A H P P P
ARQUIVO HISTÓRICO DA PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PORTUGUESA
Publicado na secção POLICIÁRIO em: 22.Agosto.1992
TÉCNICA POLICIÁRIA AO ALCANCE DE TODOS
Na semana passada demos algumas “dicas” e
recebemos respostas positivas, incentivando-nos a prosseguir.
Pois bem, cá vão mais alguns pormenores fáceis
e passíveis de serem utilizados na solução de casos e, consequentemente na
feitura de alguns problemas. Mas, se o fizerem, não esqueçam que os pormenores
técnicos em si não produzem um bom problema. É necessário que se lhes junte uma
boa “roupagem” e um bom caso, com dedução que conduza à tal solução técnica.
Inventem uma história onde haja mistério, necessidade de se deduzir algo e por
fim um bom pormenor técnico e terão, seguramente, um bom problema. Vamos
tentar? Por agora vamos falar de:
HOMICÍDIO, SUICÍDIO OU ACIDENTE?
Já na semana passada falámos da
importância para uma investigação de saber calcular e determinar todas as
condições em que ocorreu uma morte. Vamos ver:
Enforcamento: É a morte ocasionada pelo aperto de um laço no
pescoço, aperto esse feito pelo peso do próprio corpo. São duas as causas da
morte: primária e secundária. A primária é a falta de circulação sanguínea para
o cérebro; a secundária é a falta de passagem de ar para os pulmões.
Os sinais mais observados são:
- Sulco em volta do pescoço;
- Espuma na boca e nas narinas;
- Hemorragia nasal e auricular;
- Língua projectada para fora da boca;
- Existência de livores de hipóstase (a partir do
momento em que se quebra a unidade funcional do organismo há a tendência de
acompanhamento das leis da gravidade. Assim, o sangue é abandonado nas veias
pela ausência da força motriz do coração, tende a depositar-se nas partes mais
baixas do corpo, e forma umas manchas roxas a que se chamam os livores de hipóstase.
O tempo do seu estabelecimento vai de 4 a 12 horas).
- Ejaculação de esperma (excepto nos casos em que
houver fractura na coluna vertebral ao ser largado o corpo);
- Sinais de traumatismo sobretudo nas zonas do
pescoço;
- Coloração do corpo azulada ou mesmo lívida.
Os factores para determinação de homicídio ou
suicídio, já que o acidente é muito improvável, são:
A análise do cabo que serviu para o enforcamento. O
suicida nunca se preocupa com o cabo que vai usar, uma corda qualquer, um fio
eléctrico, um cinto, uma gravata, um fio plástico, tudo serve. O
homicida, por outro lado, nada
improvisador, tem um certo ritual
e aplica-se com requinte à sua tarefa.
Um suicida faz
um nó de qualquer maneira, com muitas voltas e voltinhas, mas quase sempre
eficaz. O homicida estuda o nó cientificamente, com as voltas indispensáveis,
ficando seguro e sendo fácil de desatar (pormenor importante).
Um suicida
protege muitas vezes o pescoço com um lenço ou um pano qualquer, para tentar
aliviar a dor. Se tem de morrer, que não seja no máximo de sofrimento. Um
homicida não se preocupa com tal coisa.
Também o
estudo das fibras da trave ou do ramo onde a vítima foi suspensa é fundamental.
Se foi içada (portanto havendo homicídio), as marcas na madeira estarão
orientadas para cima no lado da vítima e para baixo no lado do assassino que
puxou a corda. No caso de suicídio, em que a vítima se abandona de cima duma
cadeira ou mesa, por exemplo, as marcas das fibras estarão dos dois lados da
trave para o mesmo lado, isto é, para baixo.
Asfixia: É a morte provocada pelo
dióxido de carbono ou outros gases tóxicos, por via de intoxicação. É quase
sempre acidental ou suicida e muito pouco provável a sua utilização para
perpetrar um homicídio, a não ser em condições muito especiais – a vítima estar
diminuída fisicamente ou privada dos sentidos e o homicida pretender simular
suicídio (muita atenção a este aspecto!)
Os
sinais externos são:
- Lábios de um
vermelho vivo;
- Faces
rosadas;
- Livores
avermelhados.
Os casos mais
vulgares são os causados por fugas de gás usado nas cozinhas, bem como um
incorrecto arejamento, quando se usam as vulgares fogueiras a lenha. Numa
garagem com um carro a trabalhar e sem arejamento, pode-se atingir a asfixia.
Este tipo de morte, muito frequente acidentalmente, ocorre pouco nos casos de
suicídio e é praticamente nula como homicídio, a não ser quando associada a
outras acções para diminuição das capacidades da vítima.
E por hoje
chega. Logo que possível cá estaremos com mais umas “dicas”. E já agora, fiquem-se
com esta:
Sabiam que é
possível calcular a altura de um indivíduo a partir da sua pegada?
Ora fixem e
façam a experiência. Fórmula de Parville:
E=2xP -0,05
0,287
Em que E é a estatura do indivíduo e P o comprimento
da pegada. Se o pé é descalço, é só aplicar a fórmula. Se estiver calçado há
que abater ao resultado dois a três cm se usar ténis, três a quatro cm se for
sapato normal, quatro a cinco se tiver sola de borracha ou se for bota simples.
ADITAMENTO ao publicado na secção
POLICIÁRIO em: 22.Agosto.1992
TÉCNICA POLICIÁRIA AO
ALCANCE DE TODOS
Na secção
deste dia - retratada nas duas folhas
que antecederam e deram motivo a esta – ocorreu uma gralha que nos faz ligar a “máquina
do tempo”, avançando para a futura secção que será publicada em 29 de Agosto
(próximo futuro), onde “O inspector Fidalgo desfaz equívocos”.
Vejamos,
então, antecipadamente, o texto que o inspector Fidalgo escreverá… na próxima
semana…
A TÉCNICA POLICIÁRIA
Publicado na secção POLICIÁRIO em: 29.Agosto.1992
Falámos
na semana passada das pegadas, um pouco a fugir, e a fórmula ressentiu-se
disso, não ficando de todo em todo entendível. A fórmula de Parville joga com o
comprimento da marca deixada no local, corrigida conforme o tipo de calçado que
se usa, o que é normal.
A
fórmula correcta é:
E
= (2xP) /0,287 = 0,05
O
“E” traduz a estatura ou altura do indivíduo, e o “P” é o comprimento da
pegada.
Um
exemplo: Um indivíduo, deixou uma marca de sapato de borracha com 29,5cm. O
cálculo da estatura, será:
E
= [2 x (0,295-0,04*) /0,287] – 0,05 <
= >
E
= (2 x 0,255) /0,287 – 0,05 < = >
E
= (0,51/0,287) – 0,05 < = >
E
= 1,77 – 0,05 < = >
E
= 1,72metros
(*
Para um desconto de 4
centímetros , por se tratar de sapato de borracha.)
Ou
então, no caso de 5 centímetros* de abatimento:
E
= [2x (0,295 – 0,05*) /0,287] – 0,05 =
[(2x0,245)/0,287] – 0,05 =
(0,49/0,287) – 0,05 =
1,70 – 0,05 = 1,65 metros .
Portanto,
a estatura seria compreendida entre 1,65 e 1,72 metros , o que já
poderia conduzir a um melhor enquadramento do criminoso entre os suspeitos. De
notar que se o indivíduo estiver descalço, a altura será praticamente exacta,
sem a variação que no nosso exemplo existe.
E
posto isto, toca a treinar!
Inspector
Fidalgo
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