A H P P P
ARQUIVO HISTÓRICO DA PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PORTUGUESA
Problema # 49
O INSPECTOR FIDALGO E O
HOMEM DO FATO BRANCO
Original
de: Luís Pessoa
Publicado na
secção POLICIÁRIO em: 27.Agosto.1992
Chovia. Forte e feia, a água tombava com ruído nos
telhados do casario daquele bairro de Alfama. Como sempre, pessoas apressadas
percorriam as vielas, umas munidas de guarda-chuva providencial, outras, como
era o caso do inspector Fidalgo e daquele homem de fato branco, apanhando com a
dureza da água que caía.
O inspector Fidalgo não tinha grande pressa, caminhava
apenas porque é habitual as pessoas caminharem assim para fugir da chuva. Uma
rotina. No fundo, o inspector até gostava de caminhar debaixo de chuva. Era
refrescante, calmo, um pouco solitário, até, sendo um bom conselheiro nos momentos
de tomar decisões.
Foi na tarde desse dia todo igual que o inspector se
deslocou novamente a Alfama, desta vez por motivos profissionais.
Uma moça de pouco mais de 20 anos de idade e
prostituta, presumivelmente – que neste país não há número nem cadastro da
existência de tal profissão, a não ser que tenha havido prisão pela prática de
prostituição, o que não era o caso – tinha sido assassinada com um tiro, num
terceiro andar de um prédio um tanto degradado, mesmo no centro do bairro.
Suspeitos não havia muitos. Apenas um tipo mesquinho e
chato que repetia sempre as mesmas coisas com uma voz pastosa e monocórdica,
lembrando um disco partido, e um moço com um aspecto típico de chulo,
graciosamente vestido com um fato branco, imaculado, com cada vinco no seu
lugar e onde nem uma ruga poderia espreitar sem ser de imediato corrigida e
“apagada”.
Claro está que ninguém sabia de nada, tinham chegado
naquele momento, eram muito amigos da moça, o tipo chato era quase como um pai
para ela, no seu dizer, tinha montes de pena e era capaz de tudo pela moça,
inclusivamente dar a sua vida por ela… O tipo chuleco, era como um irmão para a
moça, como seria de prever, só estava ali porque queria vê-la, porque gostava
dela.
Tinha vindo a pé desde a Rua da Alfândega e quando ali
chegou viu a moça assassinada. Estava muito impressionado, mas não podia fazer
nada.
-É falso, é falso! – gritou o tipo chato. – Esse gajo
ficou cá durante toda a noite na “minha menina” e foi ele que a matou, sei lá
porquê!
- Esse tipo é doente. Não lhe respondo. Não fiquei cá
de ontem para hoje, como ele diz. Cheguei agora, é tudo.
O inspector Fidalgo virou-se para o tipo chulo e
perguntou-lhe se tinha guarda-chuva. A resposta foi negativa. Virou-se então
para o tipo chato e fez a mesma pergunta. A resposta foi idêntica, com o
acrescento de que não precisava dele porque morava no andar de abixo.
O inspector pensou um pouco… Não havia dúvidas…
A – O assassino foi o tipo chato porque morava ali mesmo
e tinha todas as oportunidades para cometer o assassínio.
B – O assassino foi o tipo chulo porque não podia
apresentar-se daquela maneira com aquele tempo e a história dele.
C – O assassino foi o tipo chato porque apenas tentou um
álibi perfeito dizendo que dava a vida por ela, o que soava a falso, dadas as
circunstâncias.
D – O assassino foi o tipo chulo que entrou calmamente na
casa e matou a moça, sabendo que o tipo chato morava por baixo e que por isso
seria inculpado porque ia descobrir o cadáver.
E é o fim da semana policiária. Se aproveitou o cupão do
passado domingo, está em condições de responder já hoje.
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Solução do autor:
Publicada na secção POLICIÁRIO em: 29.Agosto.1992
D – O assassino foi o tipo chulo que
entrou calmamente na casa e matou a moça, sabendo que o tipo chato morava por
baixo e que por isso seria inculpado porque ia descobrir o cadáver.
O
dia era de chuva, todo igual, como se diz, e portanto o tipo chulo nunca
poderia deslocar-se a pé, como afirmou, e manter-se impecavelmente
“encadernado” no seu fato branco.
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