão", apelos a preconceitos e outros, a que o texto não dá sequência e não concede valor ou fundamento para solução do problema.
Como se afirma na resposta e é fácil de descobrir, são necessárias cerca de 92h após a eclosão dos ovos do insecto referido no texto para atingir a 3º fase larvar ou 3º ínstar deste animal. Como este desenvolvimento não ocorre em submersão, após a morte de Lecy, o seu cadáver teve que estar necessariamente fora de água durante 92h, antes de ser lançado ao rio, para que o referido estado larvar pudesse ter sido atingido.
Se admitirmos que, no limite, o cadáver teria acabado de ser atirado à água momentos antes de ser encontrado, teremos que concluir que terá sido recolhido um pouco antes das 24h do dia 18 de Março. Tendo em conta as 92 horas necessárias para ocorrer o 3º ínstar, isso levar-nos-ia a admitir que a postura teria ocorrido cerca das 04h do dia 15 de Março. No entanto, como a mosca não deposita os ovos necessariamente logo após um corpo ser cadáver, a morte de Lecy poderia ter ocorrido mais cedo no dia 15, mas não mais tarde, ou num dos dias anteriores.
Até onde poderemos, então, antecipar fundamentadamente o dia e a hora a que terá ocorrido a morte de Lecy?
Comecemos por analisar os dados relevantes que o texto nos fornece para o efeito e que são claramente o facto de Lecy ter sido vista, na 6ª feira anterior (13 de Março), depois das aulas, no supermercado e a circunstância de ela ser professora de Latim naquela Escola Secundária.
Vejamos porquê. A Escola onde Lecy trabalhava tinha ensino diurno e ensino noturno. Como o texto nada esclarece sobre o horário de trabalho da professora, teremos de analisar vários cenários. Nesse sentido, poderemos considerar que "depois das aulas" se refere à Escola. Teríamos, então, de considerar que o fim das aulas coincidia com o fecho da Escola, ou seja, às 24h, a hora a que terminavam as aulas noturnas. No entanto, como os supermercados em Torres Novas (TN) não fechavam tão tarde, Lecy não poderia lá ser vista a esta hora tardia, por isso temos de abandonar esta hipótese.
Suponhamos, então,que o términus das aulas se refere às aulas diurnas. Como estas aulas terminavam às 17h, teríamos de concluir, neste caso, que Lecy teria ido ao supermercado depois das 17h, o que seria verosímil e colocaria Tó Trinete em "maus lençóis", porque nem o Musk nem o Namet estavam em Portugal nesse dia a essa hora (sobre o Namet é o texto que o afirma, referindo que no dia 13, de manhã, partiu para um fim-de-semana em Paris e sobre o Musk já lá iremos).
Efectivamente, não sabemos a que horas Lecy entrou e saiu do supermercado, mas como acabámos de ver não interessa analisar outras hipóteses em que ela pudesse ter ido ao supermercado depois das 17h. Por isso, vamos analisar outras hipóteses em ela pudesse ter ido mais cedo.
Neste caso, é fundamental pensar se a referência ao depois das aulas não poderá significar depois de Lecy ter terminado as suas aulas, que é o que vamos analisar em seguida.
Como o texto fala em aulas, isso quer dizer que Lecy teria tido, nesse dia, pelo menos duas. Dado que cada aula de Latim, seja o A ou o B, no Secundário, tem a duração de 90 minutos, o mais cedo que as suas aulas poderiam ter terminado, nesse dia, seria às 11,50h, tendo em conta os intervalos e o facto de, naquela Escola, as aulas começarem às 8,30h. Deste modo, Lecy poderia ter sido vista no supermercado algum tempo depois das 12h. Suponhamos que a passagem de Lecy pelo supermercado foi muito breve, digamos que foi uma entrada por saída. Mesmo neste caso, não parece razoável que após cumprir as últimas formalidades escolares e ter-se deslocado para o supermercado, tivesse saído deste antes das 12,30h e, portanto, que a sua morte tivesse ocorrido antes desta hora. Por isso, podemos estabelecer com alguma segurança que o mais cedo que a morte de Lecy poderá ter ocorrido terá sido às 12,30h do dia 13 de Março de 2009.
Quem estaria então em TN a esta hora que pudesse ser apontado como suspeito?
Pelo texto, poderemos dizer que Tó Trinete esteve em TN durante todo o período da estória. Já vimos anteriormente porque podemos afirmar que Namet não estava lá. E Musk? Bom, Musk dificilmente estaria, senão, vejamos.
Musk foi detido pela polícia em Paris quando, de regresso à sua Ilha, naquela 6ª feira, ao princípio da noite, se preparava para tomar o avião para o Dubai. Ora, o texto ao referir "naquela 6ª feira", e não fazendo referência a qualquer outra 6ª feira, só pode ser interpretado como aquela 6ª feira ter sido o dia 13 de Março de 2009. Ora, como, nesse dia, em Paris, a noite caiu cerca das 19,23h locais, teremos de concluir que Musk estaria a apanhar o avião das 19,20h, que foi o único que partiu de um aeroporto de Paris (Charles De Gaulle, terminal 2C) para o Dubai, naquele dia, ao princípio da noite.
Como terá ido Musk de Lisboa a Paris? Como o texto não o refere, teremos de deduzir. O mais rápido seria num voo de Lisboa-Paris. De Lisboa, não há ligação para o Dubai com escala em Paris e saída àquela hora. Por isso, a maneira que mais garantia a Musk obter a ligação, seria tomar o avião que saiu de Lisboa às 14,30h para chegar a Paris, ao terminal 2B do Charles De Gaulle, às 18,40h locais, permitindo-lhe, assim, cumprir as formalidades de desembarque, no terminal 2B, a tempo de cumprir as de embarque, no terminal 2C do Charles De Gaulle, e apanhar o referido voo das 19,20h.
Como terá ido Musk de TN para Lisboa? O mais rápido seria pela auto-estrada, em que gastaria cerca de hora e meia, o que significa que, se o crime tivesse ocorrido cerca 12,30h e partisse imediatamente, Musk estaria no aeroporto cerca das 14h. Ora, chegar ao aeroporto de Lisboa meia hora antes de embarque é uma boa tentativa para ficar em terra, pois dá pouco tempo para cumprir as formalidades de embarque. Além disso, não é verosímil que, no quadro descrito no texto, pudesse ter sido: "matar e toca a andar", "dar rapidamente destino ao cadáver" e "é ainda tão cedo, deixa-me ir já para Lisboa, se não vou perder o avião!". Por isso, não é nada plausível que Musk tenha partido de TN cerca do meio-dia e meia, o que nos leva a concluir que, nesta hipótese, quando Lecy foi morta, Musk já estaria pelo menos a caminho de Lisboa.
Assim e à guiza de resumo, poderemos concluir que, no limite, Lecy terá sido assassinada numa momento algures entre as 12,30h de 13 de Maio e as 4h do dia 15 de Março de 2009 e que, neste período, dos suspeitos, só Tó Trinete estava em TN, sem explicação para o facto de ter na sua garagem o carro de Lecy (com a mosca lá dentro) e de ter mentido na justificação que apresentou para isso.
Logo, nem suícídio nem acidente, apenas um crime se pode ver aqui. A quem não acreditar, posso garantir que todos os dados usados neste escrito têm origem em fontes credíveis, mas dá algum trabalho a encontrá-las.
Assim, se tramou o Tó Trinete e o resto é "conversa de vizinhas".
Sempre ao dispor,
O melhor para todos,
"Cardílio & Avita"
Évora, aos 18 de Outubro de 2010

1 comentário:

Anónimo disse...

Não posso considerar este escrito como um simples comentário.
O que o autor vem aqui fazer é rectificar a sua solução.
Diz ele que todos os dados apresentados são baseados em fontes fidedignas. Na minha opinião a página da Escola Secundária de Torres Novas na Internet, que certamente é uma fonte fidedigna, não consta que tenha sido ministrada a disciplina de Latim naquele ano lectivo.
Por outro lado estando expresso no texto qualquer motivo para o Musculoso ter sido detido em Paris deduz-se que isso aconteceu naquela sexta feira posterior à descoberta do corpo da professora.A sexta feira é referida de uma maneira muito ambígua pelo que não admira que sejamos levados para outro dia que não aquele que o autor vem agora dizer.
Estando as férias da Páscoa a aproximar-se e tendo os professores reuniões para a atribuição de notas não faz sentido que o professor de educação fisica se ausentasse numa Sexta feira mais cedo.
Não faz qualquer sentido que a professora, que seria uma senhora, se envolvesse em discussões com o amante do seu marido.
No que se refere ao desenvolvimento das larvas da mosca em questão existem diversas fontes que apontam tempos de desenvolvimento diferentes e nós não podemos pôr em causa a fidignidade dessas fontes. Pena que eu tenha apagado do computador os artigos que consultei.
No texto é referido que o Tó já por diversas vezes tinha pedido ao amante para que este deixasse a Esposa ao que o outro não acedia. Por seu lado o Musculoso já tinha ameaçado em público a professora caso esta não fizesse uma escolha entre ele próprio e "ele" que se entende seja o marido daquela.
Nestas condições nada mais natural que o Tó e o Professor se unissem.
Geralmente nos problemas policiários não são admitidas cumplicidades a não ser que estas estejam bem definidas. Ora a terefa de definir bem uma cumplicidade tanto cabe ao autor como ao solucionista.
Enfim uma solução nova que nada tem a ver com a solução oficial
Rip Kirby